terça-feira, 19 de maio de 2015

Desafio fotográfico





Aqueles que me fazer o favor de ir lendo o que de fraco vou escrevendo sabem que um dos assuntos sobre o qual me debruço amiúde é a ética fotográfica.
E se a técnica é o domínio da ferramenta e a estética é o domínio do olhar, já a ética é aquele difícil domínio daquela vozinha interior que nos impede de fotografar (ou divulgar), mesmo quando a luz está fabulosa e o assunto é o mais atractivo.
Indo mais longe, se a técnica e a estética se praticam e aprendem com as tentativas e erros, consultando manuais e tuturials, ouvido a opinião de outros e comparando o que fazemos com os mestres fazem, já a ética, devido à sua subjectividade e subtileza, se não for considerada e praticada a cada instante, a cada acto fotográfico, é como discutir o sexo dos anjos.

O que proponho ao grupo é um exercício bem prático de ética.
É quem aceitar fazê-lo começar ainda antes disso a exercitar os limites sociais e pessoais da tarefa a que se dispõe. E ser capaz de respeitar o que decidiu interiormente, tanto na captação como na divulgação. É ser capaz de ouvir e respeitar a vozinha interior mesmo que confrontado com situação particularmente atractiva.

No próximo dia 20 de Junho, um sábado, acontece em Lisboa a Marcha do Orgulho LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros).
O tema é de si polémico!
Se para alguns é completamente indiferente as práticas e opções dxs que participam nesta marcha, bem como dxs que lá não estão, para outros essas práticas podem ser ofensivas dos seus próprios conceitos morais. E há ainda quem entenda a justeza da marcha, já que a liberdade individual não pode ser condicionada pelas opções ou condições sexuais.
O desafio que proponho é comparecer e fotografar, de acordo com o conceito de liberdade ali expresso e reclamado.
Mas a questão ética é aqui, mais que em qualquer outra manifestação de rua, premente.
Ao fotografar um manifestação deste género e ao evidenciar caras e indivíduos corre-se o sério risco de colocar um carimbo acusatório ou censório na cara de cada retratado, dizendo a quem vir as fotografias que estx é isto ou que aquelx é aquilo.
Não só não entendo como correcto o carimbar gente como, ao fazê-lo e publicá-lo, se corre o risco de fazer chegar esse carimbo onde não é suposto que chegue. Numa sociedade onde a liberdade sexual ainda é um tabu agreste e castrante.
O desafio ou prática ética é fotografar aquele desfile – colorido, com condições de luz particularmente interessantes e com alguns marchantes que se exibem e fazem questão de serem fotografados, deixando no anonimato a maioria dxs que engrossam a marcha.
E mostrar, usando das técnicas e estéticas dominadas, que quem ali desfila e assim protesta não são freaks nem animais exóticos num circo de rua.
Tal como, igualmente importante, a prática fotográfica deixando de parte eventuais preconceitos pessoais negativos sobre o comportamento de terceiros.

Fica o desafio na esperança que alguns o aceitem.
E a certeza de que, a menos que algo de grave o impeça, por lá me encontrarão a praticar fotografia numa das situações que tenho por eticamente mais difíceis em Lisboa. 

By me

1 comentário:

Anónimo disse...

Praticamente 100 anos depois ainda se mantem verdadeira... "The fact is that relatively few photographers ever master their medium. Instead they allow the medium to master them and go on an endless squirrel cage chase from new lens to new paper to new developer to new gadget, never staying with one piece of equipment long enough to learn its full capacities, becoming lost in a maze of technical information that is of little or no use since they don’t know what to do with it."

- Edward Weston, 1927