Aos treze anos eu
era um consumidor de livros compulsivo. Lia tudo o que me aparecia.
De Enid Blyton a
Júlio Verne, de Dickens a Tolstoi, de Júlio Dinis a Castelo Branco, de Walter
Scot a Sevenson, lia de tudo, desde que lhe jogasse a mão. Aliás, tendo esgotado
os permitidos, fazia incursões aos outros, como a colecção Argonauta ou a
Vampiro.
A leitura era,
então e entre nós na rua, a actividade complementar ao liceu e aos jogos de
bola, aos aviões de balsa e às corridas de bicicleta. E a chegada do aniversário
de um era uma alegria colectiva, já que significava a chegada de um ou mais
livros que, depois de lidos pelo ofertado, andariam de mão em mão pelos demais.
Acrescente-se que
mesmo as estantes dos pais de uns era terrenos a explorar por todos. Numa partilha
fraterna e alegre, quase que sem limites.
Não li o “Livro de
Pantagruel”, que por qualquer motivo nunca me atraiu. E não consegui jogar a
mão ao “Manual da guerrilha urbana” escondido que estava na casa de um
companheiro de rua. Só muito mais tarde o li.
Claro que isto
acontecia numa época em que a televisão tinha hora de abertura e fecho, era a
preto e branco (passou a cores pela minha mão) e aos domingos tínhamos o TV
Rural e a música para jovens, que eu via.
Não devo e não
faço avaliações aos outros pela minha própria vivência. Condições diferentes,
épocas diferentes, culturas diferentes. Mas se há coisa de que não gosto é de
que chamem estúpidos os jovens. Garantidamente que não gosto!
E é o que se está
a passar com uma editora deste jardim à beira-mar plantado e mal amanhado.
Integrou o plano
nacional de leitura o livro “História de uma gaivota e do gato que a ensinou a
voar”. Da autoria de Luís Sepúlveda, é uma fábula bonita, leve de ler e com
múltiplos níveis de interpretação. O que ajuda a fazer dele um excelente livro.
Foi classificado
para o 7º ano de escolaridade, para jovens algures entre os doze e os treze
anos. Faz sentido.
Já não faz sentido
é que a edição agora no mercado esteja pejada de ilustrações!
Belamente feitas,
bem a propósito da história contada, têm um efeito bem nefasto para jovens
leitores: bloqueia-lhes a imaginação, ficando eles com uma imagem mental do
descrito baseada nas ilustrações.
Ora acontece que
uma das belezas da literatura é exactamente o deixar à imaginação do leitor o
complementar o não descrito com as suas próprias vivências, memórias e
capacidade criativa. O cinema, a chamada sétima arte, tem a desvantagem de o
não deixar, a menos que o seu autor seja um mestre. E sabemos não haver tantos
assim.
Por jovens, na idade
de descobrir a leitura pela leitura, em que o estimular a imaginação e a
capacidade de interpretar o que lêem é vital para o seu futuro enquanto
estudantes e enquanto leitores…
É passar-lhes um
atestado de estupidez!
Mais ainda, ao
colocar-lhes nas mãos livros ilustrados como se para crianças do primeiro ciclo
se tratassem é chamar-lhes crianças pequenas. Coisa que, é sabido, todo o jovem
detesta! Aliás, nenhum ser humano gosta de ser menosprezado nas suas
capacidades.
Sabemos que a
importância da leitura e do livro, tal como outras actividades, vai perdendo
peso face a outras vias electrónicas de entretenimento e saber.
Mas incentivar a
leitura e o seu prazer nivelando os leitores e aprendizes de leitores por
baixo, passando-lhes um atestado de menoridade, não é certamente a melhor forma
de o conseguir.
By me
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