Estávamos
em 1975.
Era
Páscoa e pouco faltava para se comemorar um ano de revolução.
Os
ânimos andavam exaltados mas eufóricos, com algumas (muitas) limitações de bens
(vi fazer pão no forno do então 5º andar em que morávamos), mas cada passo que
se dava era mais um tijolo que se colocava no edifico do futuro que então
construíamos.
Os
meus 16 anos faziam-me andar no então chamado 6º ano do liceu, numa vivência
lectiva em que poucos se entendiam: os programas eram estranhos a muitos dos
professores, a novel vivência rapazes/raparigas era um “desassossego” e o
permitido e proibido estavam numa “terra de ninguém” não patrulhada mas muito
requisitada.
No
final do segundo período as carteiras, mesas e cadeiras escasseavam. Há várias
teorias que explicam a destruição do mobiliário escolar, mas nenhuma delas fala
em vandalismo ou malvadez: apenas descontrolo juvenil.
Seja
como for, a verdade é que tínhamos que partilhar as cadeiras com mais que um
rabo e, por vezes, nem assim chegava.
As
férias pascais foram passadas no longo, sombrio e frio sótão do Liceu Rainha D.
Leonor, em Lisboa.
Armados
e equipados com martelos, serras, chaves várias, alicates e, principalmente,
muita vontade de fazer, endireitámos, cortamos, pregámos, recuperámos boa parte
do material que ali estava acumulado sem préstimo. Enquadrados por um dos
contínuos do liceu, criámos felizes e aquosas bolhas nas mãos daquele trabalho
árduo e novo para todos nós. Sem distinção de idades ou sexo. O trabalho e a
vontade tudo nivelou naquelas duas semanas.
O
melhor de todo este trabalho foi a não existência de citações ou medalhas. Todo
este trabalho e canseira aconteceu no anonimato e, estou em crer que se
antecipássemos algum destaque individual, teríamos protestado com o mesmo vigor
com que pregávamos pregos nas rijíssimas tábuas das carteiras.
O
pior de todo este trabalho foi a não existência de ferramentas eléctricas que
nos permitisse ir mais longe na madeira e menos fundo nas palmas das
mãos.
Nenhum
de nós sabia o que o futuro nos reservava, mas haveria de sair das nossas mãos!
By me
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