terça-feira, 1 de novembro de 2011

P'ró jantar e não só




No regresso a casa, penso que me falta algo para o jantar: tomate e ovos. De caminho, manteiga para o pequeno-almoço de amanhã.
E, no lugar de atravessar todo o bairro para ir ao supermercado habitual, decido parar a meio caminho de casa, numa outra loja, das mais antigas do bairro.
Um supermercado de tamanho modesto, comparado com muitos outros que por aí pululam, que já teve vários nomes e pertenceu a várias cadeias, apesar de se encontrar estrategicamente colocado bem no centro do bairro. Não costumo frequentá-lo, que a variedade de produtos não é grande e tem alguns outros vocacionados para hábitos alimentares distantes e que não os meus. Mas para o queria, servia.
Entrei e constatei de imediato algo de menos comum: todas as prateleiras continham os produtos habituais, mas apenas à beirinha. Raras eram as que os tinham em profundidade. Fosse como fosse, lá me dirigi à secção dos produtos vegetais onde escolhi o tomate. Segui para a secção dos lacticínios e matinais, onde peguei numa embalagem de manteiga – não a marca e tipo que costumo comprar, mas muito parecida – e procurei pelos ovos.
Olhei, olhei, e nada de os ver. Até que perguntei por eles ao funcionário da charcutaria que me indicou onde estariam, mas que talvez já não houvesse. Estranhei o reparo, mas fui. E não encontrei um que fosse para amostra.
Vendo-me com ar meio perdido, uma funcionária ofereceu-me os seus préstimos mas que, em sabendo de que se tratava, me disse que não, que já não tinham.
Não ter ovos, nos tempos que correr e com as cadeias de distribuição, é estranho. Bem estranho. Conformado mas curioso, decidi dar uma outra volta, desta feita observando o que por ali havia e não havia. E olhar com olhos de ver os empregados.
E a sensação que tive ao longo dos corredores foi reforçada com o semblante desanimado de quem me cobrou o que comprei: estava dentro de um moribundo!
Esta loja, estrategicamente colocada e que deveria ter movimento quanto baste está a escoar a existência, em processo de encerramento. Talvez até compulsivo. E os empregados sabem-no. Talvez saibam até a data do último dia de vendas. Que, sendo hoje o primeiro de Novembro, talvez seja antes do final do ano. E serão mais uns quantos com uma triste consoada e um desanimado reveillon.
Isto no dia seguinte de um companheiro me ter confidenciado que a mulher, com uma função altamente especializada e com 19 anos de empresa, havia sido despedida à má fila na sexta-feira. E uma semana depois de uma amiga me ter contado que estava cheia de sorte, pois três das dez funcionárias da sua secção tinham sido colocadas na “mobilidade especial”.

Há por aí muitos que se queixam de barriga cheia.
E são igualmente muitos os que encolhem os ombros e atribuem à crise e ao destino o seu triste fado.
Mas que, para além de se queixarem no café ou, porque mais barato, nos corredores dos centros comerciais onde se passeiam ou nos largos onde se encontram, nada ou quase fazem. Deixando tranquilos os que se vão alimentando deste estado de coisas, que o povo português é de brandos costumes e não se rebela.
Que até o clássico tomatinho vai faltando.

Texto e imagem: by me

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