segunda-feira, 18 de março de 2024

Velharias




E a pergunta para queijinho é: Reconhecem o que está na imagem?

Alguns, talvez muitos, dirão que se trata da tampa de um cesto de vime com qualquer coisa por cima.

A esses eu direi que têm algum tipo de raízes à vida no campo ou ao artesanato. Que isto, enquanto objecto de uso quotidiano, principalmente nas cidades, é algo de raro. Eventualmente a acompanhar os ranchos folclóricos.

Quanto ao que está em cima, poucos saberão. Só os mais antigos e que faziam viagens de comboio. Das longas.

Trata-se de um cinzeiro de uma carruagem da CP, que estava fixado nas paredes, junto aos bancos sob as janelas. Ou ao longo do corredor, também sob as janelas, em havendo compartimentos. Coisa que faz tempo que não está em uso, como se calcula, em virtude das leis sobre o uso de tabaco nos tansportes públicos.

Juro que não fui eu que o palmei. Teria que ser há bastantes anos. Nem tem aspecto de ter sido arrancado de onde estava. Suspeito que terá sido retirado quando vieram ordens para isso. Terão sido muitas centenas. E que talvez tenham sido vendidas a peso, sendo que algumas terão escapado à fundição. Como esta, ainda com restos de cinza seca no seu interior.

À minha mão veio parar, a troco de quase nada, numa feira de velharias e trastes velhos.

E por cá irá ficar, como memória viva dos tempos em que se fumava nos comboios, se jogava às cartas e em que galinhas, coelhos ou verduras faziam parte da bagagem. Nestes mesmos cestos.

Consigo imaginar um avental aos quadrados e um lenço numa cabeça.

By me

Duas




E se me perguntarem porque é que tenho duas objectivas quase absolutamente iguais, a resposta é simples: só comprei uma. A outra herdei-a.

A que comprei há pouco mais de 45 anos é a da esquerda e está montada na câmara onde a usei nos meus inícios; a que herdei é a da direita, deve ter sido comprada mais ou menos na mesma época, e está montada na câmara que meu pai usou.

Admito que não é uma objectiva que me agrade. Em Ful Frame, pelo menos.

Não tem um ângulo suficientemente aberto para se usar com uma perspectiva bem próxima e “agressiva” mas não tem um ângulo suficientemente fechado para ser usado no dia-a-dia como objectiva de base.

Claro que para interiores em momentos de festas familiares, eventos ou equivalentes, cumpre a sua função e, por isso, teve boa saída entre os utilizadores. Mas nunca me convenceu.

Mas com a 28mm tive uma vivência interessante, talvez não muito fácil de acontecer nos dias que correm. Creio já a ter contado por aqui:

Num outro grupo Pentax, noutra plataforma, alguém sugeriu que a sua objectiva 28mm circulasse mundo, de mão em mão, e que os seus utilizadores partilhassem o que com ela fizessem. Chamou-se ela “traveling 28” e, ao que recordo, correu os cinco continentes, tendo regressado ao seu proprietário no final do seu périplo.

Foi uma experiência interessante, tanto do ponto de vista fotográfico como humano. Ajudou, sem dúvida, que todos nós tivéssemos uma igual ou equivalente. E não posso garantir a 100% pelos demais, mas aguardei a sua chegada para fazer algumas imagens com ela e não com a minha.

Pentax K1 mkII, Tamron SP Adaptal2 90mm 1:2,5

By me

domingo, 17 de março de 2024

Extremos




Esta objectiva foi um ponto de viragem para mim: Uma Samyang 14mm 1:3,1.
Sabemos que cada fotógrafo tem um tipo de objectiva preferido. Perto da 50mm, meia teleobjectiva, grande angular... cada um tem a sua própria abordagem ao mundo que o circunda.
Durante muitos anos a 90mm foi a minha preferida. Por vezes bem acima, muito raramente abaixo.
Esta preferência prende-se, parece-me, com dois factores: personalidade e deformação profissional.
A minha carreira foi a de operador de câmara de televisão e controlo de imagem de tv. Em estúdio maioritariamente. E esta actividade, ainda que tenha semelhanças com fotografia, tem algumas diferenças notórias.
Se, por um lado, é um trabalho de equipa, entre os diversos operadores e sob a orientação de um director ou realizador, por outro implica uma distância ao assunto controlada.
O facto de serem várias câmaras em simultâneo implica que não nos podemos aproximar demasiado ou perturbamos o trabalho das restantes. Por outro, a luz existente, pré desenhada e dificilmente ajustada durante os programas, define eixos e distâncias de trabalho que não podem ser ignorados. Por outro ainda, o tipo de perspectiva apresentada ao público tem que ser, salvo algumas excepções, tranquilo. Imagens com perspectivas muito próximas não o são.
Assim e durante anos, bastantes, a minha visão com um sistema de captação de imagem foi sendo formatada para uma escala e perspectiva a alguma distância. A 90mm ou maior, em Full Frame, corresponde a isso.
Mesmo que em fotografia eu não estivesse limitado ao acima dito, de algum modo a grande angular nunca me permitiu ter uma abordagem visual que me satisfizesse. 
Claro que muitas foram as situações em que a usei. Quer fosse pela proximidade ao assunto que não podia controlar, quer fosse pelo tamanho do assunto, que não “cabia” de outro modo, quer fosse por ser essa a perspectiva desejada.
Acontece que um dia, não há muitos anos, vi um anúncio desta objectiva on-line. Nova. A um preço barato e que podia pagar. Disse então, de mim para mim:
“Tu sabes trabalhar com estes ângulos, apenas não estás habituado a usá-los. Vai praticar!”
Continua a não ser um ângulo de visão que me seja confortável. Quando a coloco na câmara levo mais tempo, e nem sempre consigo, fazer um enquadramento que me agrade ou a encontrar a perspectiva “certa” para o que quero contar. E continuo a aprender a trabalhar com ela.
De quando em vez saio de casa com ela colocada na câmara. Com a firme decisão de que nesse dia essa ir ser essa a minha visão. Claro que comigo estão mais uma ou duas que sei que me satisfazem e que, em caso de extrema necessidade, as posso usar. Mas tento formatar a minha mente e actos para este extremo ângulo de visão e correspondente perspectiva. E eu gosto de desafios.

Pentax K1 mkII, Tamron SP Adaptall2 90mm 1:2,5
By me

sábado, 16 de março de 2024

A Ricoh




Quando preparei esta série de fotografias envolvendo as objectivas de 50mm que aqui tenho, fiz duas separações: montagem PK e montagem M42. A estas voltarei mais tarde.

Quanto às PK, fiquei particularmente indeciso se iria incluir esta junto com as Pentax ou não. Isto porque a dualidade é múltipla.

Por um lado é montagem PK; por outro não é Pentax.

Por um lado a Pentax faz parte do universo Ricoh; por outro, quando foi concebida ainda as duas empresas não estavam unidas.

Por um lado foi adquirida com uma SLR Pentax; por outro destoa no meio das demais.

Acabei por incluí-la na série, como se constata.

Isto porque tenho diversas outras objectivas, com diferentes características e marcas, que uso com as minhas SLR ou DSLR Pentax e não faria sentido deixar esta de fora, ou teria que nunca referir as demais.

O que a torna única é, para além de ser Ricoh, ser a única 50mm 1:2 que possuo. Se acontecer encontrar acessível para mim uma Pentax f/2, virá com certeza.

Um destes dias terei paciência, porque tempo tenho, para fazer testes conclusivos sobre o que é a qualidade resultante de cada uma delas. E escolher a que mais me convença como a que usarei quando de uma necessitar. Até lá, e só porque sou pentaxiano, esta mantem-se guardada.

Pentax K1 mkII, Pentax-M 35mm 1:2

By me

sexta-feira, 15 de março de 2024

Duplicação




Tenho que admitir que a aquisição desta objectiva de deveu a dois dos pecados mortais: gula e preguiça.

Gula na medida em que não tinho um exemplar cá em casa. E se tenho algumas objectivas de 50mm, “faria sentido” ter uma destas.

Preguiça na medida em que tenho uma outra muito semelhante mas com montagem M42.

Qualquer uma delas tem um racio de reprodução de 1:2, o que é confortável. Principalmente quando a objectiva que mais gosto para trabalho com peças pequenas, uma Tamron, faz a mesma escala de reprodução mas a uma distância de trabalho maior. Ou, por outras palavras, com uma perspectiva diferente.

E dá muito menos trabalho mudar de objectiva, se for necessário, de uma PK para outra PK do que ter que colocar ou tirar o anel adaptador para M42.

Preguiça pura e dura.

O que acaba por ter graça é que quem ma vendeu disse ter duas iguais. O que não é comum, principalmente neste tipo de objectiva. E, considerando o estado de conservação desta, que é quase como que saído da fábrica, ainda que tenha saído de produção há quarenta anos, pergunto em que estado estará a outra que não vendeu. É que melhor será difícil.

Quanto a mim, ganhei uma peça e poupei trabalho no futuro.

Pentax K1 mkII, Pentax-M 35mm 1:2

By me

Memória




Há uns 40 anos uma colega veio ter comigo com um pedido.

Dizia ela que tinha um conjunto de negativos antigos da família e que gostaria de ter aquilo impresso em papel. Se eu me encarregava de o fazer.

Achei a coisa curiosa e aceitei o encargo, já que se tratava de uma colega. Mas se eu soubesse...

Surge-me ela, alguns dias depois com duas caixas de sapatos repletas de negativos de todos os tamanhos e suportes, incluindo vidro 9x12.

Claro que me assustei mas não dei parte de fraco.

Foram horas de laboratório, tentando fazer o melhor que podia, apesar de alguns estarem não muito bem conservados. E até ao formato 6,5x9 ainda tinha ampliador para tal, mas acima disso teve que ser por contacto.

O que foi divertido foi ir vendo várias gerações a aparecerem na tina de revelação. Um casamento aqui, um batizado ali, um festa acoli... ao fim de algum tempo já reconhecia os seus familiares ainda em negativo. Só não me dei ao trabalho de lhe entregar aquilo por ordem cronológica, mas pouco faltou.

Agora veio parar-me às mãos esta caixa cheia de negativos em vidro 6,5x9. Pelas indicações escritas em todos e cada um, deve ser o que sobrou de um fotógrafo de loja aberta e com estúdio, que todas foram assim feitas. Pelas roupas envergadas, consigo calcular que sejam de finais dos anos 50 ou início dos anos 60. E, muito naturalmente, não serão familiares entre si.

São fotografias feitas nos tempos em que se vestia a roupa domingueira para se ir ao fotógrafo, que era algo de especial. As mais das vezes para colocar a fotografia num qualquer documento identificativo, impressas por contacto e vendidas às meias dúzias numa carteirinha de papel própria com o nome do fotógrafo impresso a carimbo nas costas de cada uma.

Irei ter o prazer de as positivar a todas. Para meu gaudio, que não fará sentido publicá-las, ainda por cima sem autorizações. Mas ficarei sempre com a curiosidade (que nunca será satisfeita) sobre o que aconteceu as estas pessoas, algumas das quais, e para além da fotografia, pouco mais restará que a memória.

 

Pentax K1 mkII, Pentax-M Macro 50mm 1:4

By me

quinta-feira, 14 de março de 2024

Na reforma e ângulos de visão




O texto que se segue é longo e não pretende ser, de forma alguma, dogmático. Apenas reflete o que penso e sinto, com um pouco daquilo que pouco sei. Qualquer opinião que lhe acrescente algo é seguramente bem-vinda.

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Como é que esta pobre 50mm faz parte do meu acervo?

Bem: se por um lado a obtive conjuntamente com uma Pentax K2, por outro lado não tenho melhor exemplar deste modelo.

Para além do que se vê, uma pancada e uma tentativa mal conseguida de reparação no anel frontal, também a focagem não é tão suave quanto se espera. Quanto à nitidez, aguardo por ter outro exemplar, em boas condições, para perceber ao certo se será de origem ou não o que sinto nela.

Faz ela parte das objectivas de 50mm que possuo, apesar de não ser nenhuma delas um item que use com frequência. Porque o seu ângulo de visão em Full Frame não me satisfaz, apesar de ser considerada normal ou standard.

Dizem-na assim e muitos o defendem, ou ligeiramente mais “curta”. Eu contesto-o e explico.

A visão tem dois factores importantes: a parte óptica, composta pelo globo ocular e seus elementos, e o que acontece no cérebro quando ela lá chega levada pelo nervo ocular.

O ângulo de luz que o cristalino (a nossa “lente”) permite chegar à retina é muito semelhante nos seres humanos. Fracções de grau de diferença apenas, em individuos saudáveis. As diferenças acontecem na retina, e na forma como o globo ocular, enquanto elemento móvel, se comporta.

A retina tem duas áreas principais de sensibilidade, que todos conhecem mais ou menos: a zona central, onde se é francamente sensível à cor e luz e que fornece a principal informação ao cérebro, com todos os detalhes possíveis, e a zona envolvente, a cujo resultado chamamos de “visão periférica” menos sensível em cor e detalhes, mas que nos informa do que acontece em redor. Estas duas zonas de informação são complementadas com ordens vindas do cérebro, que não comandamos, que levam o globo ocular a movimentar-se, por pouco que seja, para aumentar a área coberta pela zona de detalhe.

Só aqui, e sem aprofundar a questão, constatamos que a nossa visão no que a apenas luz concerne tem dois ângulos fixos e um terceiro variável. E este depende não apenas das questões fisiológicas mas do cérebro também.

Mas o cérebro tem também grande influência na visão. Para além de comandar o posicionamento do globo ocular, processa a informação recebida. E a forma como este processamento acontece depende de diversos factores.

Desde logo se estamos atentos ou não. Podemos, ao estarmos atentos, ignorar as informações provenientes da visão periférica, reduzindo bastante o nosso relacionamento com o mundo circundante. Podemos estar concentrados em qualquer outra coisa (pensamentos, sons, paladares...) e nenhuma atenção prestarmos ao que vemos, só regressando a tal se a visão periférica nos der uma informação de alarme. Podemos ainda estar muito concentrados em apenas parte da visão detalhada, como o perceber pormenores de algo muito pequeno e próximo ou algo muito distante como um navio no horizonte e só considerarmos parte da informação detalhada que a retina nos fornece. E tudo isto redunda em “ângulos de visão” diferentes na percepção visual.

Mas temos ainda uma terceira vertente que isso condiciona: a personalidade do individuo. Se for pessoa muito participativa no que o cerca, terá uma abordagem visual ampla. Se tiver uma abordagem mais de espectador ou observador, terá uma conexão visual com o mundo de menor ângulo. Se for alguém que se preocupe com os detalhes da vida terá mais atenção ao que for pequeno e com menor ângulo, se for pessoa preocupada com os grandes problemas ou questões terá uma visão mais abrangente ou com maior ângulo.

Não se pode deixar de parte a questão de se ser mais ou menos tímido ou mais ou menos sociável, condição que permite uma maior ou menor próximidade com pessoas e, naturalmente, o ângulo de visão preferido.

Tudo isto, bem subjectivo na verdade, acaba por influenciar quem faz fotografia. O tipo de objectiva que prefere terá um ângulo de visão ou captação próximo da forma semelhante ao relacionamento tido com o mundo, havendo preferências por distâncias focais maiores ou menores de acordo com isso.

Claro que os fabricantes não podem condicionar os seus produtos a todas estas variáveis. Foi assim criado o conceito de objectiva normal ou standard aquela que tem um ângulo útil semelhante à visão descontraída mas consciente do ser humano médio. E isso corresponde, mais ou menos, entre os 50º e os 60º. Ao mesmo tempo, teria que ser algo fácil e/ou económico de fazer em grande escala. E atribuir uma referência numérica a isso.

Surgiu então a fórmula de ser objectiva normal ou standard aquela cuja distância focal fosse igual ou próxima da diagonal do formato fotográfico.

No entanto, tenho para mim que não existe tal coisa na prática fotográfica séria e que cada fotógrafo prefere esta ou aquela que mais se assemelha à sua própria visão do mundo que o circunda, condicionado apenas pelo que os fabricantes produzem.

Um exercício estatístico interessante é percebermos qual a distância focal que mais usamos. Quer com objectivas fixas (ou primárias), quer com objectivas zoom. Uma estatística que inclua um número grande de imagens feitas e em diversa circunstâncias. Quer de lazer quer profissionais. Nos tempos que correm, e com o EXIF, é coisa relativamente fácil o verificarmos em 500 ou 1000 fotografias quais as distâncias focais usadas. Melhor dizendo, quais os ângulos usados, porque dependerá do tamanho do sensor, que são muitos hoje.

Talvez que, com este exercício, se desmonte um mito. Que é útil a fotógrafos e fabricantes, mas que é um mito.

Por mim, estou mais ou menos esclarecido quanto às minhas preferências. Em Full Frame, a 90mm é, sem dúvida, a que mais confortável me deixa, ainda que por vezes prefira algo entre a 200mm e a 300mm. No entanto, e talvez porque a minha vida sofreu grandes revoluções nos últimos anos, a 35mm também me passou a agradar bastante.

Quanto à pobre objectiva aqui referida, não a insulto dizendo-lhe que é inútil ou mentirosa. Até porque nunca são.

Mas em tendo oportunidade tratarei de lhe encontrar uma irmã em bom estado, guardando esta junto com outras peças que tenho e das quais digo que estão na reforma, não lhes exigindo trabalho. Até porque, no seu tempo, foram garbosas e terão feito excelentes fotografias.

 

Pentax K1 mkII, Pentax-M 35mm 1:2

By me

quarta-feira, 13 de março de 2024

Desafios




Por vezes, para obtermos uma peça específica temos que ficar com o conjunto. Foi o caso.

À venda estava uma Pentax MX preta. Fiquei “guloso”, já que faria par com a cromada que tinha.

Mas com a câmara vinha esta 50mm. Na altura não me interessavam por demais as 50mm. Tinha duas PK e uma M42 e esta, para fotografar, não me fazia falta. Mas como com ou sem objectiva o preço era o mesmo, fiquei com ela.

Admito que as 50mm não me cativam. O ângulo de visão que fornecem não corresponde à minha visão: nem suficientemente aberto para uma perspectiva próxima, nem suficientemente fechado para uma perspectiva distante.

Claro que, quando a tenho comigo e colocada na câmara, a uso. É sempre um desafio fotografar com ela e, usando de luz e perspectiva, colocar em evidência aquilo que quero. E eu gosto de desafios.

É por gostar deles que, em ambiente didático, insisto com os alunos a usarem-na em exclusivo durante algum tempo, em vez de usarem as objectivas zoom que agora fazem parte dos kits. Obriga-os a pensar e a estudar e interpretar o assunto, ao invés de variarem a distância focal sem variarem de ponto de vista. Isto leva-os a andarem para a frente ou para trás, ou para os lados até encontrarem uma solução satisfatória. 

Claro que lhes sugiro, mais tarde, para fazerem o mesmo exercício com um grande angular e com uma teleobjectiva.

Esta prática, ainda que forçada e, por vezes, não muito simpática, acaba por os levar a descobrir outras formas de ver e a ganharem o hábito de ver com os olhos da alma e os pés antes de premirem o botão.

Pentax K1 mkII, Pentax-M 35mm 1:2

By me

Sangacho




Entro na loja e já lá estão três clientes: um a ser atendido, os outros à espera da sua vez.
Já ali não entrava há uns tempos valentes e entretive-me a observar o que ali estava e acontecia: o caixeiro a atender os clientes no balcão principal, num balcão estilo mesa uma jovem senhora ia embalando com papel as latas brilhantes, atrás dela, e com um postigo de vidro de correr, um escritório cuja cadeira de madeira rotativa, àquela distância, rivalizava comigo em idade.
Os clientes não eram portugueses nem se exprimiam em português. Pior: não sabiam bem o que queriam e iam perguntando, apontando no mostruário, o que seria este ou aquele conteúdo da lata e que tipo de sabor ou nível de picante. Entre cada resposta ponderavam, em silêncio, a que as informações recebidas corresponderiam no palato e no respectivo agrado.
O caixeiro, volumoso, agia com a mesma velocidade: quase nada, como se cada gesto seu, para além de um frete, fosse um sofrimento atroz.
Tentando matar o tempo, meti conversa com a jovem, perguntando-lhe quantas latas embalava por dia.
“Não sei, mas são muitas. Depende das necessidades.” Fiquei na mesma.
Ainda tive oportunidade de ver a chegada de uma terceira pessoa, acompanhada por um canito, que foi pendurar o casaco nas costas da cadeira do escritório. Os que os outros emanavam de enfado, este tinha de satisfação e energia. Talvez por ter estado ausente o tempo que canito pediu, quem sabe?
Quando chegou a minha vez pedi com exactidão o que queria: seis latas destas, artigo raro de encontrar noutro local e que me tinham levado ali, bem como duas de outras cujo conteúdo há muito que não provava e de que sou guloso.
O sorriso do caixeiro surgiu de onde estava escondido e entrou em velocidade de cruzeiro habitual no comércio, desenvolto e determinado.
Com a minha mania de querer saber coisas, perguntei-lhe se estaria a sorrir por eu saber o que queria e não estar cheio de perguntas.
“Também”, respondeu-me. “Mas principalmente por falar em português. É o primeiro hoje, e são cinco da tarde.”
Paguei, tendo direito a desconto de dez por cento só porque sim, e saí agradecendo, ansioso por um cigarro, que a espera fora longa.
Cá fora ainda dei dois dedos de conversa com o dono do casaco na cadeira, tal como eu a fumar, e fiquei a saber qual a parte do atum que fornece o sangacho. Aquilo que eu sabia estava errado.
O dia tornou-se profícuo e satisfatório, também por ter tirado do marasmo três alminhas que passam o dia a atender turistas que nem sabem o que querem.
E, claro, o meu jantar soube-me a manjar dos deuses.
Pentax K1 mkII, Tamron SP Adaptall2 90mm 1:2,5

By me

terça-feira, 12 de março de 2024

"Toda aberta"




Este é uma objectiva Pentax de abertura máxima 1:1,2. Uma das mais luminosas ou rápidas que diversas marcas fizeram. Existem outras ainda mais luminosas, mas não de fabrico em série ou de fácil acesso ao público em geral.

Recebi-a como presente de meu pai. Estava ele afastado do fazer fotografia havia anos e quando a decobri cheia de pó doeu-me. Ofereceu-ma, bem como outros itens Pentax. O restante do seu equipamento herdei-o mais tarde.

A sua grande luminosidade ainda hoje faz abrir a boca de inveja a muitos, ainda que não saibam que, quando na máxima abertura, tem uma imagem resultante que surpreende pela sua fluidez ou definição limitada. Que, bem explorada, é linda.

É uma das várias 50mm que possuo, que me vieram parar às mãos porque acompanhavam câmaras que adquiri ou porque me ofereceram, umas em melhor estado que outras. E isso inclui outras marcas que não usam montagem PK.

De entre a panóplia de objectivas fabricadas para SLR e filme 135, creio que será a distância focal mais divulgada. Até mesmo para não SLR.

O motivo será simples, ou não tanto. A sua construção optica é das mais simples, ainda que com várias fórmulas, permitindo isso aberturas de diafragma maiores sem aumentar em demasia o tamanho da objectiva e peso, por comparação com outras distâncias focais.

Tem também um ângulo de visão próximo da visão humana. Claro que esta questão é objecto de diversas interpretações e contestações e por vários motivos. Eu também o contesto e a isso voltarei.

Mas os fabricantes divulgaram esse conceito de “normal” ou “standard” e ficou na mente de muitas centenas de milhar de pessoas, fotógrafos sérios, amadores ou simples curiosos. Foi rentável para os vendedores e fabricantes.

Nos tempos que correm, com o digital e outros formatos menores que o Full Frame, esse conceito não se aplica. Aliás, não é fácil ou barato encontrar uma objectiva nova, fixa ou “prime”, com este ângulo de visão: 47º. A sociedade de consumo e a evolução tecnológica baixou os preços das pequenas zoom e é isso que se encontra a acompanhar a grande maioria das DSLR.

No entanto, em situações de ensino, seja qual o nível, tento que usem uma 50mm ou equivalente. Não sendo possível, peço que bloqueiem a zoom para um ângulo semelhante durante uns tempos e que só fotografem assim, seja qual for a situação ou assunto.

Esta objectiva, pela sua história e características técnicas, é-me especial e tem um lugar de destaque aqui em casa.

 

Pentax K1 mkII, Pentax- M 35mm 1:2

By me