quinta-feira, 31 de outubro de 2019

As bagas




Este é um texto fofinho para os que não gostam de outros bem mais sérios.

O Outono é a meia estação. Belo nas suas manhãs bem frescas mas dias tépidos, na sua luz baixa com tons lindos, antecipando as nuvens invernosas que as não deixarão ver, o cheiro da terra molhada com as primeiras chuvas… creio que todos gostam do Outono e eu não sou excepção.
E uma das coisas de que gosto nele são estas bagas.
Existem em variados matizes e os seus tamanhos oscilam, mas não muito, do que aqui se vêm.
As cores, fortes, vão compensando os castanhos e amarelos próprios da estação mas não enganando os insectos, que nunca os vi rondando-as.
Agora que eu as rondava quando pirralho, isso é um facto. Que o assalto que fazia (fazíamos), apesar dos espinhos, era implacável. Estas bagas tinham o tamanho certo para, inseridas nos brancos tubos das instalações eléctricas (também eles obtidos por via de por via de pilhagens), serem as munições certeiras para terríficas e sangrentas batalhas campais. Ou “aulais”, que nem dentro das salas de aulas as vítimas preferidas escapavam.
Ficam as memórias e fica alguma tristeza ao constatar que as bagas ali ficam durante tantas semanas. Ainda que nos alegrem a vista, a sua permanência é indiciadora que as batalhas de hoje se travam na virtualidade dos ecrãs, ficando de fora a sã convivência infanto-juvenil, mesmo que em campos opostos.
E que farão estes, quando adultos, se a não viveram quando crianças?

Desculpem o enviesar das ideias e o transformar um texto e imagem que se previam fofinhos para assuntos pesados, mas as palavras são como as bagas: vêm aos magotes e sem controlo.



By me

terça-feira, 29 de outubro de 2019

Batata frita




A história tem já uns quantos de anos, mas hoje voltou-me à memória.
Num centro comercial sou abordado por uma senhora. Já velhinha, parecendo-o ainda mais pela sua pequena estatura, parou, olhou-me de frente e perguntou:
“É pintor?”
Fiquei meio à toa. Nada em mim o poderia indicar. Talvez, mas só talvez, o chapéu de aba bem larga que usava na época, junto com o meu sempiterno colete e o saco fotográfico às costas. E respondi-lhe:
“Não, minha senhora. Não o sou.”
“Ah! Então é escritor.” Afirmou convicta.
“Também não. Mas sou fotógrafo, se isso ajuda.”
“Pois, eu sabia. É um artista.”
“Nem tanto, nem tanto”, tentei dizer-lhe, mas sem sucesso, que já se afastava no seu passo miudinho.
E, como estava de costas, não o posso assegurar, mas creio que levava um sorriso de satisfação por ter acertado.

E é este o mal dos seres humanos: para tudo têm que encontrar uma classificação, um rótulo, um compartimento mental onde encaixar o que vêem e conhecem. E pouco importa o rigor da relação entre denominação e realidade: desde que classificado, é quanto basta.
E, por tudo quanto é lado, os rótulos imperam: ele é o –ista, ele é o –crata, ele é o –eiro… desde que haja um sufixo é quanto basta.
Conheço boa gente que, assumindo-se de direita, tem atitudes bem mais de esquerda que alguns esquerdista que também conheço. E alguns destes que, dizendo-se de esquerda, fazem inveja a alguns direitistas de renome.
Por mim, os rótulos que me possam pôr pouco me importam. Intitulo-me de Acráta, mas podem chamar-me de batata-frita. Não serão eles, os rótulos, que me farão desviar do que penso e sou.
E, sendo que sou “do contra”, quanto mais teimarem em classificar-me, em encaixar-me num qualquer conceito pré-definido, mais gozo tenho em defraudar as expectativas.
A factura é pesada, por vezes. Desde a não promoção por não ir exercer o meu ofício, à borla, para um partido, até aos castigos não formais por ser objector de consciência perante imoralidades ou inverdades.

Os tempos são de rótulos, clássicos ou novos. Aplicaveis a muitos ou a um restrito número de pessoas ou organizações. Mas, apesar disso (ou até por causa disso) continuo a não querer um rótulo, que sou o que sou muito para além do que querem que seja.

Mas se me quiserem mesmo colocar uma etiqueta, antes daquela que me porão no dedo do pé, chamem-me batata frita.

By me

sábado, 26 de outubro de 2019

Chile, media e poder




De um modo mais intenso ou mais discreto, sempre se vai falando por estes dias do Chile.
As enormes manifestações, os protestos contra aquilo em que a sociedade se transformou, os confrontos violentos entre manifestantes e forças da ordem…
As imagens que nos chegam são deste calibre, com o vermelho do fogo e do sangue, as hostes de agentes equipados para a guerra, os blindados jorrando gás ou água…
É a violência que faz manchete, pouco explicada pelos jornalistas ou comentadores.
Já o que se passa no sul desse mesmo país, na zona da Patagónia, com o povo Mapuche não cruza os Andes. Um povo confinado a uma reserva territorial, sofrendo de um processo lento mas firme de genocídio para que as “suas” terras possam ser aproveitadas no que o subsolo contém, os que tentam denunciar o que se passa mas que, no regresso desaparecem como que por magia… Nem mesmo quando tentaram usar a presença papal para tornar público o que se passa foi suficiente para retirar a mordaça conveniente que a comunicação social e o poder instituído ali usam.
Mas os Mapuche não são classe media em risco, não consomem coca-colas nem têm centros comerciais e os brancos ainda não assumiram o que ali fizeram ou fazem.
E os interesses económicos têm demasiada força.

Imagem roubada da net

sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Liberdade

Eu gosto de conversar sobre política.
Não sobre partidos e figuras gradas da governação. Uns e outros são efémeros, tanto na vida quanto na ribalta.
Refiro-me, antes sim, a ideias e ideais de sociedade. Como esta pode estar organizada – ou não – e porque devemos participar na vida pública, cada um à sua maneira e na medida das suas possibilidades.
Mas o que é realmente difícil é passar a mensagem de que a liberdade tem que ser total, mas total mesmo.
Há quem defenda muito seriamente que os defensores de teorias contra os direitos do homem deveriam ter acesso condicionado ao poder – executivo ou legislativo.
Isto não é verdadeira liberdade. Se alguns não podem manifestar ou exercer o que pensam, mesmo que discordemos por completo da sua opinião, então alguns têm sua liberdade cerceada. Não é liberdade haver quem não a tenha.
Aquilo que pode e deve ser feito é agir e demonstrar o seu erro, a tal ponto que ninguém nessas pessoas acredite ou confie.

A polícia do pensamento foi descrita num romance faz muito tempo, numa perspectiva pessimista do futuro. Do agora.
Não podemos defender teorias que permitam que ela exista. Mas em havendo quem o defenda, a verdadeira liberdade implica que o permitamos e impedamos que sejam posta em prática.

Ser livre não pode ser uma atitude com limitações ou fracturas.

By me

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Telefones



Não andava nem depressa nem devagar. Andava na sua velocidade.
Chegava-se aos clientes, recebia as suas encomendas, desaparecia por entre as prateleiras e regressava com os braços cheios de papeis, sobrescritos, canetas, borrachas, réguas, lápis, blocos e cadernos, o que quer que fosse que lhe tivessem pedido. Volta e meia voltava atrás para confirmar um detalhe, mas tudo vinha aparecendo em cima do balcão.
Aliás o balcão de madeira, vetusto e carcomido pelos embates dos pacotes, pouco mais velho seria que aquele caixeiro que nele pousava o que vendia.
Quando entrei, já lá estariam uns três ou quatro clientes que pacatamente aguardavam vez.
De súbito tocou o telefone. Ninguém reagiu, até porque os telemóveis eram uma invenção do futuro. E aquele de digital tinha apenas o dígito com que se rodava o mostrador.
TRiiiiim. TRiiiiim. TRiiiiim.
Nem o bom do vendedor se interrompeu, que o ignorava como se de um surdo total se tratasse, continuando na sua tarefa de atender o cliente.
TRiiiiim. TRiiiiim. TRiiiiim.
Ao fim de um pedaço, um dos outros clientes que, como eu, aguardava vez e achava estranho que ele não o atendesse, chamou-lhe a atenção para o aparelho que retinia.
A resposta foi bem clara:

“O telefone só toca porque clientes que não querem esperar gostam de fazer as suas encomendas e tê-las prontas quando cá chegam.
Mas os senhores já cá estavam.
Quando chegar a vez dele, logo o atendo.
É a seguir àquele cavalheiro!”

O silêncio que se fez só era interrompido pelo toque estridente da campainha. Que cedo se calou. Quem quer que estivesse do outro lado do fio deve ter percebido a lição.

E quem diz que há que ter um curso superior para dar lições?...

By me

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Em desespero de causa




Ser professor pode ser divertidíssimo. Ou altamente stressante. Depende das circunstâncias.
E sobre o recente triste episódio de um professor ter agredido um aluno, recordo um episódio que protagonizei.

A primeira visita de estudo que organizei, numa das escolas onde trabalhei, visava os Encontros de Fotografia de Coimbra, há já muito tempo. E cometi diversos erros, próprios de um estreante nestas lides.
O mais grave deles foi o não conhecer pessoalmente parte dos alunos, não podendo, assim, prever comportamentos e minimizar danos. E não ter a certeza de que os demais professores que integravam a visita o poderiam fazer.
Alguns alunos do terceiro ano saíram de Lisboa com o firme intento de embebedar os demais participantes. Coisa que conseguiram com sucesso.
No final do dia, ao embarcarmos de regresso, o panorama era francamente triste: jovens que mal se aguentavam de pé, outros que já nada aguentavam no estomago, um professor mais para lá que para cá, o motorista furioso com o que estava a acontecer e os danos na viatura… um cenário triste.
Quando quisemos embarcar, um desses mais velhos, corpulento e violento, postou-se no cimo das escadas do autocarro e, bem firme na sua determinação, afirmava para quem quisesse ouvir: “Ninguém entra que eu não deixo!”
Tentei convencê-lo usando da argumentação possível, mas de nada servia. E os demais em estado calamitoso, no terreiro em torno da viatura.
Já em desespero de causa, subi os três ou quatro degraus, aproximei o meu rosto do dele, apenas separados pelo meu punho firmemente fechado, e sussurrei-lhe: “Sais daí ou tenho que te partir os dentes?”
Quer fosse pela surpresa de um professor ameaçar de bater, quer fosse pelas palavras, quer fosse pelo que viu nos meus olhos, o certo é que se encolheu e foi sentar-se lá no fundo, aproveitando eu para embarcar aquela gente toda, parte da qual iria cozer a bebedeira até Lisboa.
Não sei bem o que faria eu se ele se mantivesse na dele. Talvez lhe tivesse chegado a roupa ao pelo, pese embora o seu corpanzil e o nível de álcool que tinha ingerido.
Na segunda feira seguinte, em chegando à escola, fui surpreendido pela direcção, que queria saber o que se tinha passado, já que um aluno tinha apresentado queixa por ameaça de violência.
Tudo explicado, e com a minha informação que o faria se não tivesse tido sucesso com as minhas palavras, fui mandado em paz, no meio de alguns sorrisos recíprocos, só possíveis passados alguns dias, que em Coimbra não tinha tido vontade alguma de rir.

Não será legítimo que um professor agrida um aluno. Seja em que circunstâncias for, tenha ele a idade que tiver. Os alunos, mesmo que já maiores de idade como era o caso, são-nos entregues (aos professores) com a confiança de que nós os protegeremos e não o oposto.
Mas há momentos em que se perde a cabaça, se mandam às urtigas todas as éticas e códigos de conduta e em que só resta “apelar à ignorância” por se terem esgotado todas as outras estratégias.

No meu caso, nunca mais organizei viagens ou visitas de estudo, mesmo que até ao virar da esquina, sem conhecer os alunos todos e ter a certeza que os restantes professores envolvidos seriam capazes de prever comportamentos e minimizar danos.



By me

Uma mão cheia de nada



Consta que o velho Sócrates, o tal da velha Grécia, gostaria de se passear pelo mercado. Sem comprar coisa alguma.
Questionado, terá afirmado que gostava de admirar a quantidade de coisas de que não necessitava.

Eu por vezes vou aos centros comerciais, mas não me comparo.

By me

domingo, 20 de outubro de 2019

Felicidade



O ser humano precisa de se afirmar no grupo a que pertence. Pelo que é e pelo que faz.
E um retrato, um registo para a posteridade, feito formalmente ou em tom de brincadeira, é uma forma de afirmação, objecto de observação e critica cerrada por parte do retratado.
Curioso é de observar que se manifesta ou critica sobre o que é ou o que faz expresso em retrato. E são dois grupos, manifestamente distintos. A fronteira fica algures na casa dos quarentas anos de idade, nuns casos mais acima, noutros mais abaixo.
No grupo dos mais novos, o que é observado e/ou criticado é aquilo que faz.
As poses, as expressões, as posições corporais, os relacionamentos com outros retratados.
O eventual – ou frequente – desagrado não se manifesta sob a forma de “não gosto” ou “fiquei mal”, mas antes pela ironia, pelos comentários jocosos, pela auto-critica. Frequentemente, com o menosprezo da sua própria aparência e uma crítica acutilante sobre os demais no grupo retratado.
Para estes, o que é importante num retrato não é o que são mas antes o que fazem e como o fazem.
Por seu lado, os pertencentes ao grupo mais velho preocupam-se francamente mais com o que são ou aparentam ser.
As manifestações de idade constatáveis pelo peso ou volume, pela posição do esqueleto, pela cor da pelagem ou pelas rugas são os factores que mais procuram ver num retrato, numa tentativa inútil de constatar que não parecem ser o que são. Que os olhos dos outros não vejam aquilo que sabem ser.
Estou em crer que a felicidade passa por uma são convivência com o “Eu” físico, tentando melhora-lo se se o entender, mas não o negando ou repudiando.
E, acima de tudo, não ligando a mínima à opinião que os outros possam ter sobre si mesmo. Ao vivo ou no papel.

By me

sábado, 19 de outubro de 2019

Disciplina




Um destes dias assalto a arrecadação e torno a montar o laboratório.
A magia do ver surgir a imagem no revelador, os nada subtis aromas, o ter muitas certezas, que o delete não tem valor aqui…
Um destes dias volto a procurar a minha própria disciplina, caramba!



By me

A democraticidade dos media




Os media são o que são e ponto final. Se tiver sangue é manchete!
“Noite de distúrbios faz várias dezenas de feridos em cidades da Catalunha”, Diário de Notícias.
“Pelo menos 31 feridos e 89 detidos nos confrontos da Catalunha”, Jornal de Notícias.
“Barcelona vive nova noite de vandalismo em dia de greve geral”, Correio da Manhã.
“Guerra e paz do independentismo catalão nas ruas de Barcelona”, Público.
“Catalunha: nas ruas de uma Barcelona à beira do abismo”, Expresso.
Estes são os títulos sobre o que aconteceu ontem em Barcelona
Já as referências a terem estado mais de 600.000 a percorrer as estradas da Catalunha, convergindo para Barcelona, num gigante protesto pela libertação dos “presos políticos” e pela democracia independentista, são poucas ou nenhumas, e haverá que ir ver o interior das notícias.
Isto pode levar a concluir que os manifestantes violentos a que se referem os jornais estão correctos e que há que criar tumultos e confrontos com a polícia para que as causas sejam noticiadas e passem para a ordem do dia.
Será que estarão os jornalistas investidos do poder de definir critérios de importância e assim moldar o curso dos acontecimentos? Será que o poder que possuem, não eleito e não democrático, é mais importante que o poder instituído e a vontade dos cidadãos?

Imagem: edit by me

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Consciências e displicências




Éramos jovens e decidimos ir acampar e fazer umas pinturas sobre madeira.
O destino era a Tapada de Mafra que, soubemos à chegada, estava fechada para manobras militares.
Não desistimos e, de mochila às costas, continuámos a pé até encontrarmos um local que satisfizesse. E demos com ele: um terreno direito, sem pedras ou constrangimentos de maior. Mesmo ao lado de uma igreja, numa pequena aldeia.
Montado o acampamento, comido o jantar e acondicionado o lixo, os campistas de dormitório que éramos fomos ao tasco, do outro lado do adro, por um café. Mesas e balcão de mármore, gente a jogar dominó, copos de fundo grosso…
Pedido o café ao balcão, fez na sala um silêncio sepulcral, com todos a olhar para o nosso lado. Entreolhamo-nos, meio a medo, e só depois nos apercebemos:
Na parede, acima das nossas cabeças, um televisor onde tinha começado o Telejornal.
Creio que até então não me tinha apercebido da importância daquilo que fazíamos com a displicência do quotidiano.
E não o esqueci até hoje!
Não foi há sessenta anos, mas foi há coisa de quarenta, ainda a preto e branco.

Imagem: edit by me

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Qualidade fotográfica




Tanto investimento técnico e criativo em fotografia, em todo o tipo de câmaras e formas de reprodução, e as fotografias de passe, que até são das mais vistas já que regularmente exibidas, são deste calibre.



By me

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

O silêncio




O caderno com as folhas em branco tem tanto que contar sem nada dizer…



By me

Old Selfie



Um velho compincha escreveu um destes dias uma pérola que eu, infelizmente, terei que citar de memória:
“… e as selfies que são feitas porque ninguém os fotografa.”
Ele que me perdoe se não sou rigoroso nas palavras.

Mas a verdade é que neste mundo da imagem e da aparência, quem não tem imagem “não existe”. Quem não consta das listas das fotografias, do aparecer com, quem não repete e bombardeia tudo e todos com essa imagens de si mesmo, é como se pouca importância tivesse.
Bem o sabem os publicitários!
E a tecnologia actual, que permite fotografar e exibir para o mundo em menos de minutos, é o perfeito feitiço para transformar alguém que nunca entraria num concurso de beleza ou de popularidade, para quem raramente se apontaria uma objectiva, em alguém que todo o seu círculo de “amigos” e conhecidos conhece e observa.
As selfies!

O "eu existo" da imagem fotográfica!

By me

terça-feira, 15 de outubro de 2019

Duas imagens




Em dois dias consecutivos publiquei estas duas imagens. A de baixo primeiro, no dia seguinte a de cima.
Ambas são imagens especiais:
A de baixo pelo tratamento de luz, pela forma como os dois copos são apresentados, pela invulgaridade de se ver uma imagem de um copo partido. Fi-la apenas porque me apeteceu, sem mais para contar que ela mesma.
A de cima pela proximidade com que o assunto é mostrado que, não sendo nada que qualquer cientista ou entusiasta da astronomia não possa fazer e francamente melhor, nos mostra aquilo que todos conhecemos mas que a maioria não tem como assim registar.
Uma é singular no conteúdo e de difícil leitura ou interpretação, a outra inequívoca no conteúdo e de leitura imediata.
O que as diferencia também ou principalmente, sem sombra de dúvida, é que a de cima é uma fotografia para ser exibida na net, a segunda nem um pouco. Exactamente pela facilidade ou complexidade de leitura ou interpretação.
Dúvidas haja sobre isto, perdem-se com o tipo e a quantidade de reacções de quem as viu: quase nenhuma na de baixo, umas quantas mais na de cima.
Prende-se isto com vários factores:
À uma, pelo tamanho com que são vistas. Boa parte do actual consumo de redes sociais acontece em dispositivos moveis, de reduzido tamanho, não permitindo aperceber os detalhes de uma imagem complexa;
Por outro lado, uma imagem de difícil percepção obriga a usar de tempo, caso desperte interesse, na sua interpretação. E tempo é o que pouco há na net em geral e nas redes sociais em particular. Por cada imagem que vemos, entram uns largos milhares. E não queremos perder nenhuma. Ver, ver, ver, mais, mais, mais, são as regras de quem navega na net.
Temos, assim, que o fazer de imagens para a net, se queremos que aconteça alguma reacção (mesmo que negativa) há que simplificar o que se exibe, sem constrangimentos ao vagar do olhar nem detalhes pouco explícitos.
E se isto até pode ser “divertido”, para quem se ponha a matutar na relação produtor/consumidor de fotografias, tem um lado perverso:
Ao criar-se o hábito de simplificar as imagens, com o objectivo de obter reacções, pode-se correr o vício de se ganhar o vício mental de só assim fotografar. De não atrair o olhar do fotógrafo assuntos mais complexos visualmente. Um pouco na fotografia como na escrita “netiana”, com os seus ícones, emojis e abreviaturas.
É bom que se saiba, ao fotografar, em que condições o trabalho será “consumido” e adaptar o que queremos transmitir ao suporte final. Não apenas ao tamanho com ao tempo que sabemos que o espectador irá dedicar ao que vê. E não nos deixarmos levar pelo facilitismo do consumo, mas antes fazer o queremos fazer, deixando um pouco de parte as opiniões de terceiros.

Os meus cinco cêntimos sobre um tema que vai muito para além da fotografia, do consumo e das novas tecnologias.



By me

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Da minha janela




Nada de especial.
Uma lua cheia, da minha janela, com a minha Pentax K7 e uma Novoflex 600mm f/8, fabricada algures nos finais dos anos ’50 ou inícios dos anos ’60.
Se procurarem na net por imagens desta objectiva, verão porque não vou fotografar aviões perto do aeroporto com ela.
Uma pequena ampliação, ou crop, no final, nada demais, só para compor a coisa.


By me

Imagens mentais



Um dia perguntaram-me quais as minhas músicas preferidas. Ou autores. Ou intérpretes.
A música não é a “minha praia”, já que vivo mais com os olhos que com os ouvidos.
Mas certo é que quando estou “encalhado” com um assunto que não me está a correr como gostaria (no fazer de imagem ou no escrever) recorro a um autor/intérprete que sempre me ajudou nesses impasses: Bau.
Vou buscar um dos seus discos, ponho-o a tocar e recosto-me por um pedaço, deixando-me levar pelos sons e pelas imagens mentais que me proporciona.
Algum tempo depois, é pegar na câmara, na caneta ou no teclado e o trabalho flui-me.

Espero que todos tenham o seu próprio “facilitador de imagens”.

Seja qual for o suporte.

By me

domingo, 13 de outubro de 2019

Só porque me apeteceu!



By me

Agradecimento




Gostaria de, aqui e publicamente, agradecer à deputada do Livre o facto de se ter candidatado. E, igualmente aqui e em público, a todos os eleitores que no Livre votaram.
Eu não fui um deles. Não me identifico com o seu programa político e não voto em quem não me identifico.
Mas a eleição desta senhora, e para além das suas convicções políticas, serviu para que muitos viessem a lume mostrar os seus ódios privados às diferenças. Diferenças nas crenças, diferenças na pele, diferenças no corpo.
Serviu a sua eleição, para além de dar voz no parlamento a outras vozes, para mostrar que, no fim de contas, Portugal é tão rasca como outros países, não tolerando a diferença. Não tolerando quem faz diferente, quem é diferente, quem pensa diferente.
A sua presença no Parlamento, servirá para de algum modo modificar pensamentos e atitudes. Mesmo que o seu projecto de sociedade não se concretize, no todo ou em parte.
Obrigado por se ter candidatado, obrigado por terem votado nela.



By me

sábado, 12 de outubro de 2019

Tiranias



- Oh pai? A água ferve a 90º?
- Não, filho, que disparate! A água ferve a 100º.
- Ah, pois… A 90º ferve o ângulo recto!

Piadas à parte, a verdade é que quantificamos tudo na vida. Pesos, volumes, distâncias, temperaturas, energias, tempo… Ainda não quantificaram os afectos, mas creio que não faltará muito.
Com as artes e as expressões pessoais, o mesmo se passa. Nas métricas, nas rimas, nas proporções, nos equilíbrios… As fórmulas algébricas definem à priori ou explicam à posteriori aquilo que apeteceu fazer, aquilo que o criador entendeu por bem materializar.
E estas quantificações impõem regras e normativos. Que, por um lado, definem e generalizam o conceito de qualidade e, por outro, padronizam técnicas e materiais usados por cada um para se exprimir. E tente-se lá encontrar uma tela redonda para pintar…
Com a fotografia sucede exactamente o mesmo!
Submergida que está à ditadura das normalizações dos fabricantes, é difícil a roçar a impossibilidade de se lhes fugir. E se fabricarmos nós mesmos os materiais (equipamento e consumíveis) é quase uma impossibilidade, as expressões de surpresa ou de desprezo por parte de quem atende o público ao lhe ser pedido um trabalho não normalizado acaba por ser hilariante, se não fosse trágico.
Tente-se mandar imprimir uma fotografia a partir de negativo ou de ficheiro digital que tenha, por exemplo, uma proporção de 1:7,5. Suspeito que só alguma lei recôndita e obscura que impede os empregados de balcão de rirem, inibe o ouvir-se uma valente gargalhada. E provocaria uma chamada de urgência para o hospício mais próximo que pedíssemos um enquadramento trapesoidal irregular.
O alfa-numérico das regras, leis e normalizações é tão castrante quanto um capador de porcos.

E o ângulo recto, com os seus 90º exactos na esquadria do nosso enquadramento, é a cereja no topo do bolo!

By me

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Trocas fotográficas




Há sete ou oito anos promovia eu acções de formação em fotografia, gratuitas e abertas a qualquer nível de conhecimento. Decorriam em jardins e parques públicos, uma vez por mês, mais ou menos.
A convocatória acontecia numa rede social, onde também se partilhavam as imagens que faziam e onde se trocavam ideiais e pedidos de ajuda fotográfica.
Um desses encontros, a que dávamos o nome de “trocas”, teve este texto e fotografia publicados como início de trabalho:
“Troco alguns conhecimentos de fotografia,
Por aquilo que entenderem, desde que feito pelo próprio.
Primeira parte:
1 – Escolher ou inventar uma anedota (desde que passível de ser contada numa escola dominical);
2 – Escrever a anedota;
3 – Ilustrar a anedota com uma, duas ou três fotografias, não mais;
4 – Publicá-las no grupo “olhar, ver, captar” até ao próximo dia 10 de Novembro, na pasta correspondente, acompanhadas do texto e do número de ordem na anedota.
Segunda parte:
A decorrer no próximo encontro, em data a anunciar.
Duas citações de ajuda:
“O mais difícil no acto de fotografar não é decidir o que registar mas antes o que ou quando não registar.”
“De tudo o que envolve a comunicação (oralidade, plástica, audiovisual) o difícil é o poder de síntese.”

Creio que um destes meses regresso a este passatempo colectivo.



By me

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Preconceitos




Um camião embateu e destruiu vários carros, num país europeu. Diversas vítimas, entre as quais o condutor do camião.
De acordo com a notícia, este seria de nacionalidade Síria.
Questionei se seria notícia se o condutor fosse espanhol ou sueco ou romeno.
Responderam-me que terá gritado “alá é grande” antes de embater e que havia testemunhos.
E eu quis saber se tinha posto a cabeça fora da janela do camião ou se estaria mais alguém na cabine.
A notícia deixou de ser notícia.
Os preconceitos noticiosos são terríveis e, tantas vezes, com pés de barro!


By me

terça-feira, 8 de outubro de 2019

Prazos



Eis algo contra o qual tenho vindo a bradar faz algum tempo:
Segundo um jornal português, é provável que os dois primeiros meses do próximo ano as contas públicas funcionem com duodécimos do orçamento de 2019, no lugar de entrar em vigor logo em Janeiro o orçamento de 2020.
Isto porque haverá que nomear novo governo, que terá que elaborar novo orçamento, que terá que ser aprovado, que terá que ser promulgado…
Tudo isto tem prazos a cumprir e negociações a fazer. E depende sempre, este ano incluído, da data em que se realizam as eleições legislativas.
Se em vez de acontecerem em Outubro, empurrando os prazos para Janeiro ou Fevereiro, acontecessem em Junho ou Julho, no dia 1 de Janeiro estaria tudo feito, aprovado e etc., podendo toda a máquina que depende do orçamento começar a trabalhar normalmente.
Mas talvez eu seja tolo, ao pensar que todos querem que tudo funcione normalmente.


By me

2CV



Não é preciso perceber muito de carros, ou mesmo ter conduzido algum na vida, para se reconhecer isto.
E estou em crer que muitos serão que ao verem esta frente, ou mesmo apenas ouvirem o ruído que lhe está associado, recordarão um pedaço do passado, muito provavelmente de boa memória.
Até porque, ter um 2 CV não é ter um duplo currículo ou ter um automóvel: é ter uma forma de estar na vida!

By me

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Dinheiros




Para que conste, a legislação eleitoral atribui uma subvenção estatal aos partidos que obtenham mais de 50.000 votos, mesmo que não tenham conseguido eleger deputado algum.
Isto, que faz sentido no que ao custo da democracia diz respeito, terá estado, segundo algumas opiniões, na origem de um “golpe de estado” na direcção de um partido político há pouco menos de quatro anos.
Em qualquer dos casos, será curioso reparar que do acto eleitoral deste ano nenhum partido com mais de 50.000 votos ficou sem representação parlamentar. Ao que julgo saber, terá sido a primeira vez desde 1974.
Daqui por um ano, isto para dar tempo a que aconteçam as naturais convulsões internas, voltarei a cuscar o que acontece nas direcções partidárias. E divertir-me a ver até que ponto o poder e a sua ausência, realmente corrompem.



By me

domingo, 6 de outubro de 2019

Evolução ou revolução




Estamos todos de tal modo embrenhados e formatados na sociedade em que vivemos que ouvir falar em conceitos radicalmente diferentes deixa-nos de boca aberta, quase que a pensar se se abandona o local ou se se chamam os paramédicos.
Foi quase o que aconteceu ontem.
Na antecipação do dia de hoje, falava-se, lá onde trabalho, de formações políticas e das suas prestações públicas nos últimos tempos. Das grandes e das pequenas, do que aparentam propor e do que está meio oculto nos seus discursos.
A dado passo meti-me na conversa e “descobri algumas carecas” de algumas dessas formações, mostrando o como algumas “bandeiras” não correspondem exactamente aos projectos de sociedade que muitos pensam corresponder. Tal como algumas práticas também não correspondem ao apregoado.
Conversa vai, conversa vem, e acabámos por falar em modelos de sociedade, de como têm vindo sido geridas e de como em quase todas as elites culturais ou endinheiradas se sobrepõem aos demais. E de sistemas alternativos, onde o dinheiro, enquanto comparativo do valor de bens e trabalho, pode ser inútil e abolido. Vantagens, desvantagens, experiencias concretas e de como foram sendo extintas: por quem e porquê.
Sei que abanei algumas mentalidades. Pelas respostas que obtive, pelos sorrisos condescendentes que vi e pelos que abandonaram a sala.
Mas, tenham lá santa paciência: ninguém me consegue convencer que a minha barriga é maior ou menor que a de qualquer outro, ou que alguém merece comer meia salsicha enquanto outros se batem com bifes.
É importante que colaboremos todos para a sociedade, na medida das capacidades de cada um e em função das necessidades do todo, sem que isso defina quem vive melhor ou quem vive pior.
A simples existência de hierarquias é, por si só, segregadora de qualidade de vida, fazendo com que uns sustentem com o seu esforço o conforto de outros. E isso não é justo!
Podem me dar como exemplos as inúmeras sociedades que se organizaram em hierarquias, tendo por base modelos diversos de valor de bens e serviços: trocas directas ou intermédias com pedrinhas, sal ou moedas.
Mas enquanto isso assim for, teremos sempre uns quantos a decidir sobre a vida de muitos outros, os primeiros no conforto, os segundos no limiar da sobrevivência.
Haja a coragem de dizermos que somos mesmo todos iguais e de vivermos em conformidade, mudando os paradigmas.
Por evolução ou por revolução.



By me

sábado, 5 de outubro de 2019

Fotógrafos e trânsito




Os fotógrafos não são bem vindos no meio do trânsito.
Estranham isto?
Pois tentem fotografar algo que implique uma perspectiva a partir de bem do meio da faixa de rodagem de uma qualquer rua. Ou bem que esperam por uma pausa no trânsito, ou haverá sempre alguém que implique com o fotógrafo.
E não importa se estão a usar a câmara na mão, ou em tripé, ou mesmo que se tenham dado ao trabalho de colocar um triângulo ou pinos a “proteger” a zona de trabalho. Haverá sempre automobilistas, a maioria, que protestarão.
E se nunca viveram isto é porque não são fotógrafos.
Mas há sempre algum que faz a diferença, bem hajam!
Um destes dias queria eu fotografar uma tampa de esgoto que estava no meio do asfalto. Sendo rua com semáforos acima e abaixo, aguardei que eles ma dessem uma “aberta” para lá chegar. Quase impossível.
Eis senão quando chegou um carrito pequeno, veio da transversal, pelo que os semáforos não impediram a sua chegada. Já tinha eu começado a andar para o local que queria e, em vendo-o aproximar, comecei a arrepiar caminho. Que o raio dos carros são mais pesados que eu. Não precisei de o fazer.
A senhora que o conduzia percebeu o que eu queria. Atravessou-o parcialmente nas duas faixas, bloqueando-as, e fez-me sinal para que eu fotografasse. Inequívoco. Com as duas mãos e um gesto de “Bora lá”.
Sorri-lhe e apressei-me no ali me levava.
Ainda ouvimos, eu e ela, umas buzinadelas de outros que entretanto chegaram. Mas ela esperou os parcos segundos que demorei até me retirar, para desfazer a posição e seguir viagem, que o semáforo entretanto tinha ficado verde para eles.
Enquanto regressava ao passeio, sorri-lhe de orelha a orelha e tirei-lhe o chapéu. O seu sorriso foi equivalente.
Ficarei sem saber se também fotografa tampas de esgoto no meio do asfalto, ou se foi um gesto generalizado para com um fotógrafo indiscriminado.
Bem haja!



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sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Cidadãos



المواطنين!
Burgers!
Bürgerinnen und Bürger!
Herritarrek!
Ciutadans!
Građana!
Mamamayan!
Citoyens!
მოქალაქე!
Πολίτες!
Sitwayen!
אזרחי!
Borgere!
בירגערס!
Saoránaigh!
Citizens!
Borgara!
Cittadini!
Civium!
Rakyat!
Cidadáns!
شهروندان!
Cetăţenilor!
Граждан!
Wananchi!
Medborgare!
พลเมือง!
Vatandaşlar!
Громадян!
công dân!

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quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Disparates linguísticos




Sobre a morte de Feitas do Amaral, ouvi um político dizer um disparate monumental: “Acabou de morrer”.
“Acabar” significa terminar qualquer coisa. E morrer não é coisa que se termine. Ou bem que se está vivo, ou bem que se está morto.
Poderei dizer “Acabou de cair”. Faz sentido. Cair é uma acto continuo, que pode ser mais longo ou mais breve, dependendo da altura da queda.
Mas não poderei dizer “Acabou de bater no chão”. Bater é um acto instantâneo, PUM; é o momento do impacto. A menos que por “Bater no chão” se queira dizer “Bater repetidamente”. Nesse caso, “Deixar de bater no chão” faz sentido.
Acabar significa terminar. E num momento está-se vivo, no seguinte está-se morto.
Mesmo que se use a expressão “está a morrer”, significa que ainda não morreu, que está quase morto mas ainda não está.
“Acabar de morrer” é um disparate linguístico!

Nota adicional: Diogo Freitas do Amaral, pese embora tenha estado sempre do outro lado da barricada, do ponto de vista político e das opções de sociedade que defendia, é dos raros que eu respeitava desse lado. Tenho-o na conta de um homem recto, anormalmente honesto nos seus pensamentos e actos.
E isso merece todo o meu respeito.



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quarta-feira, 2 de outubro de 2019

Na parede



Estava escrito num muro que fica a meio caminho de minha casa para o liceu.
Passado algum tempo, esse caminho passou a ser o de casa para o trabalho, que muitas vezes fiz a pé.
Por isso o vi muitas vezes, até ficar indelevelmente gravado na minha memória:
“Liberdade para todos, menos para os fascistas”
Foi escrito naquele tempo que se seguiu à revolução de Abril, prolífero em mensagens com sentido nas paredes, umas mais simples, outras bem coloridas, algumas verdadeiras obras de arte.
Esta, a preto sobre o já não branco do muro, sempre me incomodou. Muito! Muito mesmo!
Qualquer um que me conheça, por pouco que seja, saberá que não defendo a ideologia fascista. Ou qualquer outra ideologia totalitária, seja qual for o quadrante.
A liberdade é algo de sagrado na minha cartilha e limitá-la é pecado nela também. A liberdade dos actos e a liberdade dos pensamentos.
O simples facto de alguém pensar diferente de mim, por muito oposto que seja, não é motivo para lhe impor castigo ou impedir de o pensar. Mais ainda: o facto de alguém defender em público teorias que se opõem ás minhas, por mais opostas ou que me incomodem, não me dá o direito de o fazer calar.
Liberdade é liberdade, sem peias ou limites.
Não posso aceitar é que teorias que me prejudiquem ou que prejudiquem outros sejam postas em prática.
Assim, quem tentar por em prática teorias totalitárias terá a minha oposição, demonstrando publicamente o seu erro e perigo e impedindo, mesmo que fisicamente, que as liberdades de pensamento ou expressão sejam limitadas. Ou a segregação racial, ou religiosa, ou sexual, ou económica, ou o que quer que seja.
Agora que o possam pensar, que possam dizer o que pensam…
Se eu exijo para mim a liberdade de pensar e de dizer o que penso, bater-me-ei para que os demais o possam fazer. Mesmo que não concorde com o que dizem.

Será pantanoso este terreno. Mas não poderei aceitar uma “polícia do pensamento”. Ou o regresso dos lápis azuis. Ou a recuperação de um qualquer Tarrafal. Ou de goulags. Ou de piras de livros. Ou de índex. Ou…

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terça-feira, 1 de outubro de 2019

Eram cinco




Sentadas no banco, uma entretinha-se a revirar a mala, em busca sabe-se lá de quê. Outra lia um livro, daqueles grossos que tanto atraem: pelo mesmo preço tenho mais leitura. As outras três dedicavam-se ao passatempo habitual nos tempos que correm: o telemóvel.
De súbito uma de uma ponta levanta o aparelho e coloca-o e ao telemóvel na posição clássica de uma selfie: subido, apontado um pouco para baixo, de modo a ver-se bem o enteado e a colocar o público numa posição superior e o fotografado numa posição subalterna.
Acto continuo, as restantes quatro suspenderam o que estavam a fazer, rodaram o rosto para a câmara e esboçaram um esgar de sorriso. Bem forçado, entenda-se.
Feito registo, regressaram ao que faziam, com o mesmo ar de enfado natural de quem espera pelo comboio que as levará para a rotina laboral.

Quando dizem que a fotografia não mente, têm razão. Quem mente é quem assume poses de circunstância, mentindo com todos os dentes, visíveis ou não.
Será que é obrigatório sorrir para a fotografia?



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