segunda-feira, 31 de julho de 2017

Alto está



Alto está, alto mora,
Todos o vêem, ninguém o adora!

Esta era uma daquelas adivinhas de criança, principalmente do campo ou aldeia, em que a resposta era: O relógio da torre da igreja.
Claro que outros havia que igualmente estavam (estão) altos, mas o relógio da torre da igreja marcava o tempo, ao desafio com o sol e a barriga.
Pergunto-me quem, nos tempos que correm, olhará para este, rigorosamente certo, que encima uma estação de caminhos-de-ferro?
Que já ninguém para ela caminha, que se chega de táxi, de autocarro, de metro. Que todo o mundo e mais um par de botas usa pelo menos um relógio, quando não dois: no telemóvel e, acessoriamente, no pulso.
Na sua época, terá ele pedido meças no rigor a outros, de igreja, nas imediações, mais a poente ou mais a nascente, mesmo mais acima nas colinas.
Hoje alguém terá a incumbência de manter a sua rotação síncrona com a da Terra, mais por hábito que por utilidade.

Excepto para a memória e para alma!

By me

domingo, 30 de julho de 2017

O clássico



Estava de férias em Lagos.
A família regularmente alugava a mesma casinha nos limites rurais da cidade e íamo-nos espraiar de manhã e à tarde para a meia praia.
Uma ocasião vi um glorioso carro dos anos 50 estacionado na avenida marginal. Impecável, parecia acabadinho de sair da fábrica. A seu lado, uma pequena palmeira no passeio. Mais ao fundo, a muralha de pedra do porto e o céu azul.
Este conjunto sugeriu-me uma imagem a fazer, desde que com a luz no ângulo certo. Feitas as contas e olhada a bússola, seria pelo meio-dia.
Uns dias depois, tendo o céu a limpidez adequada, parti descendo a colina, carregado com a câmara, as ópticas, os filtros, o tripé… toda a parafernália. Havia que chegar ao local a tempo de apanhar o sol na posição certa.
A meio caminho sou interpelado por um casal de velhotes que caminhava em sentido inverso:
“- Olá, como está?
- Desculpem mas… conheço-vos?
- Não se lembra de nós?
- Confesso que não. Querem ajudar-me?
- Em Coimbra, junto à Sé velha, há uns anos… Aquela fotografia que nos tirou…”
Recordei-me então e ficámos um niquinho à conversa.
Reformados que estavam, aproveitavam quando estava bom tempo para passear e conhecer o país como não tinham podido quando jovens.
E, à medida que iam viajando, iam fotografando o que viam, enquadrando-se ora um ora outro na imagem. Tinham uma única fotografia de ambos desses passeios: Aquela em que eu me tinha oferecido para fazer com a câmara deles, em Coimbra, aquando de uma das minhas peregrinações ao Encontros de Fotografia.
Apenas uma, de milhares que tinham. Apenas uma que os mostrava aos dois. Partilhando os Outonos amenos da vida e de Coimbra.
A minha oferta, tão natural quanto um copo de água, marcou-os indelevelmente. Aquela fotografia não é uma fotografia para eles:
É A fotografia.
Confesso que na altura já nem me recordava do facto. E, não fora eles, nem nunca mais o recordaria, de entre muitas situações semelhantes vividas.
E esta fotografia, que nunca vi, é uma daquelas que consta do meu álbum de recordações. Não como um ponto de viragem, mas mais como um parágrafo no livro que vamos escrevendo e a que chamamos vida.
Quanto à foto do carro? Bem, a hora de verão está atrasada em relação à solar, pelo que cheguei demasiadamente tarde nesse dia. Voltei lá mais tarde, mas não consegui dar-lhe aquele ar retro-californiano que queria.

Não adianta imitar. Há que ser espontâneo e generoso na fotografia, tal como na vida.

By me

sábado, 29 de julho de 2017

Lomo, uma das primeiras



“Então hoje não trazes a máquina? Logo tu!?”

“Não, hoje não trago. Deixei uma em casa a lavar uma roupinha, outra usei ontem para escrever uma carta à moda antiga e a de barbear há muito que a não ligo. Agora a câmara está aqui, no bolso.”

By me

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Sonho



Para que conste:
O direito a sonhar começa quando acordamos de manhã e termina quando saímos da cama no dia seguinte.


By me

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Tempo e qualidade



Todo o processo, no meu artefacto, desde o “Olho passarinho!” até retirar a fotografia do seu interior pronta a entregar, demorava uns três minutos.
Um e meio para o papel adquirir formas, cores e tons, o resto para o manuseio de tudo o que dentro da caixa se encontrava. Isto presumindo que nada corria mal, o que acontecia de quando em vez e podia duplicar o tempo.
Uma boa parte dos potenciais “clientes” perguntava-me, a par com o preço, o quanto tempo demorava a coisa, ao que respondia uns três a quatro minutos. Mas, na prática, entre o tempo que antecedia o acto de fotografar e as conversas posteriores, podia levar a uns bons quinze minutos, para diversão de todos os evolvidos.
Pois havia sempre uns quantos que, enquanto estava com as mãos lá dentro, cobertas pelo clássico pano preto, me iam perguntando se demorava muito. Suspeito bem que, para estes jovens, um minuto pouco mais tivesse que uns meros dez a quinze segundos, no máximo.
E quando o protesto sobre a “demora” se verbalizava, tinha uma resposta que lhes ia dando, com variações de oratória em função das idades, do tom que empregavam e da minha própria inspiração:
“Calma! É que as coisas boas da vidas fazem-se devagarinho!”
Os mais jovens, porque ainda não o tinham aprendido ou não o entendiam, olhavam para mim de cenho cerrado, tentando perceber onde queria eu chegar.
Já os mais velhos sorriam ou mesmo riam, confirmando e assumindo um ar maroto ou sonhador.
Mas esta é uma certeza que tenho, faz muito tempo:

A despeito das bandas largas, dos velocímetros ou das competições contemporâneas, as coisas boas da vida fazem-se devagarinho!

By me

terça-feira, 25 de julho de 2017

Modas



“Já ninguém fala de peidos.”
“Pois não! A moda agora é falar de Siresp.”
“Nah! Isso também já não está na moda.”
“Tens razão! Agora fala-se de ciganos.”
“Nem isso, que é requentado.”
“É verdade! A moda agora é dizer: Tens 24 horas para…”
“Já quase nem me lembrava disso. E são duas voltas do ponteiro ou três dias, a oito horas de trabalho diário?”


A duração da moda hoje depende da veemência e verborreia dos jornalistas. E como estamos em época de férias…

By me

segunda-feira, 24 de julho de 2017

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É uma piada clássica dizer que “o cúmulo da força é dobrar uma esquina”.
Mas não é!
O que é mesmo difícil é dobrar uma personalidade.
Podemos limar arestas, arredondar os seus gumes, amaciar a sua rudeza… Podemos até moldar os efeitos acção/reacção.

Mas dobrar uma personalidade é tarefa para além da força humana.

Informação



“Como Serge Daney gosta de dizer, “ficamos cegos diante da hipervisibilidade do mundo.” De tanto ver já não vemos nada: o excesso de visão conduz à cegueira por saturação. Essa mecânica contagia outras esferas da nossa experiência: se antigamente a censura era aplicada privando-nos de informação, hoje, ao contrário, consegue-se a desinformação imergindo em uma superabundância indiscriminada e indigerível de informação. Hoje, a informação cega o conhecimento.”
By Joan Fontcuberta, in “A Câmara de Pandora”

“Ainda um dia alguém vai ter que me dizer, como se eu fosse muito estúpido, porque raio uma fotografia tem que estar bem nítida, exposta e organizada, de acordo com as normas técnicas e estéticas em vigor”

By JC Duarte, in “um caderno de apontamentos qualquer”

By me

domingo, 23 de julho de 2017

sábado, 22 de julho de 2017

Boa ou má



Tenho para mim que não há boas ou más fotografias.
O conceito de bom e de mau é um conceito social que, muitas vezes, entra em conflito com as opções de quem fotografa.
Pior: Limita quem fotografa a fazer o seu trabalho pela opinião da sociedade, deixando para trás, tantas vezes, a sua própria capacidade de inovar e criar.
Entendo que uma fotografia é boa quando consegue satisfazer o seu autor. Quando ele olha para ela e se revê no que nela “lê” e sente. Isto é uma boa fotografia!
A partir daqui entra em campo a questão do gosto dos demais e da eficácia da comunicação.
Se a fotografia agrada à maioria leva o carimbo de boa. Se também agrada aos especialistas será excelente.
Mas, e antes de mais, a fotografia, o trabalho realizado que transformou aquilo que foi visto e sentido naquilo que o fotógrafo entende por um equivalente fotográfico, tem que agradar ao seu autor.
Claro que a fotografia também é uma forma de comunicação. Por isso existem os livros, as galerias, os álbuns, os grupos. As mais das vezes fotografa-se para que outros vejam e sintam o que o fotógrafo viu e sentiu.
E quando tal acontece, a fotografia é eficaz na sua função de comunicar.

Mas também sabemos que comunicar, mesmo que com fotografia, implica o partilhar de códigos comuns. Tal como a escrita. Ou a música. Ou a escultura. Se quem o vê não entender os códigos usados por quem o fez, a ponte da comunicação não existe.
Daí que exista uma tendência generalizada em fotografar usando de códigos (técnicas e estéticas) que sejam do entendimento generalizado dos destinatários. Algum tipo de formalidade no fazer de fotografia.
Esta formalidade, este usar de códigos generalizados na fotografia, acaba por fechar portas à capacidade que cada um possa ter de se satisfazer com o que faz sem pensar nos outros. Acaba por limitar a criatividade absoluta, obrigando a criar de acordo com os códigos instituídos.
Mais do mesmo, portanto!

Claro que os chamados “profissionais” a isso são obrigados. Têm que agradar aos clientes!
A sua principal preocupação, ao fotografar, é que os sentimentos expressos nas fotografias que fazem, se alguns, sejam entendidos por quem lhes paga o trabalho. Que é isso que deles se espera.
Se a gestão do espaço e dos elementos nele (composição), se a nitidez ou as relações entre o claro e o escuro não estiverem de acordo com a técnica e estética em vigor (os códigos de comunicação) dificilmente será vendida. Quer seja uma fotografia de um acontecimento social, uma reportagem de guerra, paisagem ou vida animal. Não aparecerá numa revista ou jornal, ninguém a verá num cartaz publicitário nem constará no álbum de casamento.

Será uma necessidade do fotógrafo definir aquilo que lhe agrada e aquilo que agrada ao consumidor. E ter a coragem de o assumir.

Nunca disse a um aluno ou formando “Essa fotografia é má!”
O mais que fiz foi dizer-lhe “Não gosto” ou “Não entendo”. E, acto continuo, pedir que ma explicasse, que sobre ela discorresse em voz alta. E que me dissesse se ela correspondia ao objectivo a que se tinha proposto. E se esse objectivo era pessoal ou comunicação de massas.
A classificação de boa ou má seria a dele, de acordo com isso e com a conversa.


Que o mais importante é a satisfação do próprio. O resto é socialização.

By me

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Leituras

Já tinha começado a ler quando o comprei, o ano passado mas, por qualeur motivo, deixei-o de parte.
Retomei-o agora, numa tentativa de reduzir as pilhas dos “por ler”.
“Fotografia e activismo”, de Jorge Luís Marzo, Editorial Gustavo Gili, 2006, Barcelona

“…
El activismo nace – más do que habitualmente se piensa – de la necesidad de articular mecanismos de autogestión y redes de socialización política que respondan a las verdaderas necesidades de una comunidad, de una sociedad determinada, com lo que de flexibilidad y adaptación conlleva eso, pues auqune a muchos les peses, las sociedades son contingentes y se negocian constantemente.
… ”


Cinzeiros



Foi um destes dias.
Estávamos para entrar numa exposição, incomum e num local emblemático de Lisboa, e constato que no chão havia pontas de cigarro.
Uma meia centena, talvez mais, à esquerda, à direita, em frente da porta. Algumas, poucas, com aspecto de terem sido propositadamente pisadas para as apagar, a maioria apenas ali caídas, ardidas até se apagarem.
Estranhei e procurei com os olhos aquilo que ali deveria estar para obstar a tal espectáculo. Não havia.
Nem amovível nem solidamente colocado no solo, não se via nenhum cinzeiro. Nem ali, junto à porta daquela exposição bem publicitada, nem em qualquer outro lugar. Coisa nenhuma até onde a vista alcançava.
Pergunto-me se os promotores da exposição, que bem cobraram por cada visitante, ou os gestores do espaço, que bem receberam pela sua cedência a quem organizou o evento, não poderiam ter por ali algum receptáculo, mesmo que corriqueiro e pouco atraente, que evitasse aquele lixo público.
Que certo é haver fumadores, que certo é não ser permitido fumar no interior de exposições, que certo é que há que deixar as pontas de cigarro nalgum local.

Infelizmente, as nossas pontas de cigarro ficaram ali, no chão, a fazer companhia a todas as outras que lá jaziam.

By me

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Notas



Eu não gosto de ser maltratado. Talvez haja quem goste, mas eu não gosto.
E uma das formas de ser maltratado de que não gosto é ser colocada em causa a minha honestidade ou bondade nas acções. Sem que me conheçam de lado algum ou tenham motivos pessoais para de mim desconfiarem.
Não gosto! Incomoda-me! Faz vir ao cimo o pior de mim!
É por não gostar que suspeitem de mim que não ando de avião. Ou no TGV francês. Ou no AVE espanhol. Qualquer um que embarque é objecto, sistematicamente e sem excepções, de revista aos seus bens e ao seu corpo. Como se todos os passageiros fossem potenciais criminosos e tenha que haver um despiste. De todos se suspeita, indiferenciadamente.
Como não gosto que suspeitem de mim, mais para mais sem me conhecerem, não gosto do tratamento a que me querem sujeitar. Pelo que não uso estes meios de transporte.
Mas há outra circunstância de que não gosto. Que me faz sair do sério. Que me faz ficar furibundo e recusar posteriores relações. Comerciais ou outras.
Refiro-me às lojas que fazem questão de verificar a validade do dinheiro que lhes é entregue para pagamentos. Passando as notas por máquinas ou tintas capazes de diferenciar as verdadeiras das falsas.
Isso é colocar em causa a minha honestidade, é supor que poderia eu entregar-lhes dinheiro falso. É suspeitar de mim, apesar de não me conhecerem de parte alguma.
Não gosto. E faço questão de lhes dizer que não gosto. E de lhes dizer que não tenciono regressar a um estabelecimento comercial onde todos os clientes são considerados falsários até prova em contrário. Eu incluído.

Dirão que tenho mau feitio. Pois que digam!
Mas tenho para mim que se não devo fazer aos outros o que não gosto que façam comigo, o contrário também é verdade: não gosto que façam comigo aquilo que não faço aos outros.
E eu não ando por aí a suspeitar de tudo e todos, entendendo que o mundo existe para me enganar, vigarizar, burlar ou fazer de mim vítima de um qualquer outro crime ou dano.

Mas o certo é que não quero relacionar-me com gente que suspeita de mim só porque sim e que me trata como um potencial criminoso.

By me

Dinheiro



Foi aprovada a lei que proíbe transacções em dinheiro vivo acima de três mil euros.
Para além desse valor terá que ser usado qualquer outro meio de pagamento como cheque ou transferência bancária.
Esta lei, cheia de bondade, é agora criada para promover a transparência económica, fugas ao fisco e obstar a corrupções e lavagens de dinheiro ilícitas.
No entanto…
No entanto esta lei obriga a que os cidadãos tenham uma conta bancária. Por outras palavras, esta lei obriga a que os cidadãos tenham um contrato com terceiros para fazerem a sua vida. Terceiros esses que têm lucro com esses contratos.
Imaginemos, por exemplo, que eu vou poupando do meu salário (como se isso fosse possível nos tempos que correm!) e que ao fim de três ou quatro anos consigo o suficiente para comprar uma câmara fotográfica boa. Ou um carro usado em condições. Ou umas férias. Ou uma remodelação da casa.
Porque raio tenho eu que comunicar a uma entidade terceira que o faço? Porque raio tem uma entidade privada que ficar com os registos de tal transacção? Porque raio tem uma empresa que lucrar com as minhas poupanças se nada faz nesse sentido? Porque raio tenho que dizer ao mundo e a privados que comi salsicha no lugar de costeleta durante três anos para ir de férias?
O mundo em que vivemos está gradual mas firmemente a acabar com a privacidade dos cidadãos e a transformar os bancos em, mais que fiscais, chulos do trabalho e esforço de cada um.

E o totalitarismo securitário tanto acontece à direita como à esquerda ou ao centro. O desejo de dominar, controlar, mandar nos cidadãos é terrível, venha de onde vier.

By me 

quarta-feira, 19 de julho de 2017

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Tenho que agradecer a um médico, a um psicólogo e a um político pelas suas declarações públicas.
Com elas ajudaram a fracturar a sociedade portuguesa, fazendo estalar o verniz e mostrando o pior que ela tem.
Confesso que fico surpreendido pela quantidade de homofóbicos e xenófobos que existem neste país.

Faltam os misóginos e os marialvas, mas não deve demorar muito.
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O pau do gelado



É um dos males da idade adulta: pomos carimbos em tudo quanto é coisa, limitando as nossas reacções a essas classificações e seguindo em frente.
Alguns, olhando para esta imagem, talvez digam “Minimalismo”.
Outros dirão, sem demoras, “Lixo no chão”.
Uns poucos talvez acrescentem que “Este é o problema da sociedade moderna: superabundância.”
Os que sejam mais sensitivos pensarão que “Estava calor e alguém comeu um gelado apetitoso.”

Mas os putos, como eu fui e tantos milhares de outros comigo, olhariam para este pau de gelado e imaginariam o sólido castelo a construir. Ou a complexa ponte a erguer. Ou ainda a elegante casa de bonecas. Ou…
Não sei que faziam vocês, que lêem estas linhas e vêem esta imagem. Mas eu, e outros, em indo à praia, percorriamo-la de lés a lés, devagar e de olhos postos na areia, em busca de matéria-prima.
Isto, claro, se não acontecesse o cúmulo da sorte e este ser um pau premiado.

Nesse caso, fazíamos um procissão em direcção à loja, imaginando qual o prémio e fantasiando o que fazer com ele, junto com o sortudo ganhador.

By me

domingo, 16 de julho de 2017

Conversas



Um bom exercício a ser feito é o seguinte:
Contar quantas vezes, num só dia, usamos as expressões “faz favor”, “obrigado” e “desculpe”.

O resultado será muito interessante para nele ponderarmos à noite, de conversa com a almofada.

By me

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Se há coisa que é realmente igualitária é o direito ao disparate. À asneira. À bacorada.
Não importam as origens, o nível académico, a profissão ou o reconhecimento público.
Todos têm o direito a pensar e dizer as enormidades que entenderem. Claro que se for médico, actor, psicólogo ou político têm mais impacto, chegando essas absurdidades a mais gente, com os media a divulgarem. Fazendo-o com maior ou menor malícia.

Agora ter direito à senilidade, mais novo ou mais velho, é algo igualitário.
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Já lá estamos



Para os que se perguntam sobre onde isto vai parar, aqui fica uma resposta:
“Já lá estamos!”
Por enquanto já lá estamos!
E para quem acha que isto é pessimismo ou falta de vontade de mudança, aqui fica uma pergunta:
“E ideias novas para evoluir?”
Não há!
Por mais que olhemos em redor, por mais que procuremos entre pensadores e actuantes, todas as tendências e práticas são no sentido de, com uma ou outra roupagem, manter tudo como está.
Há mais de um século que estamos enquistados nas mesmas teorias, com ajustes em função das geopolíticas, dos mercados e das tecnologias. Mas as teorias levadas à prática são as mesmas.
As vontades de reduzir o fosso entre classes não vingam, nem entre quem compõe as classes superiores (não há lugar para mais!) nem entre quem compõe as classes inferiores (quero um lugar lá em cima!)
Mesmo aqueles que se apresentam ao povo com o que dizem ser alternativas democráticas são outras embalagens do mesmo produto. Podem mudar de pó para líquido ou para pastilhas mas continuam a ser detergente para colocar na máquina que continua a rolar, a rolar, a rolar…

Enquanto se não romper com os objectivos instituídos, os métodos pouco importarão, mesmo que uns mais apelativos ou inovadores que outros.
O que falta mesmo são objectivos concretos e diferentes. O que nos falta são ideias novas.


Até elas surgirem, não se preocupem com o “onde é que isto vai parar”. Já lá estamos.

By me

sexta-feira, 14 de julho de 2017

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É um erro comum confundir-se a frase “Aquela pessoa é minha amiga” com “Eu sou amigo daquela pessoa”.

E não, não me estou a referir às redes sociais.
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Antena



Há uns anos valentes, e por decisão governamental, a rede de emissores e retransmissores de televisão foi retirada da RTP para se constituir uma empresa autónoma.
Estava-se nas vésperas do surgimento de estações de televisão privadas e o argumento de então para tal decisão foi o de querer que todos, públicos ou privados, estivessem em pé de igualdade no acesso à rede de distribuição. Evitando-se assim situações monopolistas ou de privilégio.
Recordo que a TVI de então ponderou a criação da sua própria rede de emissores, pensando em rentabiliza-los com o então emergente negócio da rede de telemóveis. Nunca o chegou a fazer.
A decisão do governo de então foi polémica. A compensação dada à RTP pela perda do seu investimento de anos tocou as raias do caricata e tragicamente pequeno e passou ela a pagar pela utilização daquilo que construíra e fora seu. Parte, boa parte, do afundanço económico da empresa ficou a dever-se a este “negócio”.
Antevê-se agora um negócio inverso.
A empresa que detém a rede de emissores de televisão vai comprar uma estação de TV generalista. Privada.
Por outras palavras, a equidade no acesso à distribuição de televisão vai ficar posta em causa, ficando um canal privado com o monopólio da rede de emissores, podendo fazer o negócio a seu modo e para seu benefício.
Indo mais longe, é a mesma empresa que possui os emissores que detém a fatia de leão na distribuição de televisão por cabo. As infra estruturas são suas, estando o país assente nos seus cabos e fibras ópticas. Tal como detém uma grossa fatia na distribuição de internete, tanto fixa como móvel.
É sabido que a televisão, tal como a conhecemos hoje, está a prazo. Tanto a produção de conteúdos como o seu consumo. A evolução das tecnologias e as preferências do público então a mudar o modo de consumir e, a médio prazo, ver TV será tão anacrónico quando o rodar uma manivela para chamar a telefonista.
Mas deixar ficar o actual acesso à informação e entretenimento monopolizado nas mãos de privados, podendo manipular conteúdos em prol de interesses económicos ou políticos e, com isso, influir séria e notoriamente na vida do país, parece-me demasiado perigoso.
A apatia generalizada que se vive neste país no tocante às coisas públicas ou de serviço público está a conduzir-nos, lenta mas firmemente, para uma sociedade onde cada vez menos podemos decidir sobre a nossa vida e a dos nossos filhos.

E onde somos moeda de troca em negócios gigantescos, mudando de mãos e de donos tal como os servos da gleba medievais.

By me 

quinta-feira, 13 de julho de 2017

PdC



Com uma abertura destas, o que queriam? 
Uma grande profundidade de campo?

By me

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Desertificação a prazo



Fica a pergunta:
O que vai acontecer a Lisboa quando os fluxos turísticos migrarem para outras zonas porque nos bairros típicos só se encontram turistas? Porque as lojas do centro da cidade estão vocacionadas para recordações e comércio de luxo? Porque no lugar de habitações só se encontram alojamentos temporários?
O turismo, negócio rentável, tem que ser gerido a longo prazo, mantendo os factores que atraem e impedindo o excesso de oferta. Para que o negócio não morra e continue a funcionar.
Quem hoje se passear no centro da cidade de Lisboa já começa a ter dificuldade em ouvir falar português. Quem hoje entra numa loja é atendido primeiramente numa outra língua que não a nossa. Quem hoje se senta numa esplanada recebe uma ementa que, com sorte, contém algo escrito que entendamos.
De tanto querermos enriquecer com o turismo, afastamos os nativos para a periferia, restando o muito endinheirados a residir nos condomínios de luxo.
Mais ainda: quem procurar comprar uma casa no centro, uma das características que é fornecida é a idade avançada dos eventuais locatários, com o fito de mostrar que estão em vias de morrer e o imóvel ficará livre para especulação.
Ver a zona nobre da cidade repleta de lojas fechadas ou, em alternativa, de recordações ou franshisings é confrangedor.
Ainda se, ao menos, os gestores da coisa pública olhassem para o que acontece em outras cidades de outros países…
E quando o médio oriente se pacificar e for alternativa economicamente concorrencial?


By me

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Não consigo entender esta moda de beber chás, refrigerantes ou cervejas por copos ou canecas com o formato de frascos. Com rosca de vidro e tudo.
Os publicitários, que já pouco conseguem inventar, viraram-se para o absurdo, foi?

Ou havia excesso de sílica nas vidreiras e havia que escoar o produto?
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“Tou xim! É p’ra mim!”



Quem ainda se lembra desta fabulosa tirada de um excelente anúncio televisivo?
Poucos, provavelmente. E, no entanto, marcou o início de algo que veio mudar, radicalmente, as vidas dos portugueses, citadinos ou nem isso. Refiro-me à introdução nos hábitos quotidianos do uso dos telefones celulares, também conhecidos por telemóveis ou, minimalisticamente, por telelé.
E esta alteração de hábitos foi tão profunda, tão generalizada, que se tornou num “case study” de como um país, nem por isso muito desenvolvido, se tornou em pouco tempo um dos maiores consumidores “per capita”desta tecnologia. Ao que julgo saber, apenas ultrapassados por Israel, aqui por outros motivos, que se prendem com a sua história distante e com a sua história actual.
Em qualquer dos casos, era normal antes desta inovação, ver os telefones públicos ocupados nas horas de ponta, por vezes até com fila de espera, com gente por perto a pedir trocos. Aliás, uma inovação a que muitos aderiram no uso destes aparelhos públicos foi o “credifone”, uma espécie de cartão de crédito, pré-pago, que obstava à falta de moedas e, ao mesmo tempo, acabava por aumentar o tempo que se estava à conversa, para gáudio e aumento de lucros dos então TLP, agora PT.

Mas o cúmulo do caricato foi o eu ter estado à espera, para conseguir fazer esta imagem sem gente em campo, que duas velhotas acabassem o telefonema que faziam aqui mesmo… a partir de um telemóvel. Velhos hábitos adaptados!

By me

terça-feira, 11 de julho de 2017

Chicas espertas

Vi-as chegar. Duas moçoilas, de vinte e troca o passo, vestidas para muito calor ou muito exibir. Nem importa.
Pararam junto do início da fila, que tinha umas talvez quarenta pessoas, olharam para aquela minúscula multidão, e deixaram-se ficar. Topei-as.
Quando o autocarro abriu a porta, os que estavam na fila começaram a entrar. Com a lentidão habitual. Até que, quase na minha vez, deram o golpe.
Como se nada fosse com elas, chegaram-se à frente e uma delas ainda subiu o primeiro degrau. Com muito pouca sorte, que estava ao alcance do meu braço.
Se a sua pele acobreada for de ficar com nódoas negras, terá o que mostrar nos próximos dias, que a minha mão filou-a pelo braço por alturas dos bícepes e puxei-a, com um valente “Alto! Onde pensa que vai?”, suficientemente volumoso para se ouvir dentro e fora do autocarro.
A amiga, ainda na rua, protestou com um “Estávamos distraídas, na conversa”, só para ver se pegava.
E a arredada, já no passeio, lançou em tom de insulto:
“Ele está é mal amado!”
Parei entre a porta e o obliterador, voltei-me e, por cima dos ombros de quem me seguia, retorqui:
“Mal-amado não estarei eu. Mas que você é mal-educada e arrogante, nenhum de nós tem dúvidas!”
E segui.
Não ouvi mais nada que não fosse, lá mais atrás no autocarro, a continuação do burburinho que se havia levantado com o desplante das caramelas.


By me

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Sobre o caso de o Ministério Público ter acusado dezoito agentes da PSP de agressão, falsificação de testemunho e injúria caluniosa, vem a PSP declarar que a presunção de inocência é válida até trânsito em julgado.
E é isto mesmo que diz a lei e o princípio de justiça.
Suponho é que não seja praticado pelos agentes de justiça e segurança, quando julgam não sendo juízes e condenam sem contraditório. Nas ruas ou esquadras, pela palavra e pela agressão.
É sabido que não é prática generalizada, sendo mesmo restrita a alguns – maus - agentes.

Mas acontece e a corporação está a dar a cara pelos seus, antes de transitado em julgado. 
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Todos diferentes todos iguais



A notícia do dia é a acusação formal de racismo e tortura por polícias numa esquadra.
Vai sendo tempo de nos deixarmos do politicamente correcto e tratarmos as coisas como elas são.
Infelizmente, a segregação não acontece apenas nas esquadras (e não será em todas).
Onde estão os negros no atendimento ao público? Nos serviços do estado ou nas empresas? Onde estão os negros nas antenas de televisão, entretenimento ou informação?
Quem olhar para as escolas profissionais ou universidades encontra-os. Poucos mas existem.
Para onde vão então depois?
O problema da segregação racial não é apenas nas esquadras (e serão poucas, penso). É na falta de equidade nas oportunidades. Em situação de igualdade, um negro é sempre preterido em favor de um branco. No atendimento, no trabalho, na vida pública… Até no arrendamento de habitação.
Faça-se uma das poucas excepções: o actual governo, que também neste campo conseguiu ser diferente.

Somos uma sociedade publicamente igualitária mas privadamente segregacionista.

By me 

Fazer ou tirar



“Então e fotografia? Tens tirado muitas, ultimamente?”
Eis uma pergunta que oiço volta e meia.
“Por acaso até não.”, costumo responder. “Há mais de três semanas que não tiro uma fotografia.”
“Como não?! Logo tu, estares tanto tempo sem tirar uma fotografia!”
“Bem… há três semanas tirei uma fotografia da parede. Já estava farto de a ver ali. Mas pendurei logo outra. Agora fazer fotografia… todos os dias! Ainda há pouco, ali no pátio.”
“Pronto! Lá estás tu com as tuas coisas!”
“Eu explico:

Tirar, o verbo “tirar”, tem uma carga negativa, de transformação: tirar a carteira a alguém, tirar o bolo do forno, tirar o lixo.
Já o fazer é positivo, mesmo que negativo. Alguma coisa que não existia passou a existir: fazer um assalto, fazer um bolo, fazer limpeza.
Não sei o que fazes com a câmara ou que atitude tens para com o seu resultado. Mas eu encaro o acto fotográfico como positivo. Criativo.
A partir de coisa alguma – um sensor sem informação ou cristais de prata virgens de luz, construo algo que não existia antes: uma fotografia. Poderá a fotografia ser boa ou má, a sua consequência ser positiva ou negativa. Mas fiz (verbo fazer) algo que não existia. Criei.
Tiro fotografias da gaveta, do arquivo, da parede, até da carteira.
Mas com a câmara faço fotografias! Todos os dias!”


Este diálogo, palavra por palavra, não creio que alguma vez o tenha vivido. Mas inúmeras variações sobre o mesmo tema… já lhes perdi a conta.

By me

segunda-feira, 10 de julho de 2017

A melancolia de uma escada vazia



By me

Compras



Na fila para pagar no supermercado.
Uma senhora a ser atendida, uma outra com os seus produtos já no tapete, eu com um cesto e, atrás, um homem com quatro artigos na mão. Três de carne, talvez de um quilo, e um pacote de massa de canudos.
Quando chegou a minha vez de colocar os meus artigos no tapete disse ao homem para passar à frente. Aquilo pesava um pedaço e não é cómodo estar com as embalagens nos braços, encostadas ao peito, à espera de vez.
Abriu ele os olhos, abriu a mocinha atrás dele entretanto chegada, abriu o homem da caixa… Parecia uma festa de olhos abertos.
“A sério?” perguntou ele.
“Claro! Isso assim agarrado não dá jeito nenhum.”
Agradeceu ao passar, agradeceu quando se afastou, depois de pagar.
E eu, já de regresso a casa e com a mochila das compras nas costas, não consegui esquecer o seu sorriso de agradecimento.

Ganhei o dia.

By me

Vida privada



Bera, mas bera mesmo, é ser considerado ilegal e punível por lei o graffitar um espaço e ser considerado legal a publicidade exterior.
Que se a primeira, é uma expressão individual, mesmo que de qualidade duvidosa, ou mesmo uma identidade grupal, já a segunda é uma agressão permanente a quem estiver no espaço público, não sendo possível fugir aos permanentes apelos, quantas vezes enganosos, a menos que andemos de olhos fechados.
Se os fabricantes, através dos publicitários e painéis exteriores, nos podem quase forçar a consumir os seus produtos, faz todo o sentido que cada indivíduo possa publicitar as suas mensagens, quer de afirmação pessoal quer de identidade.

Claro que os graffitys fogem ao controlo da moral pública, sendo muitos deles subversivos.

E isso é inadmissível!

By me

domingo, 9 de julho de 2017

sábado, 8 de julho de 2017

Modos de ver



“(…)
Uma imagem é uma vista que foi recriada ou reproduzida.

É uma aparência, ou um conjunto de aparências, que foi isolada do local e do tempo em que primeiro se deu o seu aparecimento, e conservada - por alguns momentos ou por uns séculos.

Todas as imagens corporizam um modo de ver. Mesmo uma fotografia. As fotografias não são, como muitas vezes se pensa, um mero registo mecânico. Sempre que olhamos uma fotografia tomamos consciência, mesmo que vagamente, de que o fotógrafo seleccionou aquela vista de entre uma infinidade de outras vistas possíveis. Isto é verdade mesmo para o mais banal instantâneo de família. O modo de ver do fotógrafo reflecte-se na sua escolha do tema. O modo de ver do pintor reconstitui-se através das marcas que deixa na tela ou no papel. Todavia, embora todas as imagens corporizem um modo de ver, a nossa percepção e a nossa apreciação de uma imagem dependem também do nosso próprio modo de ver.

(Por exemplo, Sheila pode ser uma entre vinte pessoas; mas, por motivos pessoais, só temos olhos para ela.)

As imagens foram feitas, de princípio, para evocar a aparência de algo ausente. A pouco e pouco, porém, tornou-se evidente que uma imagem podia sobreviver àquilo que representava; nesse caso, mostrava como algo ou alguém tinham sido - e, consequentemente, como o tema havia sido visto por outras pessoas. Mais tarde ainda, a visão específica do fazedor de imagens foi também reconhecida como parte integrante do registo. A imagem tornou-se um registo de como X tinha visto Y.

Constituiu isto o resultado de uma crescente tomada de consciência da individualidade, acompanhada de uma crescente consciência da história. Seria ousado pretender datar com rigor este último avanço. No entanto, pode afirmar-se com certeza que esta consciência existe na Europa desde o início do Renascimento. Nenhuma outra espécie de vestígio ou de texto do passado nos pode dar um testemunho tão directo sobre o mundo que rodeou outras pessoas, noutros tempos. Sob este aspecto, as imagens são mais rigorosas e mais ricas que a literatura. Esta afirmação não nega a qualidade expressiva ou imaginativa da arte, como se a considerássemos uma mera prova documental; quanto mais imaginativa é a obra, mais profundamente nos permite compartilhar da experiência que o artista teve do visível.
Ainda assim, quando uma imagem é apresentada como obra de arte, o modo como as pessoas olham para ela é condicionado por toda uma série de pressupostos adquiridos sobre a arte. Pressupostos que se ligam a:

Beleza
Verdade
Génio
Civilização
Forma
Estatuto Social
Gosto
etc.

Muitos destes pressupostos não se encontram já ajustados ao mundo tal como ele é (o "mundo tal como ele é" é mais do que um puro facto objectivo: inclui também a consciência). Em desacordo com o presente, estes pressupostos obscurecem o passado. Mistificam, em vez de clarificar. O passado nunca está pronto a ser descoberto, reconhecido, exactamente como foi. A história reconstitui sempre uma relação entre um presente e o seu passado. Por consequência, o medo do presente conduz à mistificação do passado. O passado não serve para se viver nele; é uma mina de conclusões que utilizamos para agir. A mistificação do passado arrasta consigo uma perda dupla: as obras de arte tornam-se desnecessariamente remotas; e o passado dá-nos menos conclusões a completar com a acção.

Quando "vemos" uma paisagem, situamo-nos nela. Se "víssemos" a arte do passado, situar-nos-íamos na história. Quando nos impedem de a ver, estamos a ser privados da história, que nos pertence. A quem lucra esta privação? Ao fim e ao cabo, a arte do passado vem sendo mistificada porque uma minoria privilegiada se esforça por inventar uma história que possa justificar retrospectivamente o papel das classes dirigentes e porque tal justificação já não faz sentido em termos modernos. Por isso, inevitavelmente, mistifica.

(…)

Excerto da obra “Modos de ver” de John Berger.

Editado por “Edições 70”, na colecção “Arte e comunicação”, Lisboa, 1999
Imagem: by me

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“Junta-te aos bons e serás como eles, junta-te aos maus e serás pior que eles”, diz o povo na sua sabedoria.

Ando há demasiado tempo a ler publicações nas redes sociais para conseguir escrever ou fotografar algo que se veja.

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By me

sexta-feira, 7 de julho de 2017

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Parece que os festivais de música têm medidas de segurança semelhantes às que são usadas para embarcar para um avião: revista à bagagem, inspecção corporal por agentes masculinos ou femininos, consoante o caso.
Este será, a partir de agora, a principal razão para não ir a nenhum desses festivais.
Não admito que duvidem da minha bondade de intenções e que tenha que demonstrar que não pretendo fazer mal a ninguém.
Essa atitude suspeitosa, vigilante, inquisidora, securitária, em que todos são suspeitos até prova e contrário, não é a minha forma de me relacionar com o mundo e os meus semelhantes.
E não aceito que me tratem como tal.
Lamento que, em nome da segurança, tantos milhares aceitem ser assim mal tratados.
Eu não!

Nem em aviões, nem em festivais, nem onde quer que seja.

By me

quinta-feira, 6 de julho de 2017

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A notícia tinha (ou tem ainda) o seguinte título:
“Polícia do Vaticano interrompe orgia gay em apartamento de conselheiro do Papa”.
O assunto, que terá tido divulgação em Itália, foi considerada suficientemente importante para ser divulgada por cá.
No entanto, ficam-me algumas dúvidas sobre a questão.
Que crime estaria a ser cometido para que a polícia tivesse que intervir?
Estaria a acontecer alguma violação? Estariam menores envolvidos? É ilegal a prática homossexual? É esta prática punida com penas de prisão ou morte como em alguns pontos do globo, que o “ocidente” lamenta e condena? É um escândalo porquê?
Eu diria que escandaloso é a polícia intervir numa situação destas. Eu diria que escandaloso é os jornais disso fazerem eco. Eu diria que escandaloso é a sociedade, tão crítica e agressiva no que aos de fora diz respeito, fazer exactamente o mesmo no seu seio.
Preocupem-se, senhores polícias, jornalistas e juízes de sofá, com as assimetrias sociais, com os que realmente fazem mal a terceiros, no corpo e na alma, com os que enfrentam a morte para fugir dela.
Já quase não se ouve falar, por exemplo, no que se passa na Grécia. Ou na Síria. Ou na Palestina. Ou das mulheres nos países “amigos” árabes e africanos. Ou nos escândalos político-económicos no Brasil.
Para já não referir o povo Mapuche do Chile. Ou o que é ser deficiente no Japão.
Agora sexo consentido?
E de caminho: porque ilustraram semelhante notícia com uma fotografia do Papa? Ele estava no apartamento? Foi conivente com o que lá acontecia? Deu a ordem de intervenção da polícia? Excomungou os que lá estavam?


Ide dar banho ao cão, puritanos de pacotilha.

By me 

quarta-feira, 5 de julho de 2017

Mau feitio



Tenho duas certezas na vida: que irei morrer e que ninguém escreverá na minha tumba “aqui jaz um tipo de bom feitio”!

Precisei de comprar uma pasta. Daquelas de cartão, com elástico, em tamanho A4, barata de preferência, e que não tivesse desenhos demasiado extravagantes.
Podendo ir a vários locais, optei por fazer o negócio numa papelaria aqui da minha zona. A diferença de preço existe, é verdade, mas sempre vou dando o meu apoio ao comércio local. Que merece e necessita.
Entrei na loja, disse ao que ia, a senhora mostrou-me várias, escolhi uma, ela guardou as restantes e eu estiquei-lhe uma nota de cinco euros para pagar.
Nesse momento tocou um telemóvel. Que estava no seu bolso das calças.
Pousou a nota no balcão, pôs-lhe a mão esquerda em cima e, com a direita, atendeu a chamada. Sem uma palavra que fosse para mim.
Fiquei a saber que falava com uma tal de Isabel, que tinha uma prima e um marido e que havia problemas no casal.
E fiquei a saber tudo isso porque a chamada durou cinco, dez, vinte, trinta, cinquenta, oitenta segundos, talvez mais.
Quando me fartei de esperar pacientemente, estendi a mão para a nota e retirei-a de sob a sua. Olhou para mim, estranhando.
Guardei-a na carteira com um sorriso, ao mesmo tempo que empurrava para ela a tal pasta que ainda estava no balcão.
E desejei-lhe as boas tardes, enquanto ela tentava, em simultâneo, responder ao telefone e dizer-me já nem sei o quê.
Saí!

Como disse acima, não tenho bom feitio. Mas vou melhorando.
É que consegui não recorrer a vernáculo nem levantar o tom de voz.


Talvez que daqui a duzentos e cinquenta anos eu esteja no ponto certo para aturar coisas destas sem reagir.

By me