Tratando-se de um
aparelho de medida, ainda que de tempo, tenho que ser rigoroso. Ou não fornecer
valores exactos.
Assim, não corro o
risco de mentir se disser que possuo este despertador há mais de quinze anos.
Simpaticamente,
ainda que nem sempre lhe tenha retribuído da mesma forma, tem-me acordado todas
as manhãs que lhe peço, à hora prevista. E, confesso, se tem aguentado todo
este tempo tem sido porque não dorme a meu lado, na mesa-de-cabeceira, mas
antes do outro lado do quarto, o que me tem obrigado a levantar para o
desligar. Truques nas técnicas de acordar e truques na técnica de manter os
equipamentos em bom estado, que nunca foi mimoseado com nenhuma “carícia” menos
suave. Quando lá chego já vou mais que meio acordado e já respondo pelos meus
actos.
Pois este heróico despertador
decidiu alinhar com o actual governo e entrar em período de contenção forçada:
mostra-me as horas mas já não me acorda. Talvez que para poupar energia, talvez
que ache que deve garantir a reforma enquanto pode, talvez porque se cansou de
sentir alguns impropérios que algum vizinho lhe vem lançando quando toca a
estas horas e outras ainda mais madrugadoras. Ossos do ofício – o meu,
entenda-se.
Mas eu, que até
gosto dele, não lhe farei um enterro de estadão. Melhor dizendo, não me
desfarei dele, que gosto de lhe ver os números, no escurinho da noite, e de
saber que ainda tenho mais algum tempo de sono antes que lá tenha que ir.
Irá continuar lá,
do outro lado do quarto, pacatamente mostrando as horas, enquanto reservo a
ingrata tarefa de me acordar para outros que por cá tenho e que, azar da
vizinhança, até são mais barulhentos.
É que de um amigo
não nos desfazemos, mesmo que sejam os que nos tiram da cama.
Texto e imagem: by
me
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