Tem mais de dez
anos, esta história.
Já depois de
jantar batem-me à porta. Era um vizinho que queria saber se sabia eu alguma
coisa de electricidade. Ao chegar a casa, tinha tido um estoiro e ficara sem
energia em casa.
Bem, lá peguei em
duas ou três ferramentas para os primeiros impactos, bem como uma lanterna, e lá
fomos.
À chegada, estava
a esposa já às voltas com o quadro eléctrico. Tinha aberto a portinhola, tirado
a cobertura metálica das ligações dos disjuntores, e preparava-se para neles
actuar.
Disse-me ela, à
luz da vela que a alumiava, e no seu mau português (ela escocesa, ele
brasileiro), que o estoiro viera dali e que lhe parecia haver cabos mal
apertados.
Mal apertados
teria ela alguns dos seus próprio parafusos, que estava a querer fazer a coisa,
não com uma chave de fendas isolada, mas antes com uma faca. De mesa, toda em
metal, cabo incluído.
Passei-me!
Lembrando-me do
meu inglês de docas, lancei-lhe meia dúzia de impropérios que, em circunstâncias
normais, não os diria. Mas a situação também não era normal!
Nada disse ela. Baixou
a cabeça, deu meia volta, e seguiu para o interior da casa, escura de breu que
estava.
Lá tratei do que
lhes cortara a luz – um curto na lâmpada de entrada - e saí.
Passados uns dias
encontro no café o marido, que nada havia dito que não um “obrigado” muito
sumido. Ia eu para lhe pedir desculpas do meu excesso de linguagem, e ele veio
agradecer-me isso mesmo. Que a mulher tinha mania que tudo sabia, mas que lhe
havia prometido não mais se “esticar” em termos eléctricos.
Vem esta história
a propósito da mania que temos de usar a primeira coisa que temos à mão para
resolver as situações. E nem sempre a mais certa.
Um destes dias,
ainda em pleno uso de todos os membros mas não das faculdades, tive que abrir
um isqueiro Zippo mais teimoso. E, à falta de melhor sem me levantar, tratei de
usar a ponta de um velho corta-papéis que tenho. Resultado: parti-lhe a ponta.
Um corta-papéis
sem ponta, mesmo que usado primordialmente para abrir cartas de contas a pagar,
é uma tristeza.
Foi por isso que,
tempos depois e ao entrar numa loja de “aventura” em busca de um colete,
regressei de lá com o que vedes. Razoavelmente barato, não desenhado para
cortar papel, mas achei graça ao cabo forrado a cordão, bem da mesma cor do
estojo – pouco prático, por sinal.
Se esta faca em
corta-papel transformada durar tanto quanto o seu antecessor, deixá-la-ei de
herança. E, se não se lhe souber a história, coisas boas contarão os vindouros.
Texto e imagem: by me
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