quarta-feira, 28 de março de 2012

A vitória




Tenho um ódio visceral à competição. Entendo que não tenho que provar perante ninguém as minhas qualidades, nem tenho que tentar afirmar-me melhor que quem quer que seja.
E, tal como no universo, cada um é o que é, com as suas qualidades e defeitos, também eu tenho a minha cota parte de ambos, não sendo nem melhor nem pior que ninguém: sou eu!
Há, no entanto, um competidor terrível, que me tira o sono e sobre quem tenho sempre o maior prazer em vencer: eu mesmo.
Cada pequena vitória que consigo sobre mim mesmo tem, do meu ponto de vista, o mesmo sabor que um medalha olímpica ou uma taça do mundo. Faltaria apenas o hastear da bandeira ou o tocar do hino, tivesse eu algum deles.
Foi assim que entendi como uma vitória assombrosa o conseguir segurar, tombar e dar-lhe o uso previsto – beber – um copo de cerveja preta com a mão esquerda. Que saudades que tinha disso e que satisfação fazê-lo, mesmo com algum incómodo doloroso. Vitória!
Mas sendo certo que celebrar sozinho uma vitória nem sempre tem graça, decidi que mais alguém haveria de sorrir. Senão do que havia conseguido, de qualquer outra coisa.
Assim, quando a Andreia – soube-lhe o nome porque mo disse de acordo com as regras da casa, que nunca a havia visto – me pôs na mesa a entrada e disse “bom apetite!” como sempre, atirei-lhe com o ar mais escandalizado que consegui fazer. “Não diga isso, por amor de deus!”
Parou no seu trajecto, olhando para mim sem perceber, e continuei:
“Sendo apetite vontade de comer e sendo que estou num restaurante de livre vontade, apetite já eu trago. Certo?”
“Ah, bem, sabe, é o hábito…”
“Bem sei. E se quer ser simpática e fazer votos de qualquer coisa ao servir um jantar, diga antes “bom proveito” ou “que lhe saiba bem”. É que apetite já nós temos.”
Tomei o seu sorriso divertido (a casa estava quase vazia, entenda-se) como celebrando a minha vitória esquerdina sobre copos e cervejas. Que a piada, velha que é de anos e aprendida com um amigo, já a mim me cansa de ouvir.

By me