A história tem já
vários anos.
Estava eu num
estabelecimento comercial muito grande e muito diversificado, de que não gosto
mas que tem uma secção de fotografia com artigos menos comuns nas outras.
E sou abordado por
uma senhora. Velhinha e pequenina, tudo o que tinha em cima era bom e caro, das
roupas aos adereços, pintada na cara e no cabelo, mas nada que destoasse ou que
fosse em excesso.
Diz-me ela,
olhando-me nos olhos, depois de me ter olhado de cima a baixo:
“O senhor é
pintor?”
Abanei, porque a
pergunta era-me novidade, e disse-lhe que não.
“Ah”, continuou, “Então
é escultor.”
“Também não. Trabalho
numa grande empresa de audiovisual e, nas horas vagas, faço fotografia.”
“Ah! Então é
artista!”, disse ela toda satisfeita.
E seguiu caminho,
deixando-me ali plantado no meio daqueles corredores, com um sorriso estúpido
estampado na cara.
É que, caramba, têm
as pessoas uma necessidade tremenda de classificar com estereótipos aquilo que
lhes sai da regularidade. Seja no ofício, seja na religião, seja na política,
seja na sexualidade, seja no estrato económico.
E arranjam
carimbos, nomes, rótulos, que façam o estranho entrar numa qualquer classificação
pré-concebida, que lhes dê a tranquilidade de gostar ou não de acordo com a
etiqueta que penduram ao pescoço de quem passa.
Curiosamente, de
então para cá já umas três ou quatro vezes me confundiram com pintura, logo eu
que me não passeio com pincéis ou telas mas tão só com câmaras e tripés.
Quanto ao resto,
aquilo que faço mais não é que, com o rectângulo do meu visor, ir recortando
pedaços do mundo em que vivo, como que recolhendo as peças de um puzzle com o
qual, eventualmente, poderei construir um outro mundo, quiçá melhor, mas que me
agrade.
By me
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