Por muito que
possa parecer o contrário, eu não quero que este governo caia.
Isto porque, e
usando as palavras desta senhora, com a sabedoria que o tempo lhe deu e em
frente ao palácio de São Bento, “Atrás deste vem outro igual ou pior”. Quer
seja de iniciativa presidencial ou fruto de novas eleições.
É que o problema
actual não advém do governo, este ou outro.
Está, antes sim,
na forma como os governos funcionam, como os seus membros chegam aos
respectivos lugares e como se relacionam com os cidadãos. E vice-versa: como os
cidadãos se organizam, como as suas ideias são (ou não) postas em prática e
como eles, cidadãos, se responsabilizam pelas suas próprias decisões.
Por outras
palavras, o que ponho em causa é a forma como a nossa sociedade se organiza,
governa e deixa governar.
No sistema actual,
os cidadãos elegem o presidente da República, elegem os deputados e desinteressam-se
da governação. E tanto o presidente quanto a assembleia, de onde é escolhido o
primeiro-ministro, passam a fazer o seu trabalho autisticamente, sem que as
suas decisões possam ser objecto de mudança por parte dos cidadãos.
Aliás, bem
definidor deste sistema hermético, é o uso das expressões “sociedade civil” e “classe
política”. Uma separação total, em que se dá a entender que a segunda, sendo
uma elite, tem plenos poderes para decidir sobre a primeira, goste-se ou não
das decisões.
Aquilo que quero,
mais que a queda de um governo, é a alteração do regime!
Alteração de leis
e alteração de consciências. Os representantes do povo têm que poder ser
responsabilizados por este. Têm que poder ser questionados, um por um, sobre o
seu trabalho na gestão da coisa pública.
Não podem, os
representantes do povo, ser mais fieis a uma disciplina partidária, definida
por um comité central ou secretariado nacional, que ao povo ou eleitores. Até
porque um partido político é uma associação privada, como um clube ou um condomínio,
onde só entra e age quem os seus membros decidem. Ver o país gerido por
associações privadas é o mesmo que privatizar a gestão da coisa pública. Saber
que são associações privadas que definem as leis que regem um povo não é, de
todo, a definição de liberdade ou mesmo de democracia.
Portanto, eu não
quero que o governo caia! Quero, antes sim, que o regime caia e seja mudado
radicalmente!
Quero poder
interpelar na cara quem me representa. Quero que todo e qualquer cidadão possa
intervir directamente na feitura das leis nacionais, sem ter que ser filiado
num clube privado.
Quero que a
vontade do povo seja, de facto, considerada como vontade a cumprir e não apenas
como ruído de fundo durante reuniões de elites.
O conceito de “Acracia”
é demasiadamente elaborado e responsabilizante para ser considerado como possível
nas próximas gerações. Mas o regime democrata representativo é por demais
autista e hermético para que possa servir os anseios do povo. Tal como não é
respeitador da liberdade dos cidadãos. Liberdade de pensar, liberdade de falar,
liberdade de agir.
Eu não quero que o
governo caia! Quero que o regime mude! Para que ninguém possa dizer,
conformado, “Atrás deste vem outro igual ou pior”!
By me
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