segunda-feira, 13 de julho de 2015

Os catadores



Somos ambos catadores de lixo, ele e eu.
Enquanto ele vai virando sacos e latas em busca de um petisco, eu vou olhando o que me vai cercando, catando com a minha câmara pedaços abandonados do género Humano.
Não passa ele fome, já que vive com uma família aqui, na minha rua.
Vem para a rua de manhã, quando eles saem para trabalhar, e recolhe à noite, quando voltam. O que ele vai recolhendo e trincando é mais para a gulodice que para matar a fome, que, acredito, alguns dos cheiros em sacos e caixotes serão apetitosos.
Quanto a mim, que também não me falta de comer ou com que alimentar a minha fome de fotografar, é igualmente uma questão de oportunidade, que curioso mesmo é o que se vai deitando fora nesta sociedade consumista e de desperdício. Em particular sapatos, mas isso já é uma mania minha: imaginar o que já foram vividos e por onde já andaram os protectores dos membros inferiores.
Lamentavelmente, nem o revirar dele nem o meu fotografar se comparam aos catadores de lixo profissionais que deambulam com regularidade no meu bairro (e em tantos outros!). Dependem eles do lixo dos outros, não para satisfazerem um apetite ocasional ou um olhar mais sarcástico ou imaginativo mas, antes sim, para responderem aos apelos do estômago, à fraqueza do corpo, à fome mesmo!
E vou-os vendo, em trajectos regulares, uns mais lentos, que a idade já não permite mais, outros mais rápidos, tentando que o dia “renda”, abrindo contentores e sacos, arrastando consigo sacolas com rodas ou a tiracolo, que vão tentando encher com as sobras dos demais e que, sabe-se lá como, transformarão nas suas riquezas do dia.

Dos catadores de lixo do meu bairro, este é o único que, despudoradamente e sem escrúpulos, consigo fotografar.

By me

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