O domingo, além de
soalheiro, estava quentinho.
Por isso o Jardim
da Estrela encheu-se de gente, como eu o gosto de ver. De todas as idades e estratos,
como lhe é habitual.
E, para além
daquilo que estava a fazer e que me deu muito gozo, foi particularmente
interessante constatar a quantidade de gente que, de uma forma ou de outra, ali
se havia cruzado comigo à conta da fotografia e do Old-Fashion, que disso se
recordava e que por causa disso acabou por meter conversa. Para já não falar
nas velhas senhoras que costumam polir os bancos e que entre si cochicharam a
meu respeito, relembrando alguma fotografia que lhes terei feito (que o meu
olho e ouvido, apesar de a conversa não ser comigo, deu p’la coisa).
Dessa época, fica
uma das fotografias feitas nesse âmbito e de que mais gosto, p’la imagem e p’la
estória que lhe está associada, e um textinho, escrito num desses dias de Inverno.
Aguaceiros? Pois
sim!
Se, ao sairdes de
casa num início de fim de semana, constatardes que será de aguaceiros, não
pondereis seriamente se ficareis em casa ou se saireis para fotografar. Saí!
Tereis assim
oportunidade de retratar:
gente dos oito aos
noventa e dois anos,
solitários,
aos pares
ou em grupo,
pais e filhos,
namorados, primos,
gémeos,
colegas
ou irmanados na
mesma limitação,
faladores que nem
gralhas
ou surdos-mudos de
nascença.
Canalizadores,
esteticistas,
psicólogos,
arquitectos,
diplomatas,
armadores de
ferro,
serventes,
estudantes,
reformados,
donas-de-casa,
professores,
operadores de
lavandaria,
empregados de
escritório,
técnicos de informática,
carpinteiros,
técnicos de
elevadores
ou serralheiros
mecânicos.
Podeis ainda:
rir e fazer rir,
sonhar e fazer
sonhar,
fotografar e
serdes fotografado.
Cobrir três dos
cinco continentes sem sair do lugar,
escrever, soletrar
ou copiar nomes arrevesados,
ter gente a não
acreditar na oferta insólita
e outros a querer
aproveitá-la até à última gota.
Ver passar:
a polícia,
o vendedor de
flores,
o das castanhas
assadas,
o guarda-jardim,
os que passeiam o
cão
e por eles ser
cumprimentado como um da casa.
Ser confidente de
uma metade de um arrufo de namorados de longa data
e prometer-lhe uma
compensação por uma fotografia roubada.
Ver alguém triste
e arrancar-lhe um sorriso porque,
afinal, não é
exactamente como se vê no espelho.
Não!
Se o fim de semana
prometer aguaceiros, saí e fotografai!
Não há duas nuvens
iguais, tal como não há pessoas iguais nem fotografias iguais.
Mas os sorrisos,
esses, provocam sempre o mesmo: outro sorriso.
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