segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O Jardim da Estrela




O domingo, além de soalheiro, estava quentinho.
Por isso o Jardim da Estrela encheu-se de gente, como eu o gosto de ver. De todas as idades e estratos, como lhe é habitual.
E, para além daquilo que estava a fazer e que me deu muito gozo, foi particularmente interessante constatar a quantidade de gente que, de uma forma ou de outra, ali se havia cruzado comigo à conta da fotografia e do Old-Fashion, que disso se recordava e que por causa disso acabou por meter conversa. Para já não falar nas velhas senhoras que costumam polir os bancos e que entre si cochicharam a meu respeito, relembrando alguma fotografia que lhes terei feito (que o meu olho e ouvido, apesar de a conversa não ser comigo, deu p’la coisa).
Dessa época, fica uma das fotografias feitas nesse âmbito e de que mais gosto, p’la imagem e p’la estória que lhe está associada, e um textinho, escrito num desses dias de Inverno.

Aguaceiros? Pois sim!

Se, ao sairdes de casa num início de fim de semana, constatardes que será de aguaceiros, não pondereis seriamente se ficareis em casa ou se saireis para fotografar. Saí!
Tereis assim oportunidade de retratar:
gente dos oito aos noventa e dois anos,
solitários,
aos pares
ou em grupo,
pais e filhos,
namorados, primos,
gémeos,
colegas
ou irmanados na mesma limitação,
faladores que nem gralhas
ou surdos-mudos de nascença.

Canalizadores,
esteticistas,
psicólogos,
arquitectos,
diplomatas,
armadores de ferro,
serventes,
estudantes,
reformados,
donas-de-casa,
professores,
operadores de lavandaria,
empregados de escritório,
técnicos de informática,
carpinteiros,
técnicos de elevadores
ou serralheiros mecânicos.

Podeis ainda:
rir e fazer rir,
sonhar e fazer sonhar,
fotografar e serdes fotografado.

Cobrir três dos cinco continentes sem sair do lugar,
escrever, soletrar ou copiar nomes arrevesados,
ter gente a não acreditar na oferta insólita
e outros a querer aproveitá-la até à última gota.

Ver passar:
a polícia,
o vendedor de flores,
o das castanhas assadas,
o guarda-jardim,
os que passeiam o cão
e por eles ser cumprimentado como um da casa.

Ser confidente de uma metade de um arrufo de namorados de longa data
e prometer-lhe uma compensação por uma fotografia roubada.
Ver alguém triste e arrancar-lhe um sorriso porque,
afinal, não é exactamente como se vê no espelho.

Não!
Se o fim de semana prometer aguaceiros, saí e fotografai!
Não há duas nuvens iguais, tal como não há pessoas iguais nem fotografias iguais.
Mas os sorrisos, esses, provocam sempre o mesmo: outro sorriso.

Texto e imagem: by me

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