domingo, 29 de janeiro de 2012

Meio século




E uns trocos. Foi o tempo que esperei para ser alvo de uma tentativa de roubo (tecnicamente furto) nos transportes públicos.
Em boa medida, a culpa foi minha. Já sabia que o eléctrico 28 de Lisboa é zona de ataque de carteiristas, principalmente em dias de feira da ladra. Os jornais falaram do assunto, os carros amarelos vão sempre cheios e até os comerciantes da Rua da Conceição, na baixa lisboeta conhecem alguns deles.
E eu, só parcialmente consciente da coisa, embarquei num, tendo a minha atenção concentrada nos bolsos, deixando o resto tranquilo porque sabido seguro.
No entanto a dado passo sinto um movimento menos comum na minha bolsa. Bolsa esta que transporta o meu computador portátil, dos pequeninos, bem como um bloco notas, um livro e mais umas miudezas de pouco significado.
Passado minutos, poucos, senti mais que um movimento: senti, sem sombra de dúvidas, o trepidar dos dentes do fecho ao ser aberto. Dei meia volta como pude no meio daquela pequena multidão e apercebo-me de um cavalheiro, africano e de forte porte, bem encostado a mim, com um sobretudo no braço.
Levando a mão ao saco, constato que ambas as bolsas estavam abertas, coisa impossível de ter sido eu a fazer. Azar de quem o fez, que mesmo eu tenho dificuldade em retirar o conteúdo, de justa que está. Mas não gostei nem um nico.
Não podendo provar, mas tendo a certeza do autor da proeza, espetei nele o meu olhar. Com menos de meio metro entre narizes. Fugiu ele a olhar para mim, abanou um pouco e saiu na paragem seguinte. Dúvidas houvesse e perdê-las-ia por completo.
O meu acto seguinte foi dirigir-me à esquadra de polícia mais próxima, no caso na Praça do Comércio. Ali contei a aventura. Não em termos de apresentar queixa, que nada me faltava, mas porque o podia descrever e isso poderia ser útil a quem ali os anda a caçar. Quem sabe se seria um novo “profissional” na zona?
Relato feito, com descrição incluída, e chefe que me atendeu tratou de passar a palavra a quem disso se encarrega. E ficámos um nico à conversa.
Fiquei eu a saber que são meliantes difíceis de apanhar, já que só em flagrante ou com o produto do furto na sua posse, o que eles evitam a todo o custo. E fiquei a saber que, como em qualquer outra actividade, também os carteiristas dos eléctricos estão divididos por zonas. De um ponto para cima são de uma origem étnica, daí para cima são de outra. Consigo imaginar que, de alguma forma, mesmo entre carteiristas existam códigos de conduta e territórios definidos. Quem sabe se pagarão uma taxa para poderem exercer o seu mister.
Seja como for, esta foi a primeira vez que tal me sucedeu. Em Lisboa, que em Barcelona sou vítima regular, e até tenho o meu nome na polícia local, como queixoso.
E se aconteceu desta vez foi porque, por uma vez, não entrancei os cordões dos dois fechos da bolsa, como aqui se vê. Que desta forma são impossíveis de abrir por acaso. Aliás, mesmo que de propósito me vejo em trabalhos quando o quero fazer rapidamente.
Fica o alerta para os mais incautos.
E fica o aviso: esta história nada tem a ver com origens ou cores de pele. Apenas e só com honestidade! Que ela, e a sua falta, é transversal a todas.

Texto e imagem: by me

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