Foi mais ou menos
meio da semana passada. E ela foi tão recheada de peripécias tão inverosímeis,
que começa a ser difícil fazer uma cronologia exacta.
Em qualquer dos
casos, estava eu numa sala de espera enorme de um serviço de consultas externas
hospitalares. Esperava eu ser atendido e tratar da minha vida de doente e
paciente. Serviu para mitigarmos reciprocamente a impaciência o ter encontrado
uma amiga, que ali também esperava vez, já em tratamento continuado.
Quando o painel
brilhou o meu número avancei, confiante. Asneira!
Era a minha vez,
sim senhor, mas faltava-me um papel que deveria ter sido emitido por quem ali
me havia enviado.
“Mas repare!”dizia
eu. “Tem aí o exame radiológico, em formato de CD, onde constam todos os
elementos, desde a referência ao número do episódio clínico ao meu estado de saúde.
Se ligarem – telefone ou net – par o outro hospital, lhe darão as informações
de que carecem.”
A senhora
levantou-se, contrafeita, e foi lá dentro, falar não sei com quem. Regressou irredutível:
“Falta-lhe esse papel.
Nada feito. Tem que lá voltar.”
Eu sei que estas
pessoas, por muito simpáticas e afáveis que sejam – e aquela estava a sê-lo –
mais não fazem que cumprir ordens.
“Chame lá o seu
chefe que falo eu com ele.”
Veio uma chefa,
ainda mais simpática e sorridente que a subordinada (por isso é que é chefa)
mas tão ou mais determinada a cumprir determinações quiçá superiores.
Nada satisfeito
com a expectativa de ter que percorrer cerca de 20km em três transportes públicos
diferentes, para cada lado, só por causa de um papel e da “teimosia” daquelas
duas, não resisti e proferi:
“Vou dizer uma
palavra feia!”
Criei uma pausa
teatral, dando tempo a que quem me ouviu – e foram vários – que arremelgassem os
olhos e sustivessem a respiração, e disse bem alto:
“Penico!”
Se, naquele
momento, ali se tivessem aberto uns quinze a vinte balões, não teriam feito
mais barulho no seu expirar!
Insisti no absurdo
da situação, na estúpida perda de tempo e dinheiro nesse meu ir e voltar, mas
nada consegui. E acrescentei:
“Vou dizer outra
palavra feia! Autoclismo!”
Os sorrisos foram
mais francos e aliviados, mas inconsequentes no sentido que eu queria.
Antes de abalar,
paciente impaciente e inconformado, para onde me tinham mandado, estive vai-não-vai
para lhes atirar com o supra-sumo desta minha lista de impropérios, contendo
todos os “Rs” que a escatologia de salão permite:
“Retrete!”
Guardei-o!
A imbecilidade
Kafkaniana das regras dos Serviço Nacional de Saúde não merece que eu perca o
meu bom-humor.
Se outros motivos
não existissem, seria mais trabalho meu que deles, que é difícil tirar o sono a
quem apenas cumpre ordens e dedilha um teclado.
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