O regime político
da sociedade em que vivemos pauta-se por três poderes: legislativo, executivo e
judicial.
E, ainda que o poder
judicial não seja “democrático” na medida em que não é objecto de sufrágio
universal, certo é que os seus elementos são escolhidos ou seleccionados por
outros “mestres do mesmo ofício”, na sequência de provas dadas, o que lhes
confere um cariz de isenção política.
Por seu lado, os
poderes executivo e legislativo são objecto de eleição por parte de todos os
cidadãos, conferindo aos actos e decisões que tomam o carácter de representarem
as vontades dos eleitores.
A par com estes
poderes instituídos na sociedade existe um quarto, relativamente recente na
história: a comunicação social.
Supostamente este
poder de influenciar as opiniões dos seus ouvintes, leitores ou espectadores
funciona à margem das influências políticas, sendo, idealmente, imune às
pressões partidárias ou governamentais.
Mas a comunicação
social, seja qual for o suporte, não é gratuita na produção. Custa dinheiro,
muito dinheiro. E estes recursos surgem de três fontes possíveis: a venda do
produto directamente ao consumidor, da publicidade incluída e das subvenções
estatais, no caso de empresas públicas ou de serviços públicos.
Por cá, a empresa
pública de televisão, reparte as receitas pelas três fontes, equilibrando a
relação entre receitas e despesas entre as subvenções públicas e a publicidade.
As outras empresas de televisão, privadas que são, têm como objectivo a
obtenção de lucro, jogando em exclusivo com a capacidade de fazer negócio com a
publicidade.
Do ponto de vista
de independência na informação que produzem, e para além do eventual
cumprimento dos códigos deontológicos a que os profissionais estão obrigados,
só mesmo a televisão pública está realmente obrigada a isso. Depende em boa
parte do que o estado lhe paga ou, se preferirem, do que os cidadãos pagam
através dos seus impostos. As estações privadas, pese embora o tal código
deontológico, podem produzir os noticiários e demais formas de informação como
entenderem, já que apenas respondem perante os accionistas. Privados e com o
simples objectivo do lucro.
Mas sendo
igualmente certo que as subvenções Estatais para o serviço público de televisão
são limitadas, mesmo inferiores às despesas que tal serviço implica, as
receitas publicitárias são o que fazem a diferença nos orçamentos, permitindo
produzir conteúdos mais dispendiosos, apelativos aos publicitários, que
permitam garantir as despesas inerentes as esses produtos bem como cobrir as de
outros produtos, não tão apelativos mas desejados pelo público. Público esse
que é a razão de ser da existência da estação emissora.
A actual proposta
governamental de privatizar parte da estação pública de televisão e privar o
canal público de toda a publicidade irá reduzir até ao limite, ou para além
dele, a capacidade de produzir conteúdos televisivos que não apenas sejam do
agrado do grande público como possam suportar outros conteúdos que, não sendo
tão “generalistas”, representem a cultura nacional e gostos da população.
Só para dar um
exemplo, os eventos desportivos, de grande ou pequena monta, são dispendiosos.
E são pagos, em boa medida, pela publicidade que lhe está associada. Não
havendo esta, não será possível pagá-los, a menos que se reduzam os custos das
demais produções (culturais, infantis, documentais, informativas…).
Mas, mais ainda:
ao manter o orçamento da estação pública de televisão dependente em exclusivo
do poder governamental, e sendo este representativo apenas do partido
maioritário no parlamento, tornará os conteúdos a emitir muito mais dependentes
deste. E não das vontades da totalidade da população, como seria se dependesse também
das audiências e respectiva publicidade ou, como no caso de vários países, se
dependesse directamente do parlamento, onde está representada a esmagadora
maioria da vontade do país.
Por outro lado,
sabemos que as estações privadas, ainda que tenham como objectivo o negócio e o
lucro que ele pode proporcionar, não estão à margem de tendências políticas. Os
seus proprietários movem-se na esfera político-partidária a alto nível,
satisfazendo certas tendências e neutralizando outras. Por sistema e de uma
forma mais ou menos manifesta e aberta.
Não creio que quem
quer que se candidate à compra de um canal televisivo a privatizar seja
diferente dos existentes.
Em sucedendo essa
privatização teremos três canais (privados) que emitirão informação e que se
presume que sejam isentos de tendências político-partidárias, mas que não o
serão. E um canal (público) que dependerá em exclusivo, do partido mais votado
no parlamento. Em regra, em linha com os interesses das estações privadas.
Com a privatização
de uma canal da RTP e da exclusão da publicidade dos canais remanescentes,
ficará quase que por completo excluída da sociedade portuguesa a possibilidade
de haver informação televisiva independente dos poderes político-partidários.
A insistência e
irredutibilidade governamental na privatização de parte da RTP não se prendem
com questões orçamentais ou com memorandos internacionais.
O cerne da questão
é o poder, o quarto poder, e a possibilidade de o ajustar às necessidades
partidárias e interesses privados. Os interesses nacionais, no sentido de serem
os de todos os portugueses, estão bem arredados destas decisões.
Será de todo em
todo importante que se tenha bem consciência destas questões antes que a
situação se torne irreparável.
Texto e imagem: by
me
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