terça-feira, 11 de outubro de 2011

No Rossio




Não sei se compram ou se vendem.
Estão ali, em frente à estação do Rossio, ombro a ombro mas virados para lados opostos.
Com uns cartõezinhos na mão, quase que se parecem com as publicitárias que vendem perfumes, ou aqueloutros que nos põem na mão um cartão de um servidor de net/tv ou do mestre qualquer coisa africano que resolve o mau-olhado e as questões amorosas.
Mas as rugas, o traje bem convencional, o corte do cabelo e o brilho do dente de ouro (principalmente este) denunciam que nada disso se trata.
Mas em nada chamaria a atenção não fora que aqui se não vê: um pequeno cartaz pendurado no peito, preso com pequenas molas metálicas, que anuncia que oferecem dinheiro extra – 100 a 200 euros.
Passei uma vez, passei outra e fiquei à distância a ver o que acontecia. Não falavam com ninguém, apenas estavam ali na expectativa que alguém os abordasse, volta e meia falando um com o outro. Como que, estando ali, não o estivessem.
Abordei-os. Que, para além de satisfazer a minha curiosidade, sempre os faria aterrar em plena baixa lisboeta. E perguntei-lhes o que estavam a vender.
A quase total ausência de vocabulário português, ou de qualquer outro que eu dominasse, criou dificuldades acrescidas, até porque, e para além de me entregarem o cartãozinho, me disseram que telefonasse para os números ali escritos. À mão, que o resto estava impresso e com erros de português.
Insisti e disseram-me que só conseguiam falar em russo ou ucraniano. Foi então que lhes arranquei o primeiro sorriso – e criei a ponte de comunicação – quando lhes respondi que dessas línguas só sabia niet e vodka.
Lá explicaram, então e perante a minha insistência, que se tratava de uma empresa de produtos naturais e de saúde e que, se quisesse saber mais, haveria que telefonar ou procurar na net.
Corrigi-lhes a escrita errada (e abarbataram-se com o cartão corrigido, dando-me outro) e consegui fazer o retrato.
Ficaram lá, ombro direito com ombro direito, cartaz no peito e cartões na mão, tentando que alguém os abordasse. Sem sucesso, não fora eu.

Não fosse a estória, e poderiam ser dois turistas, dois executivos, dois médicos. São, com todo a certeza, dois seres humanos que, desenraizados, tentam timidamente sobreviver.

Texto e imagem: by me

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