Regressava a casa
com o pão p’ro almoço. Vantagens de ter quem fabrique pão mesmo na minha rua e com
várias fornadas ao dia.
Este, o dia,
estava particularmente bonito: um sol quentinho mas não demais, quase sem
aragem nem nuvens… bonito.
O melhor de tudo
era o som.
Numa árvore
pertinho da porta, um melro cantava ao desafio com um outro, já distante. Ora
agora cantas tu, ora agora canto eu, ora agora cantas tu mais eu. Uma delícia.
Deixei-me ficar,
com os olhos quase fechados, tentando perceber onde estaria o distante, que o
próximo estava mesmo ali, num galho pouco fechado, cantando com um descaramento
e à vontade pouco comuns.
Calhou ser na hora
do regresso da pimpolhada da escola do primeiro ciclo, logo ali ao fundo da
rua, em virando a esquina.
Uma da pequenotas,
que já me conhece daqui, veio até mim perguntando o que estava eu a fazer.
“Chhhhh! Não faças
barulho. Ora escuta. Este e mais o outro.”
E ficou-se.
Logo outras e
outros se juntaram, primeiro quase que ao desafio com os melros, depois em silêncio,
apreciando o que é bom de apreciar.
Claro que fome faz
das suas, a idade não perdoa, e os garotos zarparam, deixando-me ali, a ouvir o
que é bom de ouvir.
Não tinha como
fazer o registo. Sonoro, nem pensar. E visual, insuficiente, que a câmara de
bolso, sendo versátil, não dá p’ra tanto.
Subi e fui buscar
algo que se visse e servisse.
Claro está que,
aquando do meu regresso, restavam os galhos, que os melros foram cantar ao
desafio para não sei onde.
Ainda andei por
ali, de câmara pronta p’ro que desse e viesse, mas nada. Nada de melros, nada
de cantoria.
Fiquei-me p’los
galhos, que também são coisa bonita de se ver.
E a memória de uma
mão-cheia de pimpoolhada, parados ao sol de olhos fechados, a ouvir os melros
ao desafio.
By me
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