Passo
o dia profissional a tentar, usando de um montão de botões e funções,
transformar um conjunto de electrões em luz num ecrã que corresponda ao que se
encontra em frente de uma objectiva. Não trabalho com o equipamento de ponta mas
é bem mais avançado e com ajustes que não existiam há 35 anos, quando comecei.
A
grande dificuldade com que me debato é conseguir a fidelidade. Ou devido à
calibração dos aparelhos, ou devido ao gosto dos inúmeros observadores do meu
trabalho, mesmo ainda do grande público. E, por fim, porque o grande público
raramente tem os seus meios de observação calibrados ou iguais ao meu.
No
primeiro caso, é uma questão de jeitinho, truques, manhas, conhecer os desvios
e contar com eles.
No
terceiro caso, é tentar ir fazendo de forma a que o público não perca nessas
diferenças. Por isso mesmo gosto de ter junto a mim aparelhos que não estão
calibrados, de modo a que possa ter uma percepção do que é visto pelos demais.
E entre o estritamente correcto e o que é visto, encontrar um ponto de equilíbrio.
Já
o segundo caso é bem mais difícil. Que os tons de pele que cada um possui nem
sempre são os que mais lhes agradam e procuram que, entre o que faço e o que a
maquilhagem faz, façamos milagres. É uma luta permanente, fiquem sabendo.
No
entanto, saiba-se também que ainda não encontrei forma de captação e/ou exibição
de imagem que seja absolutamente fiel ao que os nossos olhos vêem.
Há
certas subtilezas de cor e de contrastes que, por muito afinados que estejam os
aparelhos de captação e/ou reprodução, falham sempre ou para um lado ou para o
outro.
Um
dos exemplos que conheço é a flor do jacarandá. Aquela cor algures entre o azul
e o violeta, por vezes raiando o ultra-violeta, contem radiações visíveis que
os diversos sistemas que conheço não registam.
Outra
subtileza notória é a pele humana. Mais verde, mais azul, mais vermelha,
algures entre duas ou mesmo entre as três… não creio que existam duas peles humanas
iguais. E não creio que existam sistemas de captação/reprodução capazes de
exibir toda a panóplia de cores humanas ao mesmo tempo. Podemos reproduzir boa
parte delas com rigor ao mesmo tempo, agora todas…
O
mesmo se passa com certos jogos de cor com que a natureza nos brinda em certos
pôr-do-sol. Certos contrastes de azul e rosa, principalmente se estivermos de
costas para o sol, são tão subtis que nem películas nem sistemas electrónicos
as registem ou reproduzam fielmente.
É
aqui que entra a mão humana. Ou a sensibilidade de quem apresenta a imagem. Dar
ênfase a uma das tonalidades, sempre em desfavor da outra, de acordo com o que
viu com o olhar e com a alma.
Sempre
com a certeza que os sistemas de reprodução falharão nos contrastes ou cores,
para um lado ou para o outro.
Isto,
goste-se ou não, é tanto mais verdade quanto os sistemas de transmissão de
imagens se querem mais rápidos e os algoritmos digitais tentam reduzir e
reproduzir as imagens. Em ecrãs, quantas vezes, descalibrados em termos de
contraste ou cor.
Razão
tinha o “velho” mestre Ansel Adams, ao fazer questão que todas as reproduções
das suas fotografias fossem por si sancionadas antes de divulgadas: impressões
fotográficas, revistas, livros.
Dir-me-ão
que o importante, bem mais que a fidelidade, será a satisfação do autor.
Verdade. Mas quando vemos um jogo de luz e/ou cor e o queremos mostrar a
terceiros, se não coincidir com isso, de que adianta fazer o registo?
By me
Sem comentários:
Enviar um comentário