Começou
nestas coisas aos 14 anos. Saía da escola e ia directamente para o laboratório,
onde a sua função era tomar conta do tambor de secagem.
Só
algum tempo depois foi autorizado a revelar as películas: 135, que abria com um
tira caricas, 120, que havia que separar o papel da película, 110 e 126, que
havia que partir a cassete de plástico.
De
tudo ali se revelava e sempre sem tanque. O filme era seguro com as mãos e
feito entrar e sair das tinas com os químicos. Um pouco primário, dirão alguns,
mas era o possível para tantos formatos trazidos pelos militares daquele e de
outros aquartelamentos que ali os levavam para que o furriel fotógrafo deles se
encarregasse. Por vezes dezenas de rolos no mesmo dia.
Os
tempos passaram e os portugueses saíram da Guiné. Mas o gosto pela fotografia
ficou-lhe. Quando pôde iniciou o negócio, fazendo reportagens, fotografias de
passe e o mais que lhe pedissem. Chegou mesmo a ter loja e um mini-lab.
Que
agora está parado. Abandonado. Talvez já inútil, que há anos que não trabalha.
O
seu dono, confrontado com os níveis de vida que lá se faziam e fazem sentir,
acabou por vir para Portugal, onde trabalha nas obras.
Nos
tempos livres vai fazendo alguns trabalhos de fotografia e vídeo entre a
comunidade guiniense.
Conheci-o
quando lhe dei uma boleia taxi, do meu bairro para Lisboa, num dia de greve dos
comboios. Falámos de fotografia, de greves e da vontade dele em adquirir melhor
equipamento e incrementar o que vai fazendo.
Da
segunda vez que nos vimos, foi ele que veio meter conversa. Mostrou-me algumas fotografias
de crianças e idosos conterrâneos que tinha impresso para fazer a capa de um
DVD. E trocámos opiniões de como expor correctamente para peles negras,
considerando que as câmaras estão preparadas para peles brancas.
Bem
como mais um ou dois truques do ofício, de parte a parte.
À
conversa juntou-se-nos um seu patrício. Suponho que vindo recentemente do seu
país, que o seu português era bem deficiente. Mas deu para nos entendermos.
A
ponto de me perguntar se também era fotógrafo. E se tinha estado na Guiné. Esta
outra formulada meio a medo.
Quando
lhe respondi que não, que apesar da alvura das barbas e cabelo, não tinha idade
para lá ter estado, o seu sorriso abriu-se par em par e a conversa seguiu,
bonita e cúmplice.
Separámo-nos
à saída da estação: eles para o seu destino, cá no bairro, eu para o meu
autocarro, também local.
E
não adianta virem-me com tretas sobre a necessidade imperiosa dos automóveis.
Nunca teria tido esta cumplicidade com estes confrades se usasse um sobretudo
de lata, no lugar de deixar que as agulhas da vida me façam cruzar com tanta e
tão boa gente!
By me
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