sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Tremi





No autocarro, de pé, aquela mulher a rondar os 25 anos arregaça a manga esquerda e mostra o antebraço ao homem, mais ou menos da mesma idade, a seu lado.
O gesto, em dia frio, abanou-me. Mas mais que por ser dia frio.
Àquela distância pouco mais consegui perceber que eram bonitas, as poucas letras tatuadas naquela pele branca. Em tons de azul, uma maiúscula e talvez umas cinco minúsculas. A última ficaria a menos de uma mão-travessa do pulso.
E enquanto conversavam com o antebraço tatuado exibido, eu tremia. E não era do frio.
Que aquele gesto, voluntário, quase coquete e encimado por um sorriso, me recordou um outro, igual em muito, até no frio.
Repetido por milhões, sem pretensões artísticas e muito menos de orgulho, foram o último grito da tecnologia de há setenta anos no tocante a organização, sistematização e controlo de pessoas.

Na imagem conjuntos de agulhas usados para tatuar os números de série, à entrada de prisioneiros no campo de concentração de Auschwitz.

Naquele autocarro comprido, naquela primeira manhã do ano, com o sol a entrar pela janela, tremi. E não foi de frio!

By me

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