É espantoso a
quantidade de coisas de que nos lembramos ao olhar para um trabalho nosso feito
há muito tempo.
Esta fotografia
foi feita no início dos anos oitenta, quando eu tinha que lutar com a mobília
da casa familiar para conseguir ter espaço para fotografar. Ainda tenho esse
tipo de lutas, agora com a minha própria mobília.
Lembro-me de ter
usado uma Linhoff Kardan Color 4x5, com uma Xenar 150mm f/4,5, com diapositivo
Agfachrome balanceado para luz artificial. Tinha comprado a câmara para fazer
trabalho de publicidade e, se bem me recordo, deixei de o fazer devido a
divergências de questões estéticas com alguns directores de publicidade. Agora
acho que eles tinham alguma razão, mas eu era puto, então.
Lembro-me de esta
fotografia ter sido feita por desafio. A ideia, entre nós naquele grupo de
jovens entusiastas da fotografia, era publicitar qualquer coisa, mais pelo seu
uso que pela marca.
Também me recordo
de a garrafa não ter fundo. Retirei-o recorrendo a óleo e um ferro em brasa,
uma técnica que nunca tinha usado anteriormente. Tinha mais duas garrafas de
reserva. Para a fotografia, ela estava segura fora do enquadramento enquanto se
deitava o líquido pelo fundo para que escorresse pela boca na direcção e
quantidades requeridas. Usei água, claro, que não iria desperdiçar vodka numa
coisa destas.
Lembro de não ter
usado verdadeiros cubos de gelo. Eles derreteriam no processo, devido ao calor
existente provindos das fontes de luz. Usei, em sua substituição, cubos feitos
por mim, numa mistura de gelatina culinária incolor e água e moldados no
congelador.
Lembro de não ter
dinheiro para um fotómetro pontual Gossen, que haveria de medir a luz no
próprio nível da película numa câmara de grande formato como esta. Tive, assim,
que usar o meu fotómetro externo e para luz incidente Seconic e o meu spotmeter
1º Pentax. Ainda os tenho e continuam a ser muito fieis.
Lembro-me de ter
feito apenas uma fotografia, estando absolutamente certo dos resultados, ao
contrário do que se faz hoje, com câmaras digitais.
Lembro-me de
sonhar ter umas “costas Polaroid”, que me permitiriam fazer imagens de teste
antes da imagem final, mas não ter acesso a isso, já que não havia disso à
venda por cá e eram particularmente caras. A única vez que as usei foi-me
emprestado por um compincha que trabalhava numa escola de fotografia.
Aquilo de que não
me recordo, de todo, é onde está guardado o original desta imagem, um
diapositivo 9 por 12 centímetros. Já procurei, procurei, procurei, e o único
que encontro é esta cópia impressa. Re-enquadrada como o pedi então, já que as
proporções que aqui se vêem não correspondem ao formato original.
No entanto,
recordo como se fosse ontem, a satisfação de a fazer. Tal como a satisfação de
a olhar na semana seguinte, ao vir do laboratório.
A memória pode
pregar-nos estas partidas. Mas certo é que, bem mais importante que ter é
fazer.
By me
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