Esta frase ouvi-a eu,
meio distraído, no comboio a caminho de casa. A minha mente ia mais virada para
o que tinha lido de manhã, no comboio em sentido inverso e a tomar balanço para
retomar a leitura poucos minutos depois.
Mas o tom com que
foi dito fez-me regressar de onde estava e prestar atenção ao que me cercava.
A dona da voz
peremptória não tinha mais que uns doze anos, tal como as suas interlocutoras.
Não fixei o assunto, que talvez não fosse importante, mas tão só a importância
daquela afirmação. E a minha satisfação por a ter ouvido, vindo de quem veio.
Para aquelas
mocinhas, com aquelas idades, ler algo num livro é a atribuir ao que leram a
carga do sacro-santo e nega-lo é pecado capital. E, tão ou mais importante, o referente
naquela conversa foi um livro e não uma pagina de web ou um programa de TV.
Pelo aspecto e pela idade, as tecnologias de informação não lhes serão
estranhas, mas o peso da importância de um livro, aparentemente, sobrepõe-se à
sabedoria virtual do ecrã fosfórico.
E isto é tanto
mais satisfatório para mim quanto a leitura é um dos meus vícios e prazeres,
ainda que, para minha tristeza, não lhe possa dar o tempo e atenção que
gostaria. Mas sempre o vou fazendo, em pausas acompanhadas de cafeína e nicotina
(cada vez mais difícil esta conjugação) ou embalado pelo trepidar das férreas
rodas do quotidiano trajecto de e para a labuta.
No meu saco tenho
sempre um ou dois livros, entremeados com o caderno de escrita, o tabaco de
reserva, a câmara fotográfica, papeis em tempos úteis e agora não tanto e
tantas outras ninharias.
Mas, apesar do
peso, quando calha passar por uma livraria sempre entro e dou uma olhada. Rara
é a vez que não acabo por aumentar a pilha dos que tenho por ler aqui por casa.
Das pilhas, em boa verdade.
Pois um destes
dias, em passado por uma das boas livrarias da cidade, não resisti e entrei,
dirigindo-me de imediato à secção da fotografia. Tinha este espaço um dos
maiores e mais completos catálogos na matéria. E digo “tinha” porque, gradualmente
e por força da concorrência feroz das grandes superfícies e das grandes cadeias
da especialidade livreira, tem vindo a decair o número de títulos que ali
podemos encontrar. Mas, ainda assim, vim de lá com um novo.
Confesso que não
gosto de falar de um livro sem o ter acabado. Nem sempre o início tem um tão
bom fim, ou as promessas da introdução acabam por se tornar sensaboronas e
insípidas. Não é o caso deste.
Escrito por
Laurent Gervereau em 1996, o “Ver, compreender, analisar as imagens”, publicado
nas Edições 70, Lisboa, acaba por ser um livro bem apaixonante sobre o tema,
pese embora a frequentes citações e referencias a outros autores. Em qualquer
dos casos, é dos mais fáceis de ler que encontrei sobre o tema sempre complexo
que é a semiótica e a análise de imagens.
Sendo que tenho
cerca de um terço do livro lido, e porque vem a propósito no contexto de uma
discussão sobre fotografia, cito uma pequena passagem, logo na página 20:
Erwin Panofsky […]
insiste na especialidade da obra de arte: “Qualquer objecto pode ser visto
esteticamente, e a maioria das obras de arte pode, segundo determinado ponto de
vista, ser vista como objectos práticos. Mas aquilo que distingue a obra de
arte de qualquer outro objecto é o facto de ela ter a “intenção” de ser
considerada esteticamente.”
Faz muito tempo
que procurava uma definição de arte. Tentei eu mesmo criar uma, na falta de
encontrar algo que me satisfizesse e aos meus conceitos. Falhei, claro, que “a
arte e o engenho” para tal não chegaram. E eis que encontro algo de muito
plausível e simples.
Talvez que
contradiga o que alguns autores de renome afirmam muito sabiamente. Mas…
É verdade, é! Li
num livro que sim!
By me
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