quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

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Merda! É a única palavra que me vem à cabeça. Merda!



Pediu-me para uma sopa e fomos por ela. E disse-lhe que pedisse o que quisesse, já que não sabia se naquele snack de estação e àquela hora ainda haveria sopa. Já não e olhou-me, perguntado, se poderia ser um salgado e um sumo.

Disse-me depois, já no cais e enquanto esperávamos pelo comboio, que queria mesmo era uns trocos para poder pagar o quarto. Há três noites que estava a dormir num vão e não sabia se ainda lá estaria a roupa.

O que lhe faltava era menos ainda que o que eu havia recebido de troco, ao balcão. Dei-lho.

Olhou para mim, bem nos olhos pela primeira vez, e disse-me:

“Sabes? Isto hoje não é para mais nada. É mesmo só para o quarto. Estou tão cansada!”

“Não te perguntei nada, pois não? E ainda não me deste motivos para que não acreditasse em ti, pois não?”

Sorriu ainda mais.

E ficámos mais um nico à conversa, sobre a sua família lá na terra, os seus filhos e as idades, as reacções do pai e da mãe quando lá vai…

A dado passo, e antes de subirmos para a composição, mete a mão no bolso do casaco coçado e diz-me:

“Olha! Já vi que fumas. Não queres ficar com este maço? Está quase cheio. Deram-mo hoje.”

Mostrei-lhe os meus e disse-lhe que preferia fazê-los eu, obrigado.



Merda! Não me recordo de me terem oferecido algo de tão valioso. Merda!



Quando, uns vinte minutos depois, se levantou do seu banco para sair na estação dela, debruçou-se e deu-me dois chochos, dizendo baixinho:

“Vemo-nos por aí.”

Dei-lhe uma palmadinha no ombro e só me ocorreu dizer-lhe de resposta, também baixinho:

“Porta-te bem!”

Ficou no ar o seu sorriso, triste, e o seu odor.

Talvez que por isso ninguém tivesse ocupado o seu lugar no banco, não sei.

E talvez que nos vejamos por aí.


By me

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