Podia
ter fotografado a capa. Ou uma imagem do interior, das muitas e fortes que tem.
Preferi
ir à net, onde qualquer um pode ir, e escolher uma das que lá estão. É só
procurar.
Trata-se
de uma fotografia do trabalho “Extérieur nuit”, de Jane Evelyn Atwood.
Não
conhecia eu nem a autora nem o trabalho, admito. Aquilo que não conheço
encheria uma enorme biblioteca e vou fazendo por a encher, mas devagarinho.
Desta
feita foi com alguns que vieram comigo da Feira do Livro da Fotografia, que terminou
ontem. E, dos muitos que lá estavam e que gulosamente fui vendo, tive que fazer
escolhas. Uma delas não poderia deixar de ser este. Não poderia mesmo deixar de
ser.
Esta
senhora teve a coragem de fazer aquilo que não sou capaz: fotografar cegos.
E
se tenho alguns escrúpulos em fotografar desconhecidos (já por aqui o atestei e
expliquei) mais ainda tenho em fotografar cegos. Em fazer algo a alguém que,
sabendo-o ou não, consentindo-o ou não, nunca poderá usufruir do que lhe faço:
um retrato.
Sei
que existem métodos de passar fotografias para três dimensões, como se de
Braille se tratasse. Já visitei uma exposição onde obras dessas estavam à
disposição. E fi-lo de olhos vendados, tentando “ver” com a ponta dos dedos. Um
fiasco, naturalmente.
Mas
a esmagadora maioria de quem não vê não poderá ter acesso a esta forma de
reprodução. Até porque pouco mais que experimental.
Donde:
fazer algo a alguém, mesmo que o saiba e consinta, e que nunca poderá consumir
ou sequer saber de que se trata… é algo que me arrepia e que me tolhe os
movimentos e a alma.
As
fotografias são poderosas. Pelas expressões, pelas poses, pelos gestos e
movimentos, por aquilo que está a acontecer.
Mas
muito mais que isso, são poderosas porque o que acontece, no acto de
fotografar, é algo que lhes escapa.
Este
livro ou obra serve-me para me mostrar até que ponto as minhas próprias limitações
vão. Cada uma daquelas imagens enche-me a alma, mas eu seria incapaz, suponho,
de as fazer.
Procurem-nas
e vejam-nas. Devagar, como se no lugar dos vossos olhos, fossem os vossos dedos
que vissem todos os cambiantes de claro/escuro que ali estão. Tentando imaginar
tudo o que antecedeu e sucedeu ao clic da câmara. O que são ou foram as vivências
dos retratados. O que foi cada acto fotográfico.
E,
no final, não pensem em “coitados deles”. Pensem antes em “coitados de nós”,
que nos queixamos de barriga cheia e usamos a luz e a câmara para dar vazão ao
que sentimos.
Boas
fotos!
Texto: by me
Imagem: by Jane Evelyn Atwood
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