Uma
ocasião pediram-me para usarem esta fotografia numa revista electrónica.
Claro
que me senti lisonjeado e acedi, com a ressalva que ela tinha sido feita em
torno do soneto “Liberdade querida e suspirada”, de Bocage, e que deveria ser
publicada junto com ele. Acederam.
Qual
não foi o meu espanto quando vejo, tempos depois, o referido soneto escrito
sobre o lado esquerdo da fotografia. Letras brancas sobre o fundo escuro.
Não
gostei. Nem um nico. Que, ao fazê-lo, todo o jogo claro/escuro que eu tinha
criado se perdia com a mancha branca das letras. Não gostei!
Disse-o
a quem o havia feito, tive que insistir e ser veemente e, vantagem dos
processos digitais e on-line, foi alterado: o soneto escrito ao lado da
fotografia, ambos impolutos e originais.
Não
aceito que um editor de uma publicação subverta assim o trabalho criativo de um
fotógrafo, seja o trabalho bom ou mau.
Sendo
dado como pronto pelo autor, qualquer alteração sobre ele é criar nova obra, já
não passível de respeitar a ideia original. Não aceito!
De
igual modo não aceito que fotografias sejam impressas a duas páginas. Numa
revista talvez escape, tal como num jornal. Mas não, de forma alguma, num
livro.
A
união das folhas, e porque a lombada e espessura do livro assim o obriga,
impede o ver-se continuadamente todos os elementos (objectos, formas, cores,
luzes, movimentos) que constam na imagem, desvirtuando-a e criando outras
formas de leitura.
Uma
fotografia impressa a duas páginas não é a fotografia original mas antes uma
outra, com outro “ritmo”, gestão de interesses, sentidos de leitura,
fraccionando-a mesmo.
E
se o fotógrafo que a criou quis colocar algo em determinado ponto do espaço,
desvalorizando todos os outros, não faz sentido, melhor, é um aviltar o
trabalho original o impedir essa leitura ou importância.
Não
gosto, não quero, não consumo!
Vem
tudo isto a propósito de ter estado na “Feira do Livro da Fotografia”, em Lisboa.
E que ainda decorre hoje, Domingo.
Nesta
feira, entre outros aspectos, dá-se ênfase aos trabalhos de autor, às publicações
que, mesmo com tiragens reduzidas, representam as abordagens de fotógrafos
contemporâneos que usam este meio para divulgar os seus trabalhos. A sua forma
de ver e sentir o mundo. Só posso aplaudir.
Acontece
que alguns destes trabalhos exibem imagens a duas páginas. Impedindo o acesso
integral à fotografia original.
Comentei
isso com uma das pessoas que estava numa das bancas e a resposta
surpreendeu-me. Ou não.
Perante
o meu “Porque é que insistem em publicar fotografias a duas páginas?”, ouvi:
“Ah…
e tal… é para dar ritmo ao livro… um livro não é apenas as fotografias
exibidas, também tem personalidade própria…”
Ora
batatas!
Então
quando escolhemos um livro estamos a querer ver as fotografias de um
determinado fotógrafo ou estamos a querer ver o trabalho de um determinado
editor ou paginador?
Não
questiono o trabalho destes. Ao fim e ao cabo, o tamanho das páginas, a ordem
pela qual as fotografias são exibidas, se na página esquerda se na direita, se
ao alto ou ao baixo, se todas com a mesma orientação ou salteadas… tudo isto
faz parte do trabalho criativo de quem concebe e pagina um livro.
Agora,
por favor:
Não
queiram, com o pretexto da criatividade do paginador ou editor, subverter,
adulterar, estragar, o trabalho de quem fotografou e que, no fundo, é a razão
de ser do livro em si.
Vim
da Feira da Livro da Fotografia com cinco livros. Que me deixaram com a
carteira mais leve mas com a alma bem mais alegre. Trabalho de autor,
compilações, texto, localização geográfica, históricos.
Mas
nenhum com fotografias a duas páginas.
A
liberdade criativa de um termina quando começa a liberdade criativa do outro!
By me
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