sábado, 1 de novembro de 2014

Dualidades - Cogitando sobre pedagogia



Ao longo dos anos tenho estado envolvido em diversas acções de ensino/aprendizagem.
Todas elas envolveram aquilo que sei fazer (melhor ou pior) e revestiram-se de características bem diversas.
Desde o trabalhar com jovens nos chamados “tempos livres”, à formação profissional em ambiente de trabalho; da formação em ambiente formal de escola, aos apontamentos soltos sobre este ou aquele assunto; do trabalhar com adolescentes a grupos de adultos.
Nunca houve duas situações iguais, mesmo que em anos consecutivos na mesma instituição. Não há dois grupos de gente a querer aprender iguais!
Nem nas motivações, nem na facilidade, nem na interacção alunos (formandos, aprendizes) com os professores (formadores, auxiliares de aprendizagem), nem nas relações entre discentes, nem nas relações entre docentes…
A minha sorte tem sido, no meio de tantas variáveis saudáveis, o ter tido “pulso livre” nos conteúdos, precedências, organização e métodos. Mesmo quando os objectivos são semelhantes (“saber fazer” e “saber justificar”, teóricos e práticos), esta liberdade de acção tem-me permitido ajustar métodos e abordagens em função do grupo de trabalho, tentando tirar partido das diversas dinâmicas presentes, tanto do grupo como de cada indivíduo.
Tudo se torna muito mais fácil quando se trabalha com um grupo homogéneo. Homogéneo nos saberes e práticas anteriores, homogéneo nas motivações, homogéneo nas relações dentro do grupo, homogéneo na vontade de aprender, homogéneo na facilidade em aprender.
Quando algum destes factores diverge a coisa complica-se. E complica exponencialmente na medida em que aumenta o número de factores de divergência. E o factor mais complicado com que se pode lidar é a vontade de aprender. Melhor, a falta de vontade de aprender.
Em regra, esta manifesta-se entre os jovens.
É, naturalmente, muito mais divertido viver a vida lá fora que dentro de uma sala de aula, mesmo que esta seja um estúdio onde estão a praticar novos saberes. Esta situação resolve-se, as mais das vezes, com estratégias de estimular o interesse, quer seja pela descoberta de coisas novas, quer seja pelo alimentar o ego, quer seja pelo ajuste dos conteúdos às necessidades e curiosidades de quem aprende. Com diplomacia, boa-vontade e tratar cada um por si mesmo e não como mais um. Que se há coisa que todo o jovem, pré ou pós os vinte anos, gosta é de marcar o seu lugar ao sol.
Com não jovens, a falta de vontade em aprender é bem mais complicada. Desde logo nos motivos.
Muitos dos que frequentam locais de aprendizagem fazem-no não porque queiram realmente aprender e obter novas competências mas tão só porque o obter o respectivo certificado lhes permite melhorar a vida. É legítimo mas complicado de resolver, já que boa parte do trabalho de quem ajuda a aprender passa por criar a motivação para que tal aconteça.
Depois porque alguns dos que frequentam os locais de aprendizagem fazem-no porque o seu principal objectivo, mesmo que não assumido pelo próprio, é o convívio. A aprendizagem e tudo o que em torno dela acontece é um meio para que tal aconteça. Uma vez mais, contornar esta não vontade de aprender passa por criar motivação em tal. Quase metade do trabalho passa por tal.
Some-se-lhe que a vontade ou disposição de aprender acontece na proporção inversa da idade. Não é regra, nem pouco mais ou menos, mas é comum. Isto porque aprender implica treino. Treino no aceitar novas ideias e práticas, treino na capacidade de concentração, treino na capacidade de retenção ou entendimento. Na medida em que o tempo de vida vai passando, cada um vai criando zonas de conforto. Físico e intelectual. Aquilo que venha perturbar esse conforto provoca, naturalmente, desconforto. Que impede ou limita a aprendizagem e a vontade em a ter. Mesmo que de tal não se tenha a percepção.
É papel de quem ajuda a aprender o contornar estas limitações ou condicionantes. E com estratégias várias. Para além do estímulo individual, a diplomacia em não ferir susceptibilidades tem que ser muito maior que quando se trabalha com adolescentes. Tal como a graduação das complexidades dos novos saberes e competências tem que ser mais gradual e adaptada, tanto quanto possível, às necessidades e capacidades de cada um. Mais cuidado ainda que com adolescentes.
Obviamente que se um grupo de trabalho de não adolescentes é composto de gente com hábitos de aprendizagem, com mentes abertas para as novidade e a diferença e com tolerância interpessoal e intergeracional elevada, então é um prazer talvez que maior que com adolescentes. Que a experiência de cada um e os seus respectivos contributos valorizam em muito todo o trabalho do grupo.

Em todas as situações em que estive envolvido como ajudante de aprendizagem tive sempre a mesma dúvida. Para a qual espero nunca encontrar resposta.

Nunca sei quem mais aprende: se o grupo com quem estou a trabalhar se eu mesmo.

By me

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