quarta-feira, 12 de novembro de 2014

As janelas



Em tempos não muito recuados era habitual ver a roupa a secar e corar à janela nas segundas ou terças feiras.
E é fácil explicar o porquê.
Cuidar da roupa era – e ainda é maioritariamente – uma tarefa feminina. Da roupa, da cozinha, dos filhos. Era esse o mundo da mulher, ficando a cargo do homem o garantir o sustento da família.
Neste contexto, o domingo era o dia da família e da igreja. Vestiam-se as melhores roupas para a missa, passeios e convívio social, ficando as tarefas domésticas reduzidas ao mínimo. O lavar da roupa era trabalho para segunda ou terça feira. Tal como o secar, ao sol, nas janelas e saguões.
Os tempos mudaram e a mulher passou a trabalhar, tal como homem, fora de casa. Nas fábricas, nos serviços, no comércio. Mas mantendo a seu cargo a maioria da manutenção da casa. Roupa incluída.
O seu lavar passou para o domingo ou, mais modernamente e com o recurso às máquinas, para os fins de dia. E o secar da roupa lavada à janela passou a ser comum em qualquer dia da semana.
Os tempos mudaram e os conceitos estéticos, urbanos e arquitectónicos mudaram também. Passou a ser considerado de mau gosto o exibir a roupa nas janelas. Com o argumento, de alguns, que descontextualiza o desenho do edifício estragando a paisagem.
Mas ficou, nos bairros mais antigos ou populares, o hábito dos estendais. Com o colorido que tal equipamento transmite. Com a vida que se sente em tais janelas ou varandas, individualizando cada uma.
Mas, infelizmente, voltou também o hábito de cuidar da roupa num dia que não o domingo. A escassez de trabalho tem levado a que um dos elementos do casal esteja em casa toda a semana, reservando de novo o domingo para a eventual reunião familiar.
Passear num bairro misto no que a rendimentos concerne permite-nos definir quais os deste ou daquele prédio têm os seus moradores. Pelo dia da semana em que a roupa está estendida, por haver ou não estendais, e pela oportunidade com que os dias de sol em época de Inverno são aproveitados por quem cuida da casa.

Admito que tenho pouca estima pelos edifícios uniformes e assépticos, com fachadas iguais de alto abaixo, em que mesmo um vasinho de flores é admitido.

Vive-se, hoje, em tubos de ensaio esterilizados, mecanizados, electrificados, informatizados, automatizados. Deshumanizados!

By me

Sem comentários: