sábado, 3 de janeiro de 2015

O pintor de



“…
Fora com ele, simplesmente. De imediato. Quero acompanhar-te, disse. Preciso de um Virgílio silencioso e tu és bom nisso. Quero um guia de aspecto agradável, calado e duro como nos filmes de safaris dos anos cinquenta. Foram as palavras de Olvido num entardecer de Inverno diante de uma mina abandonada de Portmán, perto de Cartagena, junto do Mediterrâneo. Usava um gorro de lã, tinha o nariz vermelho de frio e os dedos espreitavam pelas mangas demasiado compridas de uma camisola vermelha e grossa. Disse-o muito séria, olhando-o nos olhos, e depois veio o sorriso. Stou farta de fazer o que faço, de modo que me colo a ti. Está decidido. Oh, morte, zarpemos. Et cetera. As minhas próprias fotografias desagradam-me. É mentira a fotografia ser a única das artes onde a formação não é decisiva. Agora são todas assim. Qualquer amador com uma Polaroid se equipara a Man Ray ou Brassai, percebes? Mas também a Picasso ou Frank Lloyd Wright. Sobre as palavras arte e artista pesam éculos de fraudes acumuladas. O que fazes não sei muito bem o que é, mas atrai-me. Vejo-te a toda a hora a tirar fotografias mentais, concentrado, como se praticasses uma estranha disciplina bushido, com uma máquina fotográfica em lugar de um sabre samurai. Desconfio que a única arte actual viva e possível é a das tuas caçadas impiedosas. E não te rias, tonto. Estou a falar a sério. Comecei a compreendê-lo ontem…”

Se gostaram do que leram, sugiro todo o livro:
“O pintor de batalhas”, de Arturo Pérez-Reverte.
Pese embora o romance fale de homens e mulheres, do relacionamento entre seres humanos e seus sentimentos, a personagem principal é a fotografia, na sua prática e consequências. E, de caminho, questões éticas também.
Se este exemplar que aqui se vê é o que estou a ler e que me foi emprestado, a breve trecho tratarei de comprar um para que conste junto com os demais na minha própria biblioteca. Gosto sempre de ter ao alcance da mão os livros de que gosto.

Recomenda-se!

By me

Sem comentários: