Conheço-o há tanto
tempo quanto o que tenho de morador nesta rua. E nunca o vi que não com esta
barba, nem crescida nem desfeita, de um branco que está em sintonia com as
rugas e o que estiver escrito no documento de identificação.
Tem por ofício,
pelo menos visível, o ser “reciclador”, fazendo o seu périplo diário pelas ruas
e contentores. O que recicla? Pão!
Vai revirando,
sempre mantendo a higiene circundante, os contentores, em busca dos restos de pão
que os moradores jogam com desprezo no lixo.
Com um gancho
artesanal, vai vendo o que lá está, colocando o que encontra num carrinho de “compras”
em rede que, nos dias bons, vai cheio até a cima.
O destino que lhe
dá é, certamente, galinhas ou pombos, que nunca o vi ser exigente com a forma
como o pão está no contentor.
Tão tímido com
quem por ele passa, só de há uns tempos a esta parte me foi saudando em nos
cruzando, sem nunca ir mais longe que isso. Excepto hoje.
Os recicladores são
especialistas no que recolhem. Eu também, ainda que traga a imagem e não o
objecto. E preparava-me eu para recolher um par de sapatos quando se chegou,
com um companheiro. Saudações, sorrisos e perguntaram-me se estava ali para
lhes fazer o retrato. Fiz.
E falámos um pouco
de como os moradores deixam tudo por fora, nem sempre quando os caixotes estão
cheios. E de como isso estraga a paisagem e tem pouco de higiene.
Conversa vai,
conversa vem, e chega um quarto reciclador. Desta feita pago pelo município,
foi tratando de colocar dentro o que os outros põem fora, fazendo, à sua
maneira, uma selecção do que fica no genérico e do que irá para os contentores
especializados.
Suficientemente
simpático para deixar para o fim aquilo que ali me havia feito parar: sapatos.
Que fez questão de deixar de fora, junto com outras peças de vestuário que por
ali estavam. E, ainda que lhe tenha atirado o “isco”, recusou o retrato.
Afastámo-nos os
quatro, em dando por fim o trabalho no local: um com o carrinho de pão, o outro
com a sua mochila de conteúdo indefinido, outro com o carrinho verde de rodas
grandes e respectivas vassouras, o último com a câmara e flash no lombo.
Próxima paragem?
Contentores para uns, lixo a monte para outro, sapatos e botas para o quarto.
By me
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