sábado, 30 de junho de 2012

Para além do mato e do morro




Em minha casa fuma-se. Bastante.
Implica isso que, por sistema, haja pelo menos uma janela aberta, quando não mais, por via do arejamento. Só mesmo quando está um frio de rachar ou uma tempestade de fazer encolher de medo o Adamastor é que ficam todas fechadas.
Não tem sido esse o caso.
Pois em tendo uma ou mais janelas abertas, por elas entram todo o tipo de ruídos: se o vento estiver de feição, a petizada na escola; dois quarteirões abaixo, a flauta do amolador quando passa; o chilrear da passarada se estiver ela voltada para isso; grilos e cigarras no tempo deles; p’lo meio-dia, e também se o vento ajudar, a sirene dos bombeiros; se o Inverno tiver sido molhado, umas rãzitas nuns charcos lá mais longe, no sossego da noite…
Claro que também oiço o que não quero e não gosto: buzinas de automóveis, que dá muito trabalho sair do carro para tocar a campainha; tarde na noite os camiões do lixo; motores postos a acelerar para carregar baterias; carros ou motos de escape livre, como se isso melhorasse alguma coisa o rendimento; festarolas, até altas horas que, se fossem no meu prédio já teriam tido direito a presença policial; discussões familiares…
Mas há um som, que só de quando em vez oiço e de que não gosto nem um nico. São só alguns dias por ano, o vento tem que estar de feição e não pode haver muitos outros barulhos por perto. Mas, vindo bem detrás deste eucaliptal, bem detrás dele, e ele também não fica pertinho de minha casa, oiço o treino militar com armas de fogo de uma carreira de tiro que por aqui há.
Caramba! Andamos todos a tentar que isto não chegue a vias de facto, anda o país em crise a poupar nos cêntimos que pode e que não pode, e andam os militares a desperdiçar munições, preparando-se para matar o seu semelhante!
Mesmo que as coisas não andassem beras, eu contestaria, que mantermos um exército afinado e pronto a entrar em acção, matando seres humanos, é coisa que contesto do fundo da minha alma. Agora em tempos de crise…
Acabem lá com isso que eu não quero sair da cama, logo de manhãzinha, e ouvir o som da morte entrando-me p’la casa dentro.

By me

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