Há sete anos
publicava eu isto.
Sinto-me
envergonhado por não ter tido coragem de o fazer mais vezes, de então para cá!
Não! Hoje disse
NÃO!
Não vou falar do
padre que prefere que se matem crianças de cinco anos a que se pratiquem
abortos!
Não vou falar dos
políticos suspeitos de tráficos de influências e de destruição do património
natural e que – suspeitamos – ficarão na mesma!
Não vou falar
daqueles que se humilham e sacrificam em prol de uma fé que, e com isso,
enriquecem estados e pessoas!
Não vou falar de
fanáticos que se explodem em favor de uma causa que não entendem bem, apenas
para matar mais uns quantos inocentes!
Não!
Hoje não vou falar
disso, nem com a boca nem com a objectiva! Voluntária e conscientemente, não
farei com que isso seja o tema de conversa ao jantar, enquanto a pantalha
inunda os lares com essas e outras informações sangrentas e inconsequentes!
Não!
Apeteceu-me não,
disse não e fiz não! E fiquei um dia mais novo!
Saí de casa com
esta vontade e, a quinhentos metros do trabalho decidi não. Telefonei para lá e
usei de algumas prerrogativas que a senioridade e o respeito profissional
conferem: baldei-me!
Mesmo à porta do
trabalho decidi: Hoje não quero trabalhar!
E segui em frente.
Quase sempre em frente. Para onde o nariz apontava. Um pé à frente do outro,
sem pressas nem vagares. Andando apenas.
Com aquela
tranquilidade que diz: Hoje o tempo é meu! Não mo deram nem cederam:
conquistei-o. Não tenho nada para fazer porque quero e isso torna-me
imensamente mais rico e de bem comigo e com o mundo!
As casas, as
fábricas, as ruas, as relvas, os passeios, os números das portas sucederam-se
como se a marcha se tivesse invertido: eu parado e tudo o resto em movimento. O
chão por baixo, o céu por cima, sem peias nem norte.
Atravessei o
santuário do consumismo como cão por vinha vindimada.
Por um qualquer
motivo interior, as pessoas pareceram-me mais. Mais alegres e mais
acabrunhadas. Quem sorria, sorria com mais prazer, quem rilhava os dentes,
fazia-o mais alto.
Estou mais novo um
dia porque o quero. Porque abri os olhos e vi quem e o que me rodeia. Não
porque tivesse tempo livre mas porque libertei o tempo. Os ponteiros saltaram,
os mostradores ficaram em branco e os números alinharam-se pelo rumo do meu
nariz…
Parei antes de me
afundar. O rio foi a minha fronteira, que os sapatos não gostam de água.
Entre a esquerda e
a direita, ganhou o coração. E a relva chamou-me. Verde mas seca, tornou-se o
colchão da minha liberdade, o fiel depositário dos meus ossos enquanto a mente
vagava bem lá por cima.
As nuvens
agregavam-se e separavam-se no azul, ao sabor de ventos e temperaturas.
Formavam padrões
abstractos (ou sou eu que não os sei ler?). Lamentei não ter trazido, como de
costume, a câmara de casa. Mas, depois, agradeci.
Não só não me
preocupei com o rectângulo que exclui tudo o resto, como nunca conseguirei
chegar aos pés do mestre para o imitar. O seu a seu dono!
Foi bem melhor
deixar que as nuvens se moldassem ao meu espírito, ou o espírito às nuvens, ou
ainda numa simbiose animal/mineral para benefício de ambos.
Há momentos em que
o bom mesmo é nada fazer, ser apenas. Os sons, a luz, o tacto, os aromas, os
paladares (agora uns Pint’s pretos). Ser apenas. Sem sal nem pimenta!
Não! Hoje não!
Hoje não contribuo
para pensamentos negativos de quem me cerca! Hoje sou inocente por abstenção
das perguntas complicadas das crianças intrigadas, não vou obrigar a mudar de
canal, não vou pintar de podre a reunião familiar nem complicar as digestões.
Sou cúmplice –
somos todos – mas hoje não quero!
Hoje decidi ser
livre!
E desse lado?
Quando foi a última vez que o foi? Em consciência!
Imagem:
Equivalente, Alfred Stieglitz, 1926(?)
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