quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A seringa



Uma vez por ano passo por uma farmácia e compro duas ou três seringas destas.
É um acto comercial em que me divirto, pois de todas as vezes explico para que quero as seringas: para com elas encher com a tinta de que gosto os cartuchos descartáveis das canetas que gosto de usar. É que a Parker deixou de fabricar a cor sépia, mas sou teimoso e insisto em a usar.
Vai daí que a frase “preciso de uma seringa para escrever” não será tão absurda quanto isso.
Mas a verdade é que, para além deste uso bem incomum que dou a seringas, elas se vendem aos magotes para efeitos de medicina e enfermagem. E vendem-se, ou são ofertadas, a toxicodependentes, a fim de evitar a sua partilha e a disseminação de doenças.
Mas há um outro uso, bem mais frequente do que qualquer um de nós gostaria, para esta utensílio de saúde: o crime. Volta e meia lá se ouve ou lê que foi assaltado alguém sob a ameaça de uma seringa, supostamente infectada com HIV.
Donde se conclui que um objecto concebido com a melhor das intenções e com um uso generalizado para coisas boas (e alguns usos insuspeitos) pode ser usado com o pior dos objectivos.
E nunca ouvi ninguém reclamar um controlo apertado na venda ou distribuição de seringas, por assim poderem ser usadas. Nem nunca soube de quem fosse abordado por agentes da lei a questionarem o seu portador sobre identidade, ofício, registo criminal ou quejandos.
Em oposição, nunca ouvi contar ou li que alguém, em terras lusas, tivesse usado de uma catana para cometer um crime de sangue ou mesmo uma ameaça de crime. Tal como nunca ouvi dizer que os candidatos a possuírem carta de condução fossem objecto de testes psicotécnicos a fim de se averiguar se estariam a autorizar que atrás de um volante estivesse alguém que pusesse em risco a vida dos outros. Ou que houvesse gente que corresse a chamar a polícia apenas por ver um automóvel.
Não são os objectos que são perigosos à sociedade! Nem mesmo o seu porte. É o uso que se lhe dá!
E é a paranóia da sociedade moderna em tudo controlar, de todos desconfiar, de tudo regular e legislar.

Continuarei a comprar seringas para encher as minhas canetas até que seja obrigatório possuir licença de uso e porte de seringa. Aí entrarei na clandestinidade!

Texto e imagem: by me

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