Na
época o mercado do audiovisual não era nem a pálida amostra do que é hoje: poucas
empresas e pouca gente a saber fazer algumas funções específicas desta área.
Volta
e meia eu colaborava com uma dessas empresas, numa das duas valências específicas
que já na altura eu tinha.
Teve
a empresa a oportunidade de satisfazer uma encomenda especial, de complexidade
muito acima do que estava habituada, e que a poderia fazer dar um salto no
mercado. E pediu-me que colaborasse com eles na minha outra valência.
O
convite, ainda que lisonjeiro, foi incómodo. Tinham eles alguém que costumava
fazer o que queriam que eu fosse fazer, ainda que pouco experiente. Não me senti
bem em substitui-lo e tentei recusar. Mas as insistências foram muitas, bem
como os argumentos sobre a importância do trabalho em causa, e acabei por
aceitar, depois de conversar com a pessoa que eu iria substituir.
No
local onde decorreriam os trabalhos, foi tudo montado e preparado, logo a
partir de manhãzinha. E ensaiado e testado como a responsabilidade da situação
implicava. Tudo certinho e pronto para o que aconteceria pelas 21 horas, ou
pouco depois.
Pelas
cinco da tarde, falei com o chefe de operações, e patrão, propondo-lhe ir eu
trincar qualquer coisa ali perto, para depois ficar disponível o resto da tarde
e noite. E fui.
Quando
regressei, uma hora depois, estava tudo em pânico: tinham querido fazer algo
que não estava nos planos e o conjunto do equipamento não funcionava
devidamente. Estranhei! Tudo tinha ficado afinado e testado e aquilo não podia
suceder. A menos que uma avaria… E havia que dar com ela.
Pedi
um nico para pensar. Pelos sintomas, parecia ser naquela unidade. Pouco provável,
mas possível.
Dei
a volta e fui lá atrás. Deitei-me por sob parte daquele emaranhado de cabos e
equipamento, estiquei-me até ao fundo para chegar onde queria e lá estava a
unidade. Com a luzinha de “power” apagada. Queimada a fonte de alimentação? Queimado
o fusível? Meio pelo tacto, que a luz era muito fraca e a minha sempietrna lanterna
não chegava lá, dei com o respectivo botão e… estava em “off”. Liguei-o e, do
outro lado da tralha, ouvi um grito de aviso: “Já está! Já cá o temos!”
Rastejei
dali para o meu posto de trabalho e seguimos o que havia para fazer. Ainda me
perguntaram o que tinha sido, mas não me dei por achado. Respondi que teria
sido um mau contacto e que as reparações “à portuguesa” resultam sempre.
Fiquei
mais que convencido, ali e então e até hoje, que aquele botão não se havia
desligado sozinho. E que sabia quem era o dono do dedo que o havia desligado,
que só uma pessoa sabia da existência daquela unidade e da sua importância no
conjunto. Nunca o comentei naquela empresa nem confrontei a pessoa de quem eu
suspeitava: aquele que eu tinha ido substituir.
Sorte
a minha que, não estando por completo familiarizado com todo aquele conjunto, o
havia “descascado” quase por completo durante o dia e tinha um mapa mental do
que existia, onde e com que funções.
Se
assim não tivesse feito, o resultado seria bem diferente, e não o melhor para
mim.
O
mundo deu muitas voltas e aquela empresa acabou por fechar. Como tantas outras.
E, nessas voltas que o mundo dá, apercebo-me vinte anos depois que essa pessoa
havia acabado por integrar os quadros da minha empresa. Cruzamo-nos de quando
em vez, partilhamos o espaço comum de um cigarrinho ou café, mas nunca esse
episódio, ou mesmo aquela empresa, foi badalada.
O
mundo continuou a dar voltas. Sobre si mesmo e em torno do sol. E agora, quase
trinta anos sobre o episódio, eis que as coisas se invertem: Por causa das
minhas fotografias planeadas e não tão comuns, tive que lhe pedir um favor. Que
é das poucas pessoas que conheço que o pode satisfazer.
Fico
na expectativa de saber se o satisfará, como mo disse, ou se ainda sobrará algo
dessa época.
Nas
voltas que o mundo dá, há nós que são de difícil desatar.
By me
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