sábado, 10 de agosto de 2013

O Homem e a Luz



A primeira vez que tive contacto próximo com o assunto foi há dois ou três anos. Num evento sobre fotografia, vários colóquios. E num deles, o orador alertava os presentes sobre a questão, baseado nas suas próprias conclusões e experiência enquanto luminotécnico e director de luz em espectáculos.
O assunto e as consequências em causa era para mim novidade mas não lhe dei a devida atenção. O tom meio dramático dado por quem discursava fez-me classificá-lo como tema interessante mas não o suficiente para sobre ele me debruçar posteriormente. Erro meu.

A segunda vez que me deparei com o assunto foi bem mais grave.
O meu ofício implica ter uma razoável, boa mesmo, avaliação de cores e do seu equilíbrio. E saber colocar algo como realmente neutro, sem dominantes cromáticas, quando for esse o caso. Lido com isso electronicamente, ajustando nos diversos patamares da curva de resposta das três cores básicas, vermelho, verde e azul, e, com elas, as respectivas complementares: amarelo, ciano e magenta.
Um dia uma colega chama a minha atenção para o facto de eu estar a ter uma dominante verde no meu trabalho. Fiquei em pânico. Não estava a dar por isso nem tal deveria acontecer.
Isto, junto com um outro episódio de iluminação doméstica para criar ambientes satisfatórios, levou-me a tirar as teimas. Com rigor e recurso a aparelho de medida: um termocolorímetro que também aquilata da relação verde/magenta.
A dominante cromática em minha casa era VERDE. A maioria das lâmpadas economizadoras que aqui tinha tinham essa dominante. Tratavam-se de lâmpadas ditas “tom quente”, em que o amarelo/verde domina. Troquei-as por lâmpadas igualmente economizadoras mas ditas “luz de dia” e essa dominante quase desapareceu. Quase, mas não totalmente. Claro que é uma luz mais azulada que as outras, mais “fria”, mas mais próxima do natural. E resolvi a minha questão laboral.

Esta questão fez-me recordar o colóquio a que assisti. Nele, o orador alertava para o facto de a espécie humana sempre ter vivido sob influência de luz natural que, tendo todas as cores que conhecemos do arco-íris, varia ao longo do dia apenas nos azuis e vermelhos, mantendo um equilíbrio mais ou menos constante nas outras cores (ou frequências). Mesmo a iluminação artificial tem sido, desde sempre, baseada na queima de algo: madeira, azeite, petróleo. Incluindo as lâmpadas de incandescência, que queimam o filamento. E, ao queimar algo, tal como acontece com o sol, as variações de intensidade na queima fazem variações na gama dos azuis e vermelhos, mantendo as restantes frequências (ou cores) equilibradas.
Quando entrámos na campo da iluminação artificial baseada na ionização de gases (sódios, mercúrios, xénons, argons e outros) com acontece na iluminação das vias públicas, monumentos, áreas fabris e, agora, domésticas, com menor consumo energético para um equivalente rendimento lúmico, com menores perdas por calor, achámos que tínhamos encontrado a fórmula ideal de preservar o ambiente. Menos combustível fóssil, menos aquecimento global, mais ecologia.
O problema levanta-se em nós mesmos!

O cérebro interpreta uma superfície branca como sendo branca, adaptando a informação que recebe da retina em função do conhecimento prévio que tem da situação. Desde que a dominante cromática não seja particularmente notória, adaptamo-nos. O mesmo papel branco é visto como tal sob a luz do sol, sob a luz de uma lâmpada de filamento, à luz de uma luz fluorescente ou com as lâmpadas economizadores, “quente” ou “luz de dia”. O problema está em que as últimas três têm dominantes verdes/amarelo de que não nos apercebemos que não por comparação próxima.
E quando passamos horas, dias, meses, anos, vendo o que nos cerca sob essa iluminação alteramos os nossos próprios padrões de cor. E quando encontramos um “branco” que não tenha essa dominante temos tendência em alterá-lo para que esteja de acordo com os padrões que o cérebro fixou.
Estamos, em consequência das tecnologias contemporâneas, a alterar a nossa capacidade de ver o mundo que nos cerca!

Acredito que a grande maioria dos que lerem estas linhas não se aperceba de tal. Tal como a grande maioria não terá um termocolorímetro para fazer as medições necessárias.
Mas tem essa mesma maioria uma ferramenta equivalente: a sua câmara fotográfica digital.
Sugiro o simples teste: escolham um objecto multicolorido. Coloquem-no sobre uma cartolina que sabem branca. Calibrem a vossa câmara para “luz de dia”. E fotografem-no à luz do sol directo, sob a luz de fluorescentes (há vários tipos) e sob a iluminação de lâmpadas economizadoras, “quente” e “luz de dia”. Nos casos da luz artificial, esperem uns minutos, 5 ou 6, para que estabilizem as ionizações e respectivas radiações visíveis (luz).
Comparem depois os resultados no vosso computador. De preferência usando uma imagem artificialmente criada e pintada de branco puro.
E pensem, depois, em como estão a subverter a forma como vêem o mundo e as suas cores.

O orador do colóquio a que assisti ainda acrescentou um outro factor, importante para os que acham que podemos adulterarmo-nos em função da ecologia:
O custo de produção (fabrico e materiais) das lâmpadas fluorescentes e economizadoras, o custo de reciclagem das mesmas quando fora de uso (as economizadoras contêm circuitos electrónicos na base, com metais pesados) e o que fazer com os gases e pós que elas contêm. Notem bem as indicações que os ecopontos têm sobre estas lâmpadas.

Para os puristas da produção de imagem, sugiro que calibrem os vossos monitores em função da dominante cromática em que vivem, no equilíbrio verde/magenta, tão importante como a conhecida e badalada “temperatura de cor”, que apenas reflecte a relação azul/vermelho. Bem como a qualidade das vossas impressões e sob que luz as observam. E lembrem-se, igualmente, que os trabalhos em suporte electrónico são vistos pelo público em monitores calibrados sabe-se lá como e por onde: dominantes, saturações e gamas.

Para os não puristas, recomendo que ajustem o vosso monitor uma vez por ano e que tratem de gostar do que aí vêem. Os resto… os outros que se cuidem.

By me

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