quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Duas lições



Faz hoje anos!
Não sei quantos, mas faz hoje anos e muitos.
E sei que faz hoje anos porque a história se passou num malfadado quinze de Agosto. Que, e até que se acabe totalmente a cumplicidade entre o estado e a igreja, é feriado. Nesse dia também era.
Mas, contando.

Eu era um dos administradores do prédio em que vivia então. Decorriam obras de monta no telhado, substituição integral com aumento do declive por via de infiltrações da chuva.
Aproveitando as obras, e sendo que nesse dia eu também não estava de serviço, tinha combinado a visita técnica de quem viria inspeccionar e reparar questões relacionadas com a distribuição de sinal de televisão no prédio. Um dia feriado mas de muito trabalho.
O técnico das antenas chegou a meio da manhã, fomos ver o que havia para ver e, quando quis entrar em casa para tratar de formalidades, constatei que me havia acontecido algo de inédito: deixara a chave de casa dentro de casa.
Para quem vive sozinho, isto pode ser um problema complicado de resolver, pelo que tinha tomado as minhas cautelas: uma chave em casa de um parente, que residia perto. O que não havia previsto era que esse parente estaria de férias em Agosto.
Razoavelmente enervado, a ponto de o técnico ter dito que voltaria noutro dia para o que havia a fazer, fui a casa de um vizinho de confiança para resolver a questão pelo telefone. Que, por experiência prévia, sabia-me eu incapaz de forçar a fechadura.  
As casas de chaves e fechaduras da zona estavam fechadas, que era feriado e Agosto.
Uma grande e conhecida casa especialista em Lisboa, fiquei eu a saber, só tinha um piquete em dias feriados, e teria eu que aguardar que estivesse disponível. Muitas horas, que havia muito trabalho.
Os bombeiros da freguesia não usavam a escada de pescoço de cavalo a menos que houvesse sinistro. Uma porta fechada não justificava o risco do bombeiro. A escada “Magirus”, por sua vez, estava avariada, pelo que, disseram-me, se dela necessitassem, pediriam ajuda a Lisboa.
Dos bombeiros de Lisboa, e exposta a situação pelo telefone, ouvi uma gargalhada. Nem por nada mandariam um equipamento especializado fazer todos aqueles quilómetros por causa de uma porta fechada.
Este somatório de recusas e impossibilidades estava a aumentar, exponencialmente, o meu desespero e respectivo nervosismo. Já me estava a ver a ter que ir passar a noite numa pensão da zona.
É nesta altura, a meio da tarde e eu furibundo, que chegam alguns operários para adiantarem um pouco do trabalho no telhado. Que estava mais que atrasado face ao previsto. E desbronquei com eles, forte e feio.
Felizmente que o empreiteiro, além de bom humor, ex-paraquedista e rivalizar comigo no tamanho da barba, era pessoa de expedientes e solucionou-me o problema: descendo pela fachada, pendurado por uma corda, entrou em minha casa por uma janela e abriu-me a porta por dentro.

Desta história, que hoje se comemora e que teve um final feliz e económico, sobraram-me duas lições.
Por um lado, encontrei uma solução prática para ser praticamente impossível o eu deixar a chave em casa fechando a porta. O grau de probabilidade, com este método, de tal suceder é negligenciável.
Por outro fiquei a saber que a esmagadora maioria das pessoas vêem alguém a entrar num apartamento por uma corda, sem que o seu dono, polícia ou bombeiros estejam por perto, e nada fazem. Aquele entrar em casa bem que poderia ser um assalto que mais nada aconteceria.


Cidadania e boa vizinhança, procuram-se!

By me

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