terça-feira, 20 de novembro de 2012

Nós




A vantagem – ou desvantagem – de já se ter vivido um pedacito é já ter um bom número de histórias – ou estórias – contáveis.
Nem todas dignificantes para quem as conta, nem todas dignificantes para o protagonista do que é contado.
Calhou-me, em catraio na escola então primária, agora primeiro ciclo, dois irmãos como colegas. Mais tarde, e porque a zona de residência na cidade continuava próxima, acabámos por partilhar o mesmo liceu.
Esses dois, com diferença de um ano e pouco entre eles, eram peças especiais. Para que se tenha uma ideia, quando se zangavam com alguém, arregimentavam mais uns quantos que segurariam na vítima, enquanto eles se entretinham a dar uso ao cinto que lhes segurava os calções, primeiro, as calças mais tarde. Isto desde os primeiros anos de escola.
Já no liceu, tive com o mais novo uma verdadeira cena de pugilato, das raras que vivi, e da qual ainda guardo uma cicatriz na mão direita, de lhe ter acertado bem em cheio.
Por esses tempos (’72, ’73, ’74) soube-os ligados a um tal de “MN”, Movimento Nacionalista, coisa pouco simpática e do outro lado da barricada que eu defendia, que andava a escrever e distribuir, na clandestinidade possível, panfletos contra a guerra colonial.
No ano lectivo 1974/75, em que já não partilhámos liceu por via das moradas de residência, soube que tinham sido por várias vezes detidos pelos militares, algumas no liceu, outras em casa, por suspeita de pertencerem ao ELP – Exército de Libertação Português – um movimento de extrema-direita, que pretendia repor pelas armas o regime deposto com a revolução.
Passou o tempo e pedi-lhes o rasto. A um e a outro. E, com ele, a lembrança sequer que tinham existido. Até um destes dias!
O nome ouvido no noticiário televisivo fez-me levantar as orelhas. As imagens que se lhe seguiram, dando o desconto de quarenta anos vividos de parte a parte, fez-me recuar no tempo. E uma busca na web tirou-me mesmo quaisquer dúvidas residuais.
Aquele fulano na pantalha e que se candidatava numas eleições que não para um cargo público era mesmo aquele com quem me bati, que recorria a outros para os seus trabalhinhos sujos e que, mais velho fosse uns anos, teria sido agente da PIDE p’la certa.

Ficou-me, para além da raiva sobre o passado, uma dúvida: deveria eu “por a boca no trombone” e divulgar o que sobre ele sei?
Em público seria complicado, que duvido que os militares tenham registos desses tempos conturbados. E, quanto ao resto, seria “palavra contra palavra”, em que a sua alta posição social me derrubaria p’la certa.
Fiquei-me por fazer uns desabafos junto de alguns conhecidos, escolhidos. Do que daí advier, com ou sem investigações por parte dos seus oponentes, passar-me-á completamente ao lado.
Quanto a ele, certamente que, mais cedo ou mais tarde, terá que desatar os nós que deu na vida como qualquer outro. Eu mesmo incluído.

By me 

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