terça-feira, 5 de julho de 2011

O pau



A história é velha.
Tão velha que, se tivesse barbas, seriam bem maiores que a minha, o que não será fácil. Aliás, é tão velha que já esqueci nomes e caras. Bem, não é tanto assim. Esqueci nomes porque a minha memória para eles é péssima; e esqueci caras porque fiz muita questão de as apagar dos meus registos neurológicos. Mas não esqueci um nome em particular, nem a história.
Mas passemos a ela:
Chego um dia à escola, em meados de Janeiros, e na sala de professores uma colega pergunta-me sobre o que se passaria, já que algumas alunas da turma “tal” se estariam a queixar à direcção sobre um eventual mau comportamento de cariz sexual meu para com elas.
Imagine-se a minha cara! Por uma lado porque totalmente inocente do que quer que fosse. Por outro, e ainda que na altura a questão da pedofilia não andasse na boca do mundo, a acusação era particularmente grave. Se a isto se juntar o ter acontecido algo de semelhante naquela escola uns dois anos antes e um professor ter sido por isso afastado, imagine-se a minha mais que preocupação. Ainda que ignorante do assunto.
A questão era grave!
Passado um pouco, a directora chegou e chamou-me ao seu gabinete. Sem rodeios, mas de uma forma afável, perguntou-me que história era aquela de eu andar a dizer às alunas que tinham que “andar com o pau entre as pernas”.
A minha expressão passou de extrema preocupação a boa disposição, rematada com uma franca gargalhada.
E lá lhe expliquei que a frase era usada por mim para dar ênfase à forma como uma câmara de vídeo deve ser operada quando em tripé e com um visor de óculo: com uma das pernas do tripé entre as nossas, para permitir maior conforto e segurança nos movimentos mais amplos de rotação. Que se tratava de uma mnemónica humorística, que a todos provocava sorrisos e aligeirava o ambiente. E que dizia fazia tempo e tencionava continuar a dizer.
E ainda ela não tinha acabado de rir com a minha descrição, já eu lhe perguntava se, por mero acaso, quem se queixava de tal não seriam a Fulana”, a “Cicrana” e a “Beltrana”. Confirmados os nomes, rematei que essas alunas tinham estado a copiar no último teste do módulo, muito para além do que qualquer extrema tolerância poderia aceitar, e que tinha logo na altura identificado os testes para mais tarde ponderar sobre o caso. E mostrei-os, que já estavam todos corrigidos e prontos para entrega. E que aquela queixa inusitada mais não era uma vingança da parte delas.
Mais uns risos e considerações sobre comportamentos estudantis e o assunto morreu ali. Pelo menos no triângulo alunos/professor/direcção. Que no binómio alunos/professor alguma coisa ainda teria que ser feita.
Já na aula com a turma, e em terminando o trabalho previsto de fim de módulo, fiz um pequeno discurso em que lhes pedia desculpa sobre a forma como os tinha tratado, pois que partira do princípio de estar a lidar com gente crescida e, afinal, alguns eram crianças pequenas, necessitando de tratamento adequado.
Muitos foram os que me vieram perguntar o que se passava, ao que a minha resposta era simples mas pouco esclarecedora: “Se não percebeste não te preocupes, que não era contigo”.
Acabou aqui a história e rapidamente esqueci o nome dos intervenientes, excepto o da directora, a senhora G., que teve o bom senso de averiguar o caso antes que caísse nas bocas do mundo, com o que isso significaria para todos os envolvidos, eu incluído.

E ainda hoje eu vou dizendo que, em certas circunstâncias de operação de vídeo, se deve estar com o pau entre as pernas.


Texto e imagem: by me

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