sábado, 16 de julho de 2011

Leituras na (ou da) cidade



O eléctrico ia cheio.
De nativos que regressavam a casa num fim de tarde de um sábado que fora cheio das suas vidas, e de turistas, que faziam questão de usar este “pitoresco” meio de transporte.
A maioria embarcou nas Portas do Sol e em Santa Luzia, vindos do miradouro ensolarado, hoje a ameaçar de nuvens pesadas vistas à distância, ou do castelo, em que se paga uma pipa de massa para se ver quase coisa nenhuma.
E os turistas iam dando uso às “máquinas “ fotográficas, p’la janela ou no interior, uns aos outros, num festival de fotos tremidas ou desfocadas, se é que eu percebo alguma coisa do assunto.
E aqueles turistas de fora que não fotografavam, iam seguindo pelos mapas, cheios de anotações, o trajecto do eléctrico, tentando assim, por entre ruas e vielas, acertar na paragem do bairro alto, destino da maioria que, estando o sol alto, é um disparate turístico.
Dois passageiros, no entanto, não ligavam peva ao trajecto ou a mapas. Eu mesmo, que me ia divertindo com o espectáculo interior, e este “nativo” que primava pela ausência. Ia lendo um livro, que mais tarde percebi ser uma aventura de cowboys, apesar dos solavancos intensos que a velha máquina dos carris ia provocando. Seria um velho habituado a estas coisas, que se com uma mão se segurava num banco, qual marinheiro na amurada, com a outra manuseava o livro, virado e vincado, com gestos aprendidos há muito, p’la certa.
Aliás, devo confessar, que há muito mesmo que não via um leitor tratar desta forma um livro. Consigo mesmo imaginar, como era uso nos meus tempos de catraio, que tenha sido emprestado no barbeiro onde, cliente habitual que seria, o devolveria na semana seguinte. Coisas de antigamente, quando um empréstimo era seguro e a leitura de um livro, mesmo que de cowboys, um prazer.

Texto e imagem: by me

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