terça-feira, 12 de julho de 2011

Em modo "Mute"



A história é quase tão velha quanto o meu bigode, que é mais velho que a minha barba.
Numa papelaria numa rua estreita da baixa Lisboeta, um já idoso caixeiro ia atendendo os clientes, deixando em cima do balcão, que pedia meças de idade aos seus avós, as encomendas, regressando aos corredores entres as prateleiras em busca do que faltava.
A dado passo o telefone começa a retinir. O vetusto trim-trim, que hoje muitos só conhecem dos toques sintetizados dos telemóveis. E foi tocando, e tocando, e tocando, sem que o velhote lhe ligasse importância.
Mas aquilo incomodava os clientes que, como eu mesmo, esperavam vez. E um deles fez-lhe notar o trim-trim insistente, supondo que ele não o tivesse ouvido. Como se tal fosse possível!
E o velhote, entre o vir e o ir, respondeu:
“Deve ser um cliente que me quer deixar uma lista de encomenda, tentando com isso passar à frente daqueles que já cá estão. Comigo isso não, e será atendido na sua vez, como toda a gente. Olhe, é a seguir àquele senhor.”
Naquele dia aprendemos todos qualquer coisa, e espero que quem estivesse do outro lado da linha também.

Lembrei-me desta estória a propósito de um muito jovem colega.
Protestava ele, indignado, que seria um ultraje, uma limitação à liberdade de cada um a atitude de um treinador de futebol que, e de acordo com o que acabava de ler num diário desportivo, teria proibido os seus jogadores de utilizarem o telemóvel desde que entravam no balneário para se equiparem até que dele saiam, já depois do duche final. Isso mesmo em treinos.
Claro está que ele, o meu jovem colega, não entende que o futebol profissional implica uma grande dose de concentração, mesmo em treinos, e que o telemóvel é uma interrupção assaz violenta disso mesmo. Para quem atende, para quem ouve tocar e para quem tem uma conversa interrompida porque o seu interlocutor decide atender a meio do que está a fazer.
Acho que ele, o meu jovem colega, que tem telemóvel desde os 12 anos de idade, não o entendeu, nem mesmo quando usei do já estafado argumento que passa por uma pergunta: “E quando estás a dar uma queca, interrompes para atender o telemóvel?” Deixei de usar o argumento do banho, porque houve já quem me respondesse que sim, que saía do banho a meio se o telefone tocasse. Para o caso que agora uso, ainda ninguém defraudou as minhas expectativas.

Por mim, quando o telefone toca, atendo ou não conforme posso ou não interromper o que estou a fazer, ou mesmo se o quero ou não. Se houver muita pressa nalgum recado, que deixem mensagem, que é para isso que o serviço existe.
Nunca a meio do trabalho e, muito menos, a meio de um acto fotográfico.

Texto e imagem: by me

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