sábado, 9 de julho de 2011

Não querias mais nada!?



Esperava pelo comboio. Tinha acabado de passar um, pelo que me aguardavam uns quinze minutos de cais, deambulando de uma lado para o outro, tentando manter a mente ocupada ou, pelo menos, utilmente ocupada.
E enquanto por ali estava com a atenção focada a muitos km de distância, ouvi alguém chamar por alguém. Era lá longe, certamente que não para mim. Menos ainda, e isso era decisão minha, porque se chamava por alguém que seria “Oh chefe”, coisa que não sou.
Mas quando me voltei para este gradeamento que impede uma queda aparatosa do cais de embarque para a rampa que lhe dá acesso, estava lá em baixo um tipo que esbracejava. E era para mim, que mais ninguém por ali marcava presença.
Os seus gestos eram inequívocos: Perguntava-me se tinha lume.
Com um cigarro aceso na mão dificilmente poderia dizer que não, pelo que, usando da mesma linguagem gestual, disse-lhe que sim.
Mantiveram-se os gestos, nem sei porque motivo, mas os dele também não deram azo a mal-entendidos: queria que lhe atirasse, daqui para ali, o isqueiro.
Ora batatas! Então eu iria atirar o meu Zippo desta altura, com risco de cair no chão e ficar lascado, para alguém que não conhecia e que, quem sabe, me ficaria com ele? É que nem pensem!
E lá lhe fiz entender, sempre gestualmente, que viesse ter comigo.
Aqui a conversa passou a sonora. Ainda que não muito alto, afirmou ele, em tom espantado:
“Mas assim tenho que dar a volta e subir a rampa para aí chegar.”
“Pois!”, foi a resposta lacónica que obteve.
Vieram vocês, que nem lá estavam? Assim veio ele, que regressou à parte não visível da rampa, falando não sei para quem.
Uns minutos depois, vejo-o subir esta mesma rampa, enorme como se constata, agora sim de cigarro aceso. E quando o comboio chegou, embarcou como eu mesmo, que o tinha debaixo de olho.
Ser tratado por “Oh chefe!” por desconhecidos incomoda-me. Uma pseudo familiaridade, uma pseudo auto-humilhação que, em boa verdade, são formas de manter a distância com soberba com o interlocutor. Em regra faço por os ignorar. Se estiver de bom-humor ainda lhes returco um qualquer sarcasmo que me surja à cabeça.
Agora juntar a isso uma atitude de que o mundo existe para os servir e ficar muito enxofrado quando constatam que tal assim não é, bem… Isso faz-me sair da compostura urbana e civilizada que costumo ter e, quando calha, recorrer ao português vernáculo, com ou sem novo acordo.
É que também a minha paciência tem limites.

No meio de toda esta história o que me deixou mesmo chateado foi o “ter perdido o fio à meada” no tocante à organização de umas ideias que me andam aqui a cucutar a cabeça faz tempo e que, neste dia, começavam a fazer sentido. Amanhã ou depois, quem sabe, elas regressam.

Texto e imagem: by me

Sem comentários: