segunda-feira, 18 de julho de 2011

Do outro lado do vidro



Sentaram-se a uns dois metros de mim, do outro lado do vidro. Que, nestas coisas de restaurantes, prefiro algum recato a exposições indiscretas em pseudo-esplanadas interiores e barulhentas.
As duas garotas, a mais velha, aí de uns 13/14 anos e a mais nova por volta dos cinco anitos, bulharam um pouco por causa de quem se sentaria onde. A decisão coube à mais pequenita: ao lado da mãe.
Nem esta nem o pai se distinguiam em particular de todos os outros que se passeiam com a prole num centro comercial. Nenhuma ostentação, fios ou pulseiras, e os únicos anéis que lhes vi foram as alianças de casamento. As roupas e calçado normalíssimos, daqueles que se podem levar todos os dias para um qualquer emprego. Cara rapada a dele, cabelo curto e sem pinturas na cara, ela.
O que me chamou a atenção nesta família banal?
É que quando chegaram as bebidas – refrescos para as minorcas, sangria para os adultos – as canecas destes foram levantadas e tocaram-se, num brinde recíproco, exibindo ambos um sorriso cúmplice e ternurento. Qualquer coisa de fugaz mas real e intenso.
Claro que fiz de conta que não dei por nada e mergulhei a minha atenção e palato no bife de atum que me tinham posto à frente.
Nada no resto do jantar demonstrou alguma coisa de especial naquele casal. Alguma conversa (que o vidro que nos separava me impedia de ouvir), alguma atenção para com o prato da mais pequenina, que fazia questão de comer sozinha, a irmã a tocar no braço do pai para lhe falar de qualquer coisa de muitíssimo urgente… nada de especial.
Mas aquele sorriso alumiou o meu fim de dia, que havia primado por ser cinzento e banal.

Texto e imagem: by me

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