Esta afirmação, vinda de quem tem a fotografia (“o instante
decisivo”, como disse o mestre) como sendo o alimento da alma será estranha.
Mas a verdade é que cada instante da vida é precedido de
toda uma existência, do próprio e de tudo o mais, que condiciona o que acontece
naquele instante. E tudo o que se lhe segue é condicionado por aquele instante.
Sou “acusado” de muito contar e relatar em torno de
instantes. Contextualizo, refiro a história, descrevo pormenores…
Mas a verdade é que se eu contar que deixei cair uma pedra
da janela e acertou num carro em baixo contei o facto. E nada mais. Um pouco à
imagem do jornalismo contemporâneo.
Mas é sempre importante saber porque tinha eu a pedra na
mão, como foi ela para a minha casa, que tipo de pedra se tratava… Tal como que
tipo e idade do carro, porque ou como estava ele sob a minha janela, quais as consequências
ou danos…
O instante fotográfico é delicioso. O conseguir captar numa
fracção de segundo algo de belo (ou horrendo) que faça passar emoções é o
objectivo do fotógrafo. Mas talvez por isso eu não seja um bom fotógrafo.
Esse instante da vida que registo não me chega. O climax ou
orgasmo fotográfico é insuficiente para descrever todas as emoções que sinto. As
do instante, as que antecederam e as que lhe sucederam.
Posso, talvez, fazer fotografias bonitas. Mas não contam
tudo o que quero contar.
Por essa incapacidade minha, acabei por me tornar naquilo a
que chamo de fotocronista: completo a imagem com palavras, inscrevendo-a num
contexto mais abrangente e completo.
Tal como nos “discursos”, em que para além dos factos, nus e
crus, necessito da contextualização, da envolvência temporal e factual, para
completar a mensagem.
Serei uma seca nas conversas que tenho e naquilo que
escrevo. Mas sou genuíno. E, mais que instantes, interessa-me a vida.
By me
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