terça-feira, 31 de julho de 2018

Uma fotografia que não tenho




Negra! Daquele tom africano que quase nos faz pensar em algo levemente azulado. E que, pela minha falta de hábito em registar este tipo de tez, me deixa quase à-toa em o reproduzir com exactidão.
Bonita! Francamente bonita. Pelo menos naquilo que lhe podia ver, ou seja, as mãos, metade dos pés e a cara. Que todo o resto estava integralmente coberto. Num sinal inequívoco da sua fé ou crença.

Quando passou para cima, acompanhada pela pequenada, olhou mas sem muito interesse, que a canalha miúda absorvia-lhe a atenção. Mas no regresso, com mais calma, ficou a olhar à distância para o meu artefacto. Sentindo-lhe interesse, sorri-lhe e gesticulei-lhe que se aproximasse, o que fez.
A comunicação começou por ser difícil e a medo, que pouco sabia de português. Mas em sabendo-me a falar, ainda que mal, o francês, tudo se tornou mais fácil e quis fazer uma fotografia.
Enquanto a impressão acontecia, fui inquirindo a anotando as respostas, como de costume. E foi aí que a coisa aconteceu!
Não tinha a senhora entendido que não apenas iria haver uma eventual publicação na web como, menos ainda, que eu ficaria com uma cópia do que lhe entregasse. E isso quase que a ofendeu. Acredito que entrasse violentamente em confronto com a sua religião que, ao que sei no seu país de origem – Senegal – é seguida com muito rigor.
Desfiz-me em desculpas pelo meu erro ou engano na informação e prometi-lhe solenemente que, em chegando a casa destruiria a cópia que possuía. Que ficasse tranquila que tal sucederia pela certa.
E tantas vezes o assegurei que ela acabou por se descontrair um pouco e passamos a uma pequena mas amena conversa. Estava há cerca de um ano em Portugal, a língua escrita entendia-a mas a falada era uma dificuldade. E que um dos objectivos em aqui estar era o continuar os estudos iniciados na terra natal, nomeadamente em filosofia.

Em chegando a casa e em tratando as imagens e dados recolhidos, confesso que me passou pela cabeça ficar com a imagem. Afinal, ninguém saberia da coisa, ninguém a veria, nem mesmo a retratada e a sua prole, pelo que nenhum mal daí adviria. Excepto…
Excepto a minha própria consciência! Que palavra dada é palavra a cumprir, mesmo que mais ninguém saiba que o fiz. Que o meu pior juiz sou eu mesmo!
E foi destruída!

E se a retratada, cujo nome eu tenho mas que aqui não referirei como é óbvio, por aqui passar, que esteja descansada:
Daquela fotografia, feita numa tarde de 2008 no Jardim da Estrela e com uma câmara de madeira, não existe nenhum outro registo que não seja aquele pedaço de papel com que ficou.
Porque, afinal, seja qual for a fé que nos move (monoteísta, animista ou ateísmo) a honra é comum a todas!

By me

Atitudes



Estou cada vez mais monárquico!
Defendo cada vez mais a existência de um reino!
Um reino de Acracia, onde ninguém impõe nada a ninguém, mas onde cada cidadão é responsável por todos e cada um os seus actos. 
E a ti, que me queres impor o teu pensamento e que aja como tu queres que eu aja, escarro-te na cara, porque não tenho a tradição de bater com um sapato.

By me

domingo, 29 de julho de 2018

Campanhas




Desculpem qualquer coisinha, mas…
Melhor que o nome desta campanha só mesmo o daquela outra para turistas: “Allgarve”, há uns anos, pela mão de Manuel Pinho.
Pergunto se a língua portuguesa é tão fraca, mas tão fraca mesmo, que até os emigrantes se esquecem dela.



By me

sexta-feira, 27 de julho de 2018

Herditariedade


Quando olho para algumas pessoas e para o que fazem e pergunto-me:
“Será que já nasceu assim tão estúpido, ou estudou para isso?”
É que é quase uma impossibilidade estatística o juntar tantos cromossomas de estupidez numa pessoa só.


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Carta a um ex-aluno




Em 1994 José Valente publicou este texto no jornal Público.
Tropecei nele e copiei-o, imprimindo-o em formato A3 e afixando-o na escola onde então lecionava num painel por onde todos passavam.
Enquanto lá estive, muita coisa entrou e saiu daquele painel, menos este desabafo, que se foi mantendo.
Hoje apeteceu-me recordá-lo, com outra imagem. Há dias assim.


Carta a um ex-aluno
Sem que verdadeiramente o tivesses notado, entre a boémia e as lutas estudantis, voaram os cinco anos que te separavam do primeiro emprego. Prolongaste habilmente a adolescência até onde te foi possível. Até hoje. Subitamente descobres que se tornou inconveniente o protesto, arriscada a crítica, imperdoável a irreverência. Há quem ache que crescer é isso.
Fica desde já decretado que usarás gravata. É natural: são cada vez mais as situações em que somos obrigados a exibi-la. Felizmente não são as mais agradáveis. Claro que terás licença de porte de jeans ao fim de semana, mas a gravata é o ritual iniciático com que marcarás a entrada na idade adulta.
Pensarás agora em fazer carreira. E a carreira é uma coisa que se faz subindo. Alguns sobem por ser do partido; outros apesar de não o terem. Distingue-os o facto de os primeiros serem muito mais numerosos e de a sua ascensão ser substancialmente mais fácil. Poderás manter as tuas convicções, mas deverás optar por um prudente lusco-fusco: a afirmação da diferença exigirá que sejas profissionalmente muito melhor para que te tolerem. Mais vale não arriscares: entre a fidelidade e a competência, o poder que temos opta sempre pela primeira.
Deverás, portanto, ser cauteloso. Antigamente em cada organização havia um pide e toda a gente sabia quem era. Agora é tudo mais leve, mais solto, mais terra-a-terra: o tipo que nos trama sorri-os da secretária ao lado. Ou então foi a outra, aquela que, ainda na faculdade, passou, de repente, a cumprimentar só com um beijinho, como, de imediato, passaram a fazer a cabeleireira dela, a manicure dela e a costureira dela. De qualquer modo, a denuncia foi feita na reunião do partido e já ninguém vai preso por subversão. Apenas nos comunicam que não fomos promovidos ou que o nosso contrato não foi renovado. Por razões estritamente técnicas.
Entre um slogan e um argumento, escolherás o primeiro: a argumentação, como se sabe, é sinal da mais confrangedora tibieza. Se te couberem em sorte alguns subordinados, assumirás o protagonismo nos bons momentos e deixar-lhe-ás o ónus dos momentos maus. Os subordinados foram feitos exactamente para isso. E se, mesmo assim, te vires em dificuldades, escolherás alguns deles, elogiá-los-ás publicamente de modo excessivo e demiti-los-ás logo que possas. Se os teus erros exigirem a exposição pública de um culpado, que, pelo menos, não sejas tu. Terás, claro, que por de lado esse apego à solidariedade: vives sob um poder que tem o autoritarismo como gramática, o pragmatismo como prontuário, a hipocrisia como respiração.
Claro que a indignação nos prega partidas. Se um dia a náusea começar a estrebuchar, talvez seja prudente resistires. A coerência é um luxo que, muitas vezes, se paga caro. Umas boas férias ajudarão. Retemperado, poderás derramar sobre essa revolta a condescendência de um sorriso.
Mas, se mesmo assim, não te resignares à surdina do ressentimento, invocarás, como justificação, um excesso de juventude. Deverás ostentar nessa invocação o mais genuíno arrependimento. O poder adora arrependidos e concede-lhes sempre um perdão compadecido e o correspondente subsídio de instalação.
Mas se nada disto te bastar, se o cansaço te encalhar num monte de urtigas e a repulsa meter uma bala na câmara, talvez possas improvisar conselhos a um qualquer ex-aluno. Deverás destinar esta carta à mais secreta das tuas gavetas. Ou então resta-te assumir que és um caso perdido. Com a vertiginosa alegria de saberes que, apesar de tudo, a adolescência continua a cascatear-te baixinho por dentro.


Imagem: by me

quinta-feira, 26 de julho de 2018

Cagalhotos




Ainda sobre o tal texto de um tal jornalista a propósito de aviões e fogos:
Do mesmo modo que habitação, saúde, alimentação, também o direito ao disparate é importante.
E basta andar na rua, nos cafés ou nas redes sociais, para nos apercebermos da quantidade de gente que faz questão de exercer esse direito.
E não é por ouvirmos alguém num autocarro a dizer uma enormidade absurda que o vamos crucificar em público, generalizando e fazendo dessa pessoa um exemplo de comportamento ou do pensamento de quem tenha o seu aspecto ou ofício.
Deixem o pobre homem em paz, que a senilidade não é característica única da idade e, tal como a gadanha, leva todos por igual.
Quanto ao resto, o exercício da opinião e a popularidade são, nalguns casos, como os estupfacientes: à medida que o vício aumenta é necessária maior quantidade para se obter satisfação.
E isto só se resolve, e para além da força de vontade do próprio, com tratamento e severa abstinência.
No caso em questão, o que haverá de melhor a fazer é ignorar o que diz e/ou faz, tratando-o como aos pobres de espírito.
Está nas nossas mãos fazer com que alarvidades ditas em público sejam inconsequentes: não alimentar audiências e deixar quem tal diz a falar sózinho.



By me

Privatizações




Leio que o Miradouro de Santa Catarina em Lisboa, vulgo “Adamastor”, vai ser vedado e com horário de funcionamento.
O edil que o afirma acrescenta que continuará a ser público mas condicionado.
A justificação prende-se com o “excesso de carga” do local, com demasiada gente de noite, com a sujidade no local, com o tráfico de droga… E acrescentam que pensam em atribuir a responsabilidade da manutenção do local a quem gere o quiosque ali situado.
Na raiz da decisão estarão as queixas dos moradores da zona.
Recorda-me isto outros locais públicos que o estão a deixar de ser, com condicionantes horárias ou barreiras físicas, transformando a cidade e o seu usufruto numa espécie de “condomínio semi-fechado”.
Quando o espaço público é retirado do público, mesmo que parcialmente, porque alguns o conspurcam ou dele abusam, algo de errado está ligado ao conceito de “público”.

Como disse Saramago:
Privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a nuvem que passa, privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno e de olhos abertos. E finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas privadas, mediante concurso internacional. Aí se encontra a salvação do mundo… e, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a todos.”



By me

quarta-feira, 25 de julho de 2018

Escribas de serviço



Eu juro que há coisas que tenho dificuldade em entender!
Aconteceu um acidente num barco na costa da Galiza.
Uma explosão a bordo provocou diversos feridos, alguns em estado grave. Dois portugueses estão entre as vítimas.
Os media, jornais e televisões, referem que se trata de uma catamarã.
Fico com aquela dúvida se os redactores que trabalham com o que recebem das agências noticiosas sabem o que é um catamarã. Se saberão que é um tipo de navio, de pequeno ou médio porte em regra, que possui dois cascos na água, no lugar de apenas um como é tradição milenar. E que existem ainda os trimarã que, como o nome sugere, possuem três cascos.
E não é preciso ser-se marinheiro ou especialista em hidrodinâmica para se saber isto.
Mas aquilo que não dizem, caramba, é que tipo de serviço ou frete fazia tal embarcação. Turismo aquático? Transporte de passageiros como no Tejo, em Lisboa? Investigação marítima? Competição? Porque é que estavam tantas pessoas naquela embarcação?
Um jornalista tem, no seu trabalho, que responder às cinco perguntas clássicas: Quem, quando, onde, como, porquê. Tem que ser curioso e satisfazer estas perguntas, que são as que o seu público terá perante os factos que relata.
Se não o fizer não fará bem o seu papel.
Mas, e sei-o em primeira mão, jornalistas há que entendem que o simples facto de ser um catamarã é suficiente para satisfazer as perguntas do público.
Mas eu só faço uma pergunta aos jornalistas desta terra: será que acham que a maioria do seu público sabe o que é e em que se usa um catamarã?
Ide escrever numa folha de couve, que é mais ecológico.

Nota complementar: este navio é turístico.


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terça-feira, 24 de julho de 2018

Futuros




Acreditavam os antigos que podiam prever o futuro observando e interpretando o voo das andorinhas.
Sem prisões nem condicionamentos, tenho o meu futuro na minha mão.


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segunda-feira, 23 de julho de 2018

Competições



Porque é que eu tenho tamanha aversão às competições desportivas, futebol incluído?
Exactamente porque se trata de “competição”!
Do berlinde de rua ao futebol mundial, interessa estar em competição, em ser-se melhor que o outro, em ser-se o primeiro. E, como me disse um jornalista uma ocasião, fazendo uma citação já não sei de quem, o segundo classificado é o primeiro lugar dos últimos.
Não importa se se corre muito! Não importa quão certeiro é o pontapé! Não importa a altura da fasquia saltada! 
Importa, antes sim, ser mais rápido que, mais certeiro que, ir mais alto que!
A competição desportiva é combate, é luta, é violência, é assumir a supremacia sobre os demais. É vencer os outros. 
Em última análise, faltam apenas as armas (e nalguns casos não faltam) no terreiro da competição.

Por mim, o que importa é ser melhor hoje do que fui ontem. Melhor que eu mesmo, ir mais longe do que fui, saltar mais do que saltei, ser mais certeiro do que fui. 
As únicas competições que aceito são comigo mesmo, nunca mas nunca usando outros como adversários mas tão só como exemplos. Não fazer como ele faz mas sim como eu sou capaz de fazer: melhor todos os dias.
E se hoje fui mais longe, ganhei o único campeonato em que aceito participar: comigo mesmo!

As competições desportivas (ou outras) são a forma como a maioria sublima as suas frustrações, a sua incapacidade de se melhorar um pouco todos os dias, e a forma de alguns espertos e bem sucedidos empresários ganharem rios de dinheiro à conta do esforço, alegrias e tristezas dos demais. 
O poder, esse, alimenta e alimenta-se disso. Que enquanto se discute, chora ou exulta com o esforço do atletas profissionais – ídolos que pela populaça dão o corpo ao manifesto -, vai a elite mantendo o seu lugar, com privilégios e capacidade de decidir e influir sobre a vida de cada cidadão. 

O meu único adversário sou eu. E é só com ele que compito.

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Suportes




Eu tinha 17 anos.
Pôs-se a possibilidade de ir em viagem de finalistas a Londres. A família não era abastada, longe disso, e não havia dinheiro para tais aventuras, mas com boas-vontades daqui e dali a coisa compôs-se. Incluindo a ajuda da família da minha namorada, que queria que eu fosse com ela.
O que não havia era como fazer o “para mais tarde recordar”. Eu tinha uma câmara desde os doze anos, mas fazer fotografia era caro e estava parada havia muito tempo. E era muito fracota. É muito fracota, que ainda a possuo.
Um parente decidiu chegar-se à frente e emprestar-me a sua. Recordo que era uma SLR mas não a marca. E possuía uma 50mm, mais que suficiente para os registos, digam hoje o que disserem sobre zooms e edições posteriores.
No dia em que me foi entregue (recordo o local exacto, a luz, a sombra da frondosa árvore, a mesa e os bancos de pedra) foi-me dada uma recomendação, entre outras, que não esqueci até hoje:
“Toma cuidado que ela só faz fotografias a cores!”
Quem ma emprestou já morreu, que o episódio é velho. As fotografias que fiz foram a cores e estão algures no arquivo, numa caixa que não sei qual. Já não olho para elas há anos e tenho a vaga memória de estarem rosadas, naquele tom de fotografias coloridas e mal processadas, em que a luz e a humidade são carrascos impiedosos.
E nunca virei a saber se esse meu primo, bem mais velho que eu, estaria a falar a sério se na brincadeira. Segui as suas indicações mas, na minha enorme ignorância sobre fotografia, aquela recomendação nunca me convenceu por aí além.
Anos mais tarde, já a fotografia fazia parte integrante da minha vida, disse-me uma senhora numa loja de fotógrafo em Castelo Branco que os rolos em Preto e Branco já não se fabricavam. E que não tinham. E eu, que tinha esgotado os que havia trazido de casa naquelas férias vadiando pelo país, acabei por ir comprar num dos outros poucos fotógrafos que a cidade tinha, ainda que tivesse penado para o encontrar.
Talvez que tivessem andado juntos na escola, aquela senhora e aquele meu primo, ainda que a geografia não o indicasse.

Vadiei pelo Preto e Branco durante anos. Porque o laboratório era meu, porque bem mais barato, porque o Ansel Adams era (e é) um mestre a tentar imitar.
Mas percebi, a dado passo, que o suporte e a técnica têm que ser usados em função daquilo que queremos transmitir e não podem ser limitadores do que queremos fazer.
Tenho para mim que a vida é a cores, que reagimos a elas como os cães aos cheiros, e é isso e dessa forma que quero mostrar.
O monocromatismo é apenas uma dessas formas.



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domingo, 22 de julho de 2018

Rede social




À desgarrada, multi-étnico, audiovisual, tempos livres, troca de galhardetes, crítica de costumes, gargalhadas e aplausos.
Uma rede social à moda antiga.


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Analogias


Se pensarmos bem, mais não somos que bolas num tabuleiro de snooker.
Apesar de começarmos todos em igualdade de circunstâncias, passamos o tempo a ser agredidos com um pau, mesmo que suavizado com giz; somos empurrados e afastados do caminho pelos nossos iguais, à bruta ou suavemente; o nosso caminho é mais vezes uma linha quebrada que uma linha recta; acabamos todos num buraco; suprema ironia para alguns, a última que pode morrer é a preta.
Já os deuses, os que comandam o jogo, divertem-se à brava com as nossas desditas e fazem o que podem para acabar connosco.

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No passeio




Quando me falam em a polícia estar na caça à multa, com os radares escondidos, apanhando quem ultrapassa o limite legal de velocidade, pergunto-me sobre andam esses “caçadores” em situações destas.
Recorrentes, fáceis de identificar e de provar. E que, para além de qualquer dúvida, infringem o código da estrada e colocam a vida de cidadãos em risco.
Os FDP (fãs dos popós) que os fazem, mais que pagar uma coima, deveriam ir de cana por uns quinze dias, não remíveis a dinheiro.
Para além de ficarem condicionados na sua liberdade e de conviverem com outros criminosos, nem sempre simpáticos, não seria o facto de terem ou não como pagar a coima que evitaria o castigo.
Talvez que assim aprendessem a não serem socialmente nocivos e perigosos.
E para os que defendem que não haveria quantidade de celas suficiente para tal quantidade de presos, eu respondo que em pouco tempo isso deixaria de ser problema. Que deixaríamos de ter carros assim estacionados.


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sábado, 21 de julho de 2018

Parabéns




É uma daquelas histórias ou estórias que não me canso de ir contando.
O meu tio Artur era uma figura impar. Era meu tio-avô, o que faz dele alguém de outras épocas. Tecnológica e socialmente.
Do que dele recordo, e recordo alguns episódios em primeira mão ou contados na família, lembro agora este:

Tinha ele uma agenda. Nada de especial nisto. Era uma daquelas grandes, de secretária, com capa de couro e que todos os anos implicava algum tempo para mudar o recheio e copiar para o novo as informações pertinentes do ano anterior. Coisa que ele fazia.
Tinha-a pousada num pequeno móvel, junto à porta de casa, tal como o telefone e as listas telefónicas. A pessoal e as que eram distribuídas anualmente.
Pois o meu tio Artur todos os dias consultava a sua agenda antes de sair e, se fosse o caso, descia a rua até à esquina, entrava na estação de correios que ainda lá está e enviava um telegrama. Um telegrama de parabéns a quem quer que conhecesse e constasse na sua agenda.
Um acto personalizado, decisão consciente e voluntária, querendo com isto fazer saber que aquela ou aquelas pessoas não estavam esquecidas. E custava-lhe algum dinheiro.
Nos tempos que correm, as redes sociais encarregam-se de nos lembrar e somos incitados e dizer algumas palavras de circunstância para pessoas que, tantas vezes, não conhecemos de outro mundo que não o virtual. Tão virtual quanto a sinceridade dos votos automáticos assim enviados.

Por mim, deixei de usar agenda faz tempo. A maior parte das anotações de que necessito guardo-as de outra forma e é algo que não preciso de transportar.
E não sou defensor de se dar os parabéns por um acto do qual nem sequer se é responsável, como será o caso do aniversário. Dos outros ou do meu.
Em qualquer dos casos, acho bonito que se tenha um gesto personalizado caso se o queira fazer. Coisa rara, nos tempos que correm.
Mas o meu tio Artur era de outros tempos.
E sendo certo que não sei a sua data de aniversário e que já por cá não está ninguém a quem o possa perguntar, aqui fica uma referência personalizada, que talvez lhe chegue ao conhecimento, sem importar a data. Onde quer que esteja.


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sexta-feira, 20 de julho de 2018

Étcas e ironias



Esta fotografia foi feita nos inícios da minha autonomia fotográfica. 
E foi um marco vital nesta minha actividade.

Tinha eu laboratório à disposição, a película comprava-a a metro e os químicos e papeis não eram assim tão caros. Desde que em preto e branco, que a fotografia a cores era um outro campeonato.
E tinha o mundo à minha disposição para registar. E registei! O que pude, o que quis, o que me pediram.
Lembro-me de a fazer: no bairro de Alvalade, em Lisboa, na manhã de um 24 de Dezembro. E lembro de, na altura, algo me ter batido forte.
Tal como me lembro de, mais tarde junto ao ampliador e olhando a prancheta branca, me ter questionado sobre a legitimidade de a ter feito. Questão essa que foi aumentando à medida que os halogenetos de prata foram escurecendo na tina do revelador. 
Ainda hoje me questiono. 
Este Dezembro, tantos anos depois, fui em busca do retratado. 
Suspeitava eu que poderia ser uma de duas pessoas, ainda hoje vendendo na rua e na zona. Não eram. 

Depois desta fotografia tenho pensado muito seriamente no direito que nós, possuidores de uma câmara fotográfica, temos em fazer registos de gente anónima, sem lhe perguntar se o podemos fazer ou se podemos divulgar. 
A minha opinião, que se formou nesse distante Natal, é que não! Não temos o direito de assim entramos na intimidade de terceiros, divulgando-o ao mundo na imprensa, nas galerias ou na net.
A vida de cada um a ele pertence e a minha câmara não é uma arma de caçar troféus na selva de betão que são as cidades.

Entendo que a fotografia em preto e branco é um caso particular da fotografia.
Não a tenho por melhor ou pior que a fotografia colorida, apenas se adequa ou não nalguns casos. Como as cores saturadas, como as High Key, como as silhuetas…

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Raízes




A cadeia de lojas de refeições rápidas MacDonalds tem uns ecrãs de computador em algumas mesas.
Suponho que o investimento se tenha justificado com o manter as crianças mais calmas e entretidas, enquanto os adultos terminam as suas refeições. E, quem sabe, estes se levantem e vão buscar mais qualquer coisa ao balcão. Isto porque a página de entrada é, por aquilo que tenho percebido, relativa a jogos infantis e afins.
Mas poderá ter outros usos.
Um destes dias, numa dessas lojas e num momento tranquilo a meio da tarde, dois desses ecrãs estavam ocupados. Nada de crianças mas por um adolescente e um jovem adulto. Cada um no seu.
Tinham conseguido aceder a um site que exibia um filme na sua língua natal, indiano, estavam deliciados a ver e ouvir a pantalha.
O aspecto que possuíam, não sendo andrajoso nem muito sujo, indiciava notória falta de recursos. E não me espantaria de os ver, juntos ou separados, a arrumar carros num parqueamento ou sentados com um cartão a pedir esmola em frente a um restaurante ou igreja. Aquilo que conhecemos.
Mas também consigo entender – e entenderia mesmo sem ter visto o que vi – a satisfação deles por estarem a ver e ouvir aquilo.
Presumivelmente sem recursos para acederem a canais indianos (satélite ou por cabo), o acesso à língua e cultura materna ser-lhes-á apenas possível de quando em vez e nestas circunstâncias. Ou em casa de algum conterrâneo mais afortunado.
Imagine-se o que teria sido para os nossos migrantes se, no tempo da “mala de cartão”, os canais portugueses tivessem a difusão que têm hoje.



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Identidades




Leio uma crónica num jornal, bem escrita, quase ridicularizando as colónias e aftershave “Old Spice”.
Fiquei escandalizado!
O tom que é usado, mesmo algumas citações e referências, atiram o consumo deste produto, e alguns outros da mesma época, para o conservadorismo bacoco.
Aceito que se tenha esta opinião, mas gostaria de contrapor outra.

Durante anos a fio fui consumidor deste produto. Era caro e eu, que até nem sou muito de usar cosméticos e aromas, fui-o tendo para usar de quando em vez, quando me apetecesse cheirar a alguma coisa. Herdei o gosto pelo aroma de família, identifiquei-me com ele e nunca senti necessidade de o mudar. Afinal, com o passar dos tempos, aquele era o meu cheiro ocasional.
Até que…
Até que um dia, faz já algum tempo, em constatando que o frasco icónico estava a chegar ao fim (por ser opaco só se dá por isso quando começa a ser difícil o extrair as gotas odoríferas) decidi que ao passar pelo lugar onde habitualmente o comprava, haveria de trazer um.
Qual não foi a minha surpresa quando, algum tempo depois, abri o novo e me apercebi que não cheirava ao mesmo. Fui comparar com o restinho que ainda tinha e, apesar de fumador e sem ter o olfacto muito apurado, confirmei-o. Haviam mudado a fórmula e o resultante aroma.
Não gostei. Nem um nico. Afinal, o “meu cheiro” havia mudado por imposição de um fabricante, não por decisão minha.
Zanguei-me com a marca e não mais a comprei. Aliás, considerando a raridade com que usava tal tipo de produto, um frasco durava anos. Zanguei-me com a marca e com o uso de aromas e até hoje continuo a não os usar só para serem aromas.
O que me incomodou na crónica, e me fez saltar a faísca para estas linhas, foi a consideração de que manter um aroma, mesmo que antigo, seja sinal de conservadorismo.
Caramba! Sei que as modas o propalam, aromas, vestuário, até cortes de pelo, até à exaustão, tentando que, com novos produtos, aumentem as vendas. Ou não as façam decair.
Mas se as roupas se vão estragando e haverá que as substituir, os aromas de cada um são como que uma espécie de identidade, artificiais ou naturais. Cada pessoa tem o seu próprio aroma natural e animal que o identifica. Tal como os cães, os cavalos e todos os outros animais. E eles usam o olfacto para identificar indivíduos. Tal como nós.
Com a diferença que a mudança de aroma artificial é como que uma mudança de personalidade, um querer parecer outra coisa que não o próprio (ou própria).
Todos os anos, nas campanhas natalícias, tentam convencer os potenciais consumidores a comprarem novos aromas. Sedutores, afirmam. Identificadores, confirmam.
A questão é saber se será mesmo necessário ser artificialmente sedutor. Ou se fará sentido mudar de identidade. Até porque uma coisa será ter mesmo necessidade disso, outra o fazer crer que se tem necessidade disso.
Infelizmente, a nossa sociedade de consumo impõe essa necessidade. Através de publicidades, através de crónicas, através de mudanças de produto. Que tanto acontecem nos aftershaves e nas colónias como nos desodorizantes.
E fico furioso quando, em sendo altura de comprar um novo, constato que deixaram de fabricar o aroma que me havia convencido e adoptado como meu. A alternativa tem passado por testar no local e tentar encontrar um aroma que me convença. Um novo aroma que me convença e com o qual me identifique.
E não se trata de conservadorismo, aromático ou outro. É mesmo uma questão de identidade. Sei quem sou e não preciso que um ou vários fabricantes me digam quem devo ser! Ou quem devo parecer ser!
Quando não, quero mudar o meu número nacional de cidadão. Gosto de capicuas e quero ter uma! Afinal, se posso mudar de identidade, se me impõem a mudança, porque não neste campo?



By me

quinta-feira, 19 de julho de 2018

Pára-sol



Desculpem lá qualquer coisinha, mas esta eu não deixo escapar.

Vejo gente a querer entrar no mundo da produção e comércio da fotografia. 
Bem vindos! 
Oferecem-se essas pessoas para cobrir fotograficamente os mais variados tipos de eventos, bem como fazer books (seja lá isso o que for) e fotografia de charme. 
Sendo que não estou no mercado, não fazemos concorrência recíproca. Perfeito.
Exibem nas páginas que possuem on-line alguns exemplos do que são capazes de fazer. 
Certo! Ninguém nasceu sabendo tudo e o tempo haverá de lhes melhorar o olho e a mão.
Exibem como atributos para o que fazem imagens do material que possuem. Alto lá!
Não é o material que faz o trabalho, mas ajuda. Ajuda no fazer e ajuda no convencer potenciais clientes do que são capazes de fazer.
Mas garantidamente que não me convenceriam ao mostrarem-me um conjunto de três, quatro ou mesmo cinco objectivas e dois ou três corpos e nem um só pára-sol. Nem um para amostra.
Eu sei que algumas marcas vendem os pára-sol como um extra. Também sei que os preços oscilam entre os vinte e pouco e os mais de setenta euros, dependendo da marca e da objectiva. 
Mas não ter um só pára-sol num conjunto de trabalho que será utilizado em estúdio ou em exterior diz-me muito de quem se propõe a fazer os trabalhos.
E o que me diz não é nem um nico abonatório. 
Que, por muito boa que seja a objectiva, por excelente que seja o sensor, por complexo que seja o processador de imagens, um simples flare vai destruir todo um dia de trabalho. As cores, os contrastes, os brilhos, os detalhes… tudo pode ir por água abaixo porque se não comprou uma porcaria de um pára-sol, vendido como extra.
Tenho tido as guerras mais feias e as discussões mais agrestes com responsáveis por equipamento e vendedores por não fornecerem os pára-sol adequados às objectivas, por não quererem gastar mais uns trocos nos orçamentos para este “extra” que pode garantir a fidelidade de um cliente ou assustá-lo para qualquer outro concorrente no ramo.
Infelizmente, já gente altamente colocada em empresas de alto gabarito vieram, mais tarde, dar a orelha a torcer por não me terem dado ouvidos na altura certa. 
Querem agradar a potenciais clientes? Mostrem-lhes imagens do vosso material, em que os pára-sol servirão para aumentar o volume do equipamento, mesmo que os nubentes não saibam para que serve. Sabem vocês.
Querem convencer um eventual empregador? Mostrem-lhes que têm os pára-sol certos. Se ele perceber da poda, entende-os. 
Querem fazer contra-luzes? Usem o raio do pára-sol! Tirem-no se o flare for desejável, mas tenham-no posto em todas as outras ocasiões. 

E, se outro motivo não existir, posso-vos garantir que já parti dois pára-sol de plástico com pancadas que dei com a câmara em obstáculos. Mas nunca uma objectiva. Comparem os prejuízos!

Usem o pára-sol, raios!

By me

Cartas de amor




As cartas de amor são sempre estúpidas. E fúteis. E tolas.
Tentam pôr por palavras aquilo para que ainda não se encontraram palavras, tentam organizar sentimentos desorganizados, tentam materializar o imaterial.
As cartas de amor, para além de estúpidas, fúteis e tolas, também são algo que escrevemos, uma ou várias vezes na vida. Com a caneta, com as teclas, com a luz. As cartas de amor são escritas de acordo com o que cada um sabe ou pode fazer.
As cartas de amor, para além de estúpidas e fúteis e tolas e múltiplas, são também inúteis. Que ninguém se apaixona pelas cartas de amor que recebe. Nem ninguém se apaixona pelas cartas de amor que escreve.
As cartas de amor, para além de estúpidas e fúteis e tolas e múltiplas e inúteis, são também perigosas. Que uma carta de amor fica, para além do tempo. E mesmo que queimada, rasgada, apagada, palavras e sentimentos não se apagam. O que lá estiver, não importa como, fica para sempre gravado. Em quem leu e em quem escreveu. E o que se sente depois de ler ou de escrever, por muitas tolices e inutilidades e futilidades que se digam, pode ser bom ou mau, dependendo do tempo que passou e das cartas que, entretanto, se escreveram ou leram.
Apesar de tudo, as cartas de amor são magníficas, mesmo que estúpidas e fúteis e inúteis e tolas e perigosas. De escrever e de receber.
Quase tão boas quanto amar!

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Do contra




Sobre a polémica instalada: “Os Maias”.
Não o li no liceu. Era obrigatório mas não o li. Os tempos eram outros, os apelos da vida mais que hoje, era proibido obrigar e os primeiros capítulos enfadaram-me para além do suportável. Não o li.
Safou-me, nos testes e no exame os excelentes apontamentos que a professora nos havia dado. Apesar de o exame ter sido um fiasco. Se hoje alguém respondesse como então respondi…
Anos depois, muitos anos depois, peguei nele. Mais por graça que por vontade, disse para comigo um dia: “Olha! Está aqui há que tempos e nunca o li. É agora!”
E foi! Foi de uma assentada.
Enfrentei o início como algo que tinha que ser feito e deliciei-me com o que se lhe seguiu, contextualizado que estava na época, nos personagens, no arranque para o enredo.
Foi a escrita, a forma de expor ideias e acontecimentos, que me prendeu. Não o enredo entre personagens, que isso tem qualquer novela ou literatura de cordel. Foi a literatura e o mundo ali contado.
Não creio que haja um momento certo para a literatura. Cada um, fruto da experiência, da personalidade e da imaginação, lida com a literatura de seu modo. Uns mais cedo, outros mais tarde.
O papel dos professores, cumprindo um programa, é destaparem o belo da literatura, mesmo que ela descreva mundos sem redes sociais. Melhor: com outras redes sociais e outras realidades.
A importância dos escritos é darem-nos a conhecer outras formas de pensar e de viver, mesmo que não concordemos com elas. E de sonhar.
Mas é esse sonho, esse conhecimento de outras realidades, que nos permite melhor coexistir com a que temos. Eventualmente ajustando-a em função dos nossos ideais. Idealmente ajustando-a com os nossos ideais.
Não li “Os Maias” quando era obrigatório. Mas deliciei-me quando o fiz.
Mas eu sou do contra.



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Campanhas




O título diz que “PSP lança campanha de alerta aos carros mal estacionados em Lisboa”.
Fala-se no transtorno dos carros em segunda fila, no bloqueio à passagem dos transportes públicos, na questão das cargas e descargas…
Uma das imagens para esta campanha é um automóvel estacionado num passeio, impedindo a passagem de um carro de bombeiros.
É uma campanha meritória, sem dúvida.
Pena é terem deixado de parte a questão do espaço para peões. Aquele espaço para caminhar em segurança nos passeios. Aquele espaço vital para que uma cadeira de rodas não tenha que ir para o asfalto. Aquele espaço para se poder sair ou entrar em casa, caminhando, sem se ser um acrobata contorcionista. Aquele espaço seguro para atravessar uma rua.
Nos tempos actuais o automóvel faz parte do quotidiano. Mas não pode expulsar os cidadãos peões do seu próprio espaço.
Mas quando são as próprias autoridades a dar prioridade ao trânsito automóvel descurando quem caminha…



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quarta-feira, 18 de julho de 2018

Arquivos




Um destes dias resolvi fazer um teste de determinação à minha pessoa:
Com uma tesoira, destruir uma tira de negativos. Dos mais antigos, retirado do arquivo bem antigo e sem ver o que continham.
Ainda tive ambos, tesoira e negativo, na mão. Mas não fui capaz. Por muito que dissesse para mim mesmo que aquelas imagens já não contavam, que faziam parte dos meus inícios na área e que seriam, muito provavelmente tão más que o mundo ficaria melhor sem elas, não fui capaz.
Devolvi ambos aos seus lugares de origem e recolhi-me: afinal, não sou tão determinado quanto pensava.

Se eu reagi assim, e estou em crer que a maioria reagiria da mesma forma, porque o fazem com os arquivos digitais e a maldita tecla “delete”?
Arquivo é arquivo e mesmo que não seja visitado, deve ser conservado.



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Talvez iconoclasta




Leio um texto numa revista fotográfica digital/blog fotográfico em que autor faz uma crítica muto forte.
Afirma ele que fotografar mulheres bonitas de costas, na rua, não é “street photography”.
Indo mais longe, diz-nos que fazer este tipo de imagem, bem como a de crianças, que não seja pela estética fotográfica ou integrando um projecto fotográfico, mais não será que um acto de voyerismo e eticamente condenável.

Sobre isto, começo por achar que todo e qualquer fotógrafo é um voyeur e um “bem acabadinho”. E acrescento que é um cobiçador também.
Eu explico:
É um voyeur na medida em que se delicia com o que de belo ou horrendo encontra. A sua atenção está primordialmente focada nisto, quase o impedindo de participar no que o cerca, que aproveitando o belo momento, quer agindo sobre o horrendo, diminuindo-o.
É um “bem acabadinho”, cheio de regras e normas organizativas, na medida em que a sua atenção se concentra no que sai das normas. Só o incomum, bom ou mau, o atrai, ficando indiferente perante o banal, o inconsequente.
É um cobiçador porque, não podendo possuir o que vê, fotografa-o. Não pode levar  consigo o pôr-do-sol, o humano bonito, a ave do céu… Assim, e na sua substituição, guarda um ícone do que lhe fez agitar as emoções, cobiçando o que a vista e demais sentidos lhe mostraram.
Posto isto, continuo afirmando que os “fotógrafos de rua” serão tudo o acima descrito com o acréscimo de o fazerem à sorrelfa as mais das vezes. Fotografam gente, metida nas suas vidas, sem que saibam que estão a ser fotografadas. Emboscados atrás de uma objectiva potente ou escondidos atrás de uma pequena e discreta câmara, satisfazem as suas necessidades de notar o fora do comum, o seu voyreuismo e a sua cobiça sem que os seus objectos cobiçados e assim caçados disso se apercebam e sobre isso se possam pronunciar.
Por fim, não vejo grande diferença entre fotografar um ser humano de costas ou de frente sem lhe perguntar se o pode fazer. Não há, de facto, grande diferença entre apreciar e cobiçar um rabo, um par de mamas ou um peito musculado.
Não será à toa que ao acto de fotografar se diz “disparar a câmara” e o sair para fotografar aleatoriamente tem o apodo de “ir dar ao gatilho”.
A fotografia é encarada por muitos como caça. E os melhores troféus são aqueles que são caçados desprevenidos, com a naturalidade de quem vive a sua vida sem saber que estão a ser espiados e alvo de um “tiraço”.
Ainda por cima, a maior parte destes “fotógrafos” de rua não usam as suas imagens para mudar o quer que seja. Quer se trate de fazer de algo um exemplo a seguir quer se trate de uma denúncia de algo a suster.
Os seus troféus são para ser exibidos numa parede, num álbum ou, mais modernamente, nas redes sociais. São orgasmos fotográficos feito à custa dos incautos que tratam da sua vida na via pública.
Fotografar alguém de frente ou de trás, sem seu conhecimento ou consentimento é algo que, se agora tolerado ou aclamado, será socialmente condenável num futuro não muito distante.



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Sugestão doméstica do dia:



Não deixes para mais logo aquilo que podes fazer já de seguida.
O mais logo pode ser tarde demais!

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terça-feira, 17 de julho de 2018

Lamentos




Não ter tempo para é a desculpa mais comum.
Para justificar a inercia, a preguiça, o desinteresse.
Em regra, cedo ou tarde se se arrepende de não ter tido tempo para.
Para cumprir projectos, para viver, para dizer que sim ou dizer que não… Para.
Fiz algumas coisas na vida de que me arrependo. Mas a maioria dos meus lamentos são para as que não fiz. Porque não tive tempo para.



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“O que mais gosto em televisão são os pássaros nas antenas”
Eduardo Mazo, poeta das Rambas


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Comunicação




Um dia senta-te no local onde existiu uma casa habitada por muito tempo.
Fecha os olhos e abre a mente, usando qualquer método que conheças ou aprendas.
E permite que a história do local fale contigo: sente as emoções boas e más, os gritos de paixão e de raiva, as lágrimas de alegria e de dor, as acusações e os perdões.
A matéria é recetiva à energia, guardando-a. As emoções emitem campos magnéticos, que mais não são que a passagem de energia e químicos entre neurónios.
Os locais, os sítios, as edificações, recebem e guardam isso e quanto mais antigos mais facilmente se sente a energia acumulada. E fácil de perceber isto é a diferença do que sentimos num templo antigo e muito frequentado e num templo recente com pouca frequência. O mesmo sucede com casas antigas ou nos locais onde muita gente esteve por muito tempo. E quanto mais pedra sólida estiver presente, mais isso se nota.
“Abrir a alma” ou permitir que sejamos receptores de energia é o mesmo. Basta que nos desbloqueemos dos nossos preconceitos e que reduzamos a nossa própria actividade mental a quase zero.
Há quem chame a isto “mística”. Eu chamo “comunicação”. E a comunicação não acontece se o receptor não estiver disposto a receber. Ou se não percerber o que recebe.



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Multas e prisões




Naquele almoço, há já uns anitos, a conversa recaiu sobre um tema então batido: os jovens que morreram na praia do Meco, levados pelo mar.
Alargou-se a conversa, até porque as sensibilidades eram várias, e falou-se também daqueles que arriscam a vida dos outros: pescadores e automobilistas. E alguém alvitrou que as penas de multa deveriam ser bem mais pesadas para aqueles que, à revelia das instruções das autoridades, avançam para situações de risco. No caso do mar, os custos das buscas e salvamentos são incomportáveis numa sociedade como a nossa.
Com uma certa dose de radicalismo, mas sincero na opinião, disse eu que esses casos, a serem punidos, não o deveriam ser com multas. Que há quem tenha dinheiro para as pagar e ficar a rir-se.
Por mim, e a verificar-se a infracção, seria pena de prisão efectiva – semanas ou meses – não remíveis a dinheiro. Que a privação de liberdade é igualitária nas condições económicas dos infractores.
E se as penas aplicadas pelos tribunais servem para que o infractor aprenda uma lição, umas semanas de prisão são bem mais eficazes que uma qualquer multa.
A resposta que ouvi deixou-me literalmente siderado! “Não há recursos para prender tanta gente”.
Ora batatas!
Não é importante que os criminosos ou infractores aprendam a não o fazer ou ser. O que conta, mesmo, é o custo da sua reintegração social. E, em não havendo recursos para tal, transforme-se o crime ou infracção em fonte de receita do estado.
Suponho que, na douta opinião de quem comigo partilhava a mesa, esta seja uma solução para baixar o deficit, reduzir a dívida pública e manter o crescimento do país.
Assim sendo, proponho de novo uma ideia antiga:
Actue-se em conformidade com lei e autuem-se todos os veículos que, ilegitimamente, estacionam nos passeios e passagens de peões, impedindo-lhes a sua livre e segura circulação.
Pelas contas que fiz, há uns dois ou três anos, uma única patrulha policial apeada, em Lisboa, renderia aos cofres do estado num ano a módica quantia de dez milhões de euros.

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