Venham
leis e homens de balanças,
mandamentos
d'aquém e d'além mundo.
Venham
ordens, decretos e vinganças,
desça
em nós o juízo até ao fundo.
Nos
cruzamentos todos da cidade
a
luz vermelha brilhe inquisidora,
risquem
no chão os dentes da vaidade
e
mandem que os lavemos a vassoura.
A
quantas mãos existam peçam dedos
para
sujar nas fichas dos arquivos.
Não
respeitem mistérios nem segredos
que
é natural os homens serem esquivos.
Ponham
livros de ponto em toda a parte,
relógios
a marcar a hora exacta.
Não
aceitem nem queiram outra arte
que
a prosa de registo, o verso acta.
Mas
quando nos julgarem bem seguros,
cercados
de bastões e fortalezas,
hão-de
ruir em estrondo os altos muros
e
chegará o dia das surpresas.
“Ouvindo
Beethoven”, de José Saramago
By me
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