O
meu tio Artur, que em boa verdade era meu tio-avô, era uma figura ímpar.
Há
diversas coisas a seu respeito que sei ou recordo dele que marcaram o meu próprio
percurso de vida. Ainda que só muito depois disso me tenha apercebido.
Uma
delas foi o estar, em parte, na origem da minha relação com a fotografia.
Eu
era muito pequeno, talvez que ainda nem com dez anos. E fui a sua casa com a
minha mãe.
Ele
estava muito doente, acamado, e pediu para ser fotografado. Pentearam-lhe os
poucos e brancos cabelos que tinha, ajeitaram-lhe o pijama e a dobra do lençol
e preparou-se a função.
Entenda-se,
como nota de esclarecimento, que o fazer de uma fotografia à época era algo de
importante. Que ela, a fotografia, não estava banalizada como veio depois a estar.
Pois
no momento imediatamente antes do disparo, levantou ele a mão e acenou para a câmara.
E foi assim, dizendo adeus e sorrindo, que foi registado. Pela última vez, já
que morreu no dia seguinte.
Assisti
eu a tudo isto, ainda que, creio, só alguns dias depois me disseram da sua
morte. Mas revejo, como se há pouco, o fazer da fotografia.
Acredito,
contra tudo e contra todos, que o meu tio Artur soubesse que aquela seria a sua
última fotografia. E, sabendo-o, tivesse querido que fosse simpática,
sorridente, acolhedora, como ao que sei e recordo, sempre foi na sua longa
vida.
Não
sei ao certo onde está essa fotografia. Talvez que num dos arquivos da família.
E nem sequer sei alguma vez a tornarei a ver.
Mas
o fazê-la, isso, nunca sairá daquele arquivo de imagens que é a minha memória.
Esta
madrugada, ao dar uma olhadela rápida nos jornais on-line, gostei do que
encontrei. Foi interessante de ver que todos os nacionais retratam Mandela a
sorrir.
Não
é essa a tónica dominante no resto do mundo, que muitos optaram por fotografias
com ar sério, de estadista compenetrado.
Mas
os jornais portugueses fizeram questão que a imagem do tema que atravessa o mundo
por inteiro fosse um sorriso, muitas com um aceno cordial.
Será,
talvez, a melhor homenagem que se lhe poderia fazer.
By me
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