“Ou então pegas
num álbum de fotografias, um álbum qualquer de uma pessoa qualquer, como eu,
como tu, como toda a gente. E dás-te conta que a vida está ali nos diferentes
segmentos que aqueles estúpidos segmentos de papel encerram sem a deixar sair
dos seus acanhados limites. E no entanto a vida é coisa prenhe, impaciente,
quer ir mais além daquele rectângulo, porque sabe que aquele menino vestido de
branco, de mãos postas e com a fita da primeira comunhão no braço, amanhã (digo
“amanhã” só para dizer um dia qualquer) há-de chorar às escondidas com vergonha
de si próprio: uma pequena torpeza? Pequena ou grande, pouco importa, porque
ela implica o remorso, e é dele que estamos a falar. Mas aquela fotografia
feroz, mais severa que um vigilante, não deixa que a verdadeira verdade fuja
dos seus escassos centímetros. A vida fica prisioneira da sua representação:
serás o único a lembrar-se do dia seguinte.”
O título é meu, a
fotografia também, mas o texto é de António Tabucchi, no seu livro “Está a
fazer-se cada vez mais tarde”
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