Fotografar um “homem-estátua”
é coisa estranha.
A sua actuação
baseia-se na imobilidade ao longo do tempo e a fotografia é o imobilizar uma
minúscula fracção de tempo. A fotografia de um “homem-estátua” dificilmente fará
justiça ao seu trabalho.
Mas este
despertou-me a curiosidade pela localização: em frente a um centro comercial.
Longe, bem longe, dos locais habituais para este tipo de actuação e
correspondente “cobrança” ao público.
Quedei-me um pouco
a observar.
E achei graça aos
seus trajes.
Identificados com
coisa nenhuma, eram suficientemente largos para cobrir as roupas quentes que, obrigatoriamente,
terá vestido por baixo. Consigo imaginar o cuidado no trabalho de costura no
fazê-las, que farão referência não sei a quê, mas cujas linhas geométricas,
aplicadas sobre a frente apenas, fazem um bom efeito.
A pintura facial
primava por… escassa. Não sei se por poupança se por saúde, certo é que o tom
de pele despontava sob ela, ficando nós na dúvida se será um branco rosado ou
um rosa pálido.
Seja como for,
fiquei a vê-lo um pouco, enquanto fumava um cigarro, e a constatar que usava da
técnica de aliviar a imobilidade com movimentos de agradecimento,
permitindo-lhe, com eles, mudar de pose. O normal.
O que já nada teve
de normal foi o rapidíssimo episódio que assisti. Quase que inexistente.
Saindo do centro
comercial, um homem vinha mexendo na sua carteira. E, de súbito, o “homem-estátua”
levanta o seu braço direito, apontando de dedo em riste para o chão, e clama:
“Deixou cair ali
uns papeis!”
A sua humanidade
sobrepôs-se ao seu ganha-pão. E achei que este valia a pena.
Rebusquei uma
moeda que valesse aquele trabalho, aproximei-me e, depois de a deixar cair na
taça metálica a seus pés, perguntei-lhe em tom baixo:
“Aqui rende mais
que na baixa?”
Muito pouco
estátua, o homem rodou a cabeça e sorriu-me:
“Não, mas é muito
mais tranquilo.”
Sorri também e
afastei-me. O registo, fiz pouco depois, após o pedido do costume. E deixei-me
ficar a observar como lhe corria o negócio, comparando-o com o que conheço lá
no centro.
Nem um montão de
gente a fazer um semi-círculo em redor, inibindo os passantes de contribuir,
nem a concorrência de outros uns metros mais acima ou abaixo, nem o risco de
passar algum e lhe levar a taça das moedas… Foi funcionando, apesar do frio,
baseado no insólito da função e do lugar.
Espero que o São
Pedro seja clemente e que abafe o vento e traga um solzinho para lhe aquecer os
ossos.
By me
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