Entro
no café aqui da rua com as mãos ocupadas. Uma segurava as abas do colete, a
outra o chapéu na cabeça. O vento, bem fresco, não me deu descanso nos menos de
cem metros que medeiam entre a porta de onde saí e a porta onde queria entrar.
Lá
dentro, cinco mesas ocupadas. Não me fariam concorrência, que ficaria eu ao
balcão: o café com bolo do fim da manhã não justificavam o sentar. Nem eu o
quereria, que o grande televisor da sala jorrava sons e imagens de uma tal
casa, não sei onde, na qual uns tantos são observados a cada instante. Mau
demais para que eu o consuma.
Mas,
enquanto espero p’lo que pedi e esfrego as mãos, vou observando quem está.
Um
dos clientes lê. Um grosso volume de texto. É um cavaleiro, já reformado e com
quem já conversei sobre fotografia, que estuda. Salvo erro História de Arte.
Vejo-o amiúde aqui, quer com livros, quer com o portátil, quer escrevendo em
papel.
Outra
senhora, intermédia na idade entre o estudioso e eu mesmo, também lê. No virar
das páginas, consegui ver o título, consentâneo com o que delas via: “King Lear”.
Assim, na língua original. E, p’lo tom das páginas, fiquei sem saber quem seria
mais antigo: se a leitora se o exemplar.
Uma
outra senhora, sentada pertinho do televisor, ia repartindo a sua atenção entre
este e o telemóvel, lendo e escrevendo. Um segundo jazia na mesa, ao lado da chávena
já vazia.
Um
quarto cliente, noutra mesa, entretinha-se a ler um jornal. O “Correio da Manhã”,
pousado na mesa. No espaço restante, “A Bola” pouco deixava livre para chávena,
já vazia.
O
último não lia. Parado na sua cadeira, com uma chávena na mão, olhava fixamente
para o televisor. Assim esteve todo o tempo que me demorei. P’la expressão que
lhe via na face, não creio que pensasse no que via ou no que segurava. Mas era
demorado e longínquo.
Enquanto
eu trincava o bolo, entrou mais um. Que se dirigiu à maquina dos cigarros e, de
seguida para o balcão, onde pediu uma “mini”. E ficou entretido a abrir o maço.
Por
mim, paga a despesa, saí. Deixei que o colete abanasse como queria, que o
cigarro e o chapéu eram mais importantes.
Enquanto
caminhava de volta a casa, ouvi trazido p’lo vento o som da sirene dos
bombeiros, bem lá longe. “Meio-dia, espero eu”, pensei. Era!
By me
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